• ‘Hoje, atriz de 50 anos tem cada vez menos trabalho’

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  • 03/02/2021 13:00
    Por Estadão Conteúdo

    O carioca Marcus Montenegro, 51 anos, começou a carreira como ator aos 19, mas, cinco anos depois, passou para o outro lado da cena e, junto com Nilson Raman, começou a produzir peças de teatro. Em pouco tempo, tinham com eles nomes como Bibi Ferreira, Nathalia Timberg, Rosamaria Murtinho e Mauro Mendonça. Além de produzir, também se tornaram agentes de atores e, até 2018, eram sócios na Montenegro & Raman.

    Há três anos à frente da Montenegro Talents, que tem em seu cast 320 atores, 25 autores e seis diretores, ele divide no livro Ser Artista – Guia Para uma Carreira Sólida No Mundo da Atuação, escrito com Arnaldo Bloch, dicas de condução de carreira artística. Fala sobre talento, vocação e ego. Tudo misturado às suas memórias de mais de 32 anos de carreira.

    “Sou um dos agentes mais antigos em atividade, conheço muito o mercado. Tenho boas histórias, sobretudo com as grandes damas do teatro brasileiro, que são minha absoluta paixão, de quem já produzi mais de 100 espetáculos, no Brasil e no exterior”, diz em entrevista ao Estadão.

    O livro ganhará uma adaptação para os palcos, assinada por ele e a dramaturga Regiana Antonini com estreia prevista para o segundo semestre. O ator Caco Ciocler, com quem trabalha há 25 anos, será o protagonista.

    Montenegro também tem outra bandeira: a que cobra bons papéis para atores com mais de 50 anos em produções na TV, cinema e streaming. No ano passado, quando a Globo anunciou que não renovaria o contrato de estrelas como Glória Menezes, Tarcísio Meira, Antonio Fagundes, Stênio Garcia, Vera Fischer, entre outros, ele conseguiu renovar o vínculo de nomes como Eva Wilma, Rosamaria Murtinho, Mauro Mendonça, Luís Melo e Nicette Bruno, morta em dezembro, vítima da covid-19.

    “Com o passar do tempo, os papéis para veteranos ficaram cada vez menores e mais raros. Recentemente, uma atriz de 42 anos fez o papel de mãe de um ator de 28 anos. Por que não colocaram uma mulher de 50 e poucos anos?”, questiona.

    O livro traz inúmeras dicas para atores. É algo que as pessoas lhe pediam?

    Quando encerrei a Montenegro & Raman, algo que já era planejado, montei a Montenegro Talentos e mudei o foco somente para agenciamento e desenvolvimento de conteúdo. Não faço mais produção. Criei minha palestra sobre condução de carreira e passei a apresentá-la em congressos de elenco. Deu muito certo. Fui me aprimorando nessa área. Comecei a atender, um sábado por mês, cincos pessoas individualmente para avaliação de carreira artística. A partir disso, resolvi colocar essas dicas em um livro. Muita gente me procura, mas não tenho espaço para essa demanda no meu escritório.

    Recentemente, você criou a campanha “Eu Quero Veteranos na TV”. Hoje eles estão perdendo espaço nas novelas?

    Quando você analisa o elenco das novelas do passado, constata que mais da metade era de atores de meia-idade para cima. Elas tinham bons personagens, com arcos dramáticos, inseridos na trama dentro do núcleo principal. Com o passar do tempo, os papéis para veteranos ficaram cada vez menores e mais raros. Recentemente, uma atriz de 42 anos fez o papel de mãe de um ator de 28 anos. Por que não colocaram uma mulher de 50 e poucos anos? Hoje, uma atriz de 50 anos, que já protagonizou uma novela com 20, 30 anos, tem cada vez menos possibilidades de trabalho. Toda a indústria criativa – novela, cinema, séries, streaming – precisa olhar para os veteranos. E, quando digo veterano, é de 45-50 anos para cima. A partir dessa idade, os papéis já ficam mais difíceis. Nos Estados Unidos, Reino Unido e Espanha, os veteranos fazem muito sucesso em séries. O Brasil precisa seguir esse caminho.

    E por que isso acontece?

    São dois fatores: a audiência e as redes sociais. Os diretores de televisão querem levar para a TV essa força que os jovens atores têm na internet. Porém, a meu ver, falta bom senso. O encontro entre gerações precisa existir. É a troca de bastão, é quando se aprende. É preciso encontrar um equilíbrio.

    A campanha tem relação com as recentes dispensas de atores veteranos pela Globo?

    Não. Deixo muito claro que isso não tem nada a ver com o contrato vitalício. Entendo que a economia em crise gera redução de custos. Faz parte. Isso não invalida que a empresa olhe para esses atores e os contrate por obra. Minha luta é para que o mercado volte a criar bons personagens para esses atores.

    Você trabalha com atores como Ana Lúcia Torre, Suely Franco, Nathalia Timberg. Elas sempre são chamadas…

    A Suely é um exemplo de como os veteranos são bem recebidos pelo público. Ela e Ary Fontoura tiveram uma grande aceitação dentro de A Dona do Pedaço (2019). Ela foi a atriz que mais fez merchandising na novela, com mais de 20 ações. E ainda fez sucesso como par romântico do Ary. Foi uma aceitação total. Nathalia, aos 91 anos, estava na segunda turnê da peça Através da Íris com teatro lotado. Só parou por causa da pandemia.

    Atores veteranos precisam ser atuantes nas mídias sociais?

    É fundamental. O ator veterano, pela experiência, tem toda condição de gerar um bom conteúdo, mais qualificado. Ary Fontoura e Vera Holtz fazem conteúdos maravilhosos. Vera usa seu talento e inteligência para fazer uma crítica da sociedade por meio da arte, de maneira genial. Ary se reinventou. Ele está brincando de maneira deliciosa, proporcionando que uma geração mais nova tenha acesso a ele. Isso não invalida o ator que ele é. A Suely Franco conta piadas. Cada um tem a sua particularidade. O público quer essa aproximação com o ídolo.

    No seu livro, você fala e dá dicas sobre o self tape (um vídeo de apresentação para agentes e produtores de elenco). Os atores veteranos também precisam se render a ele?

    Sim, não para a TV aberta, mas para o streaming. Muitos produtores de elenco do streaming são de fora e não conhecem muito bem o potencial dos atores brasileiros. É uma moda que chegou, um padrão americano, e os diretores querem ter opções na hora de escolher. Acho que sempre funciona bem, é válido.

    As produções de novela já voltaram, com muitas restrições, mas as peças ainda estão em ritmo mais lento, muitos teatros não reabriram. Qual é a previsão para o mercado este ano?

    A retomada deve ocorrer no segundo semestre. A previsão é que, a partir de maio, a vacinação ganhe um ritmo maior e, com isso, o público deve voltar a ter confiança de frequentar lugares fechados. Há uma grande previsão da retomada de musicais a partir de julho, em São Paulo. São quatro ou cinco previstos para estrear.

    Seu livro vai virar uma peça que terá Caco Ciocler como protagonista. Por que o escolheu para contar sua história nos palcos?

    Caco é um dos meus clientes mais antigos. Trabalhamos juntos há quase 25 anos. É um dos atores que mais admiro, não só pelo talento, mas também pelo caráter, postura e posicionamento na profissão. É intenso, maduro. Ele é tudo o que eu gostaria de ter em um ator para fazer esse espetáculo.

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