• Impacto da tragédia na saúde mental: atendimento no Caps Álcool e Drogas aumentou 163% após as chuvas

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  • Foram atendidas 422 pessoas no local entre fevereiro e abril; também foi registrado aumento em outras unidades de atendimento psicossocial

    18/06/2022 19:08
    Por João Vitor Brum

    Mais de quatro meses após a tragédia das chuvas deste ano, a saúde mental de pessoas atingidas direta ou indiretamente é motivo de muita preocupação. Durante o período, o atendimento nas unidades especializadas em psicologia e psiquiatria teve aumentos expressivos, em especial no Centro de Atendimento Psicossocial especializado em Álcool e Drogas, onde o total de pessoas assistidas entre fevereiro e abril foi 163% maior do que no mesmo período de 2021.

    Caps Álcool e Drogas atendeu 569% mais pacientes em fevereiro

    Entre fevereiro e abril deste ano, nos primeiros meses após a tragédia, o Caps AD III Fênix, que atende pacientes com dependência em álcool e/ou drogas, registrou um aumento de 163,75% no atendimento de pessoas em crise na comparação com 2021. 

    No ano passado, foram 160 atendimentos no período, enquanto em 2022 foram 422, 262 atendimentos a mais. O mês com maior diferença entre os dois anos foi fevereiro, com 154 atendimentos em 2022 e 23 em 2021, um aumento de 569,5%. 

    No mês seguinte à tragédia (e em que o segundo desastre atingiu a cidade, em 20 de março), o aumento foi de 115% na comparação dos dois anos. Em 2021, foram 60 atendimentos, enquanto neste ano, foram 129. Já em abril de 2022, 145% mais pacientes em crise foram atendidos pelo Caps AD, com um total de 98 atendimentos neste ano, e 40 no ano passado.

    O impacto da tragédia nos casos de pacientes em crise pode ser percebido ao analisar os números referentes a janeiro dos dois anos, quando não houve mudança no total de atendimentos. No primeiro mês de 2021 e de 2022, foram 41 atendimentos de pacientes em situação de crise.

    O diretor do Departamento de Saúde Mental da Secretaria de Saúde, Oswaldo Filho, explica que os pacientes considerados em crise já eram atendidos anteriormente pelas unidades, com algum tipo de agravamento da situação após algum tipo de evento – neste caso, a tragédia que afetou todo o cotidiano da cidade.

    “Situação de crise é quando o paciente que já é acompanhado, seja pelo Caps Álcool e Drogas ou pelas demais unidades, se desestabiliza, com algum tipo de crise. Por exemplo, quando um paciente que possui alguma dependência química tem uma recaída. Após a tragédia, vimos que houve um grande aumento entre fevereiro e abril, com relação ao último ano. Como temos o acompanhamento contínuo, conseguimos perceber essas situações e agir de forma ágil para que o quadro não se complique ainda mais”, explicou Oswaldo Filho.

    Já os leitos em funcionamento na Unidade de Acolhimento de Adulto Giovana Lopes Martinez e no Caps AD, com dez e oito leitos disponíveis, respectivamente, a ocupação foi liberada para acolhimento da população em situação de rua e de pacientes dos equipamentos de Atenção Psicossocial, devido à situação de risco e vulnerabilidade. 

    Na Unidade de acolhimento de Adulto, cinco pacientes foram acolhidos em fevereiro, enquanto o Caps AD teve todos os leitos ocupados durante o período. 

    Uma preocupação era a medicação de pacientes, já que a dependência de medicamentos tem se tornado cada vez mais comum e pode gerar problemas graves para a vida do assistido.

    “Muitos dos sintomas que tiveram no primeiro momento são esperados: tristeza, choro, insônia. São sintomas esperados e que não vemos necessidade ou procuramos não levar para a psiquiatria com atendimento médico, pois a pessoa pode sair do cenário do luto e se colocar no lugar do doente. Outro risco é medicar. Entrar com um medicamento que pode criar dependência só piora o quadro desse paciente”, destacou Oswaldo.

    Aumento nos atendimentos em todas as unidades

    No Ambulatório de Especialidades em Saúde Mental Luciana Deolindo, que conta com consultas de neurologia, psiquiatria e psicologia no nível ambulatorial, 428 atendimentos foram realizados entre fevereiro e maio, com destaque para o mês de maio, com 178 pessoas atendidas, o que representa 41,5% do total.

    O segundo mês com mais atendimentos foi abril, com 127, seguido por fevereiro, com 86, e março em último, com 37. No ambulatório, que fica na Avenida Dom Pedro, foi elaborado um Plano de Atendimento Emergencial focado nas vítimas do desastre.

    Atendimentos em cada Núcleo;

    • Caps Núbia Helena dos Santos, em Itaipava, 150 vítimas das chuvas foram atendidas entre fevereiro e maio, sem um dado específico para cada mês. Além disso, 40 pessoas em situação de crise foram atendidas no período;
    • Já no Caps Infantojuvenil Sylvia Orthof, no Centro, foram atendidas 31 crianças e adolescentes afetados pelo desastre entre fevereiro e maio, também sem uma especificação de atendimentos por cada mês;
    • No Caps Nise da Silveira, que fica na Rua Montecaseros, no Centro, foram 172 atendimentos entre fevereiro e abril, sem um dado referente ao mês de maio. Em fevereiro, foram 54 atendimentos, em março foram 63 e, em abril, 56 pessoas foram atendidas no local.

    Nos abrigos abertos após as chuvas, foram identificadas 20 pessoas com necessidade de atendimento psicossocial e 26 pacientes que estavam abrigadas e já eram acompanhadas pelas equipes dos Caps antes da tragédia.

    Para otimizar o atendimento nas unidades, as equipes precisaram ser ampliadas, mas não foram repassados pela Prefeitura dados claros sobre quantos profissionais foram contratados em toda a rede de atendimento psicossocial

    No posto de saúde da família do Alto da Serra, três psicólogos foram incluídos no quadro, enquanto no Itamarati um profissional foi contratado para apoiar no atendimento. 

    “Foi feito um trabalho intenso de acompanhamento psicossocial por famílias afetadas psicológica e socialmente, principalmente nas áreas mais afetadas. Sabemos que, muitas vezes, as perdas materiais podem ser esquecidas e recuperadas, mas dores, principalmente que ficam na alma, demoram muito mais para serem cicatrizadas”, destacou o secretário de Saúde, Marcus Curvello.

    Saúde mental foi tema das comissões pós tragédias

    A saúde mental foi tema de pelo menos duas audiências públicas realizadas após as chuvas, uma promovida pelo Senado Federal e outra pela Câmara Municipal de Petrópolis, para lembrar da importância de realizar um atendimento eficaz às famílias atingidas pelos desastres naturais. Na audiência do Senado, dados referentes aos atendimentos nas primeiras semanas foram apresentados e novas propostas foram cobradas por parte dos senadores.

    A rede de atendimentos do poder público em saúde mental conta com quatro Caps e um ambulatório em Petrópolis, sendo um dos Caps especializado no atendimento de pacientes com dependência em álcool e drogas e outro no atendimento de crianças e adolescentes.

    No pós-tragédia, a presença de equipes da FioCruz também foi essencial para garantir o melhor atendimento à população. O Núcleo de Desastre da Fundação e a Ong Médicos Sem Fronteiras atuaram na construção de uma “Linha de Cuidado em Saúde Mental e Atenção Psicossocial para a população atingida pelos deslizamentos e inundações em Petrópolis”, trabalho que é usado como norte para as ações de atendimento.

    Já a professora e psiquiatra Sandra Fortes, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), realizou um curso de capacitação voltado para ações de estratégia da gestão do trabalho em saúde mental para equipes dos territórios afetados, equipes técnicas e agentes comunitários de saúde.

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