• Há (assustadora e perigosa) desconexão

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  • 07/10/2023 08:00
    Por Gastão Reis

    O Brasil convive hoje com dois mundos paralelos: a visão do andar de cima e a da população em sua grande maioria. Os exemplos abundam. É sintomático que um desembargador aposentado, Sebastião Coelho, longe de ser algum revolucionário tresloucado, tenha dito, cara a cara com a Corte, o seguinte: “Os ministros do STF são as pessoas mais odiadas deste país”. Se quisermos ser diplomáticos, poderíamos afirmar que eles causam, sem dúvida, profundo desconforto moral à população no caso da descondenação de Lula, dentre outras que se tornaram, com razão, motivo de indigNação geral.

    A grande mídia não toca na questão da democracia de baixo para cima, uma das razões de nossa persistente desigualdade: quem paga a conta não é consultado. A ausência de plebiscitos sobre gastos bilionários que batem direto no bolso do povo é sintomática. Deputados (quase) dobraram o valor do Fundo Eleitoral de três para seis bilhões de reais sem ouvir seus eleitores quanto ao destino alternativo dessa polpuda verba para educação e saúde.

    É simplista taxar os 45 dias de manifestações populares pacíficas contra a eleição de Lula como atos golpistas. Rigorosamente, sabemos que Lula não poderia ter sido sequer candidato. Foi viabilizado por decisões equivocadas do STF contestadas inclusive por juristas de moral ilibada do mais alto nível.

    O fato de Lula só ter vencido no Nordeste evidencia sua rejeição pelas demais grandes regiões geográficas do país. Nos EUA, os votos dos colégios eleitorais dos estados teriam dado vitória ao opositor de Lula, justamente para preservar o que seus pais fundadores sempre defendiam, vale dizer, a democracia de baixo para cima. Os votos dos colégios eleitorais dos estados se superpõem ao voto popular. E não há golpismo nesse procedimento.

    Aos poucos, a repercussão internacional do que está acontecendo aqui assume as piores feições. Um deputado português, ao se dirigir ao Parlamento lusitano, chamou Lula de bandido. Um vídeo inglês intitulado “Questions of truth” (Questões de verdade) faz uma avaliação devastadora do que vem acontecendo no Brasil, e aponta o dedo para a quebra de práticas democráticas no Patropi, pondo em relevo decisões autoritáriais e monocráticas do ministro Alexandre de Moraes.

    O mesmo vídeo vai mais longe. Acusa Lula de ser um político criminoso. E que estamos sob o risco de uma ditadura do judiciário, denunciada por Ruy Barbosa, como sendo a pior delas. Bate duro nas arbitrariedades da Polícia Federal sob o comando de Alexandre de Moraes. Atribui o condenável quebra-quebra 8 de janeiro à infiltração da extrema esquerda entre os manifestantes. E nos pergunta se tais atrocidades seriam aceitas em outros países demo-cráticos. Por fim, deixa no ar a reação das ruas que, mais cedo ou tarde, virão.

    Num país de memória curta, Àlvaro Dias, membro do Republicanos, em vídeo incisivo, nos relembra da corrupção sofisticada e planejada por Lula e PT. Tudo começou quando Lula alterou os Estatutos do BNDES, que davam ao banco garantias contra a malversação de seus recursos, permitindo emprésti-mos aos ditos campeões e a países (falidos) alinhados ideologicamente ao PT. De 2008 a 2014 foram 716 bilhões de reais para o ralo. Destes, 200 bilhões provenientes do FGTS, PAC, PIS/PASEP, que são recursos dos trabalhadores, e mais 400 bilhões do Tesouro Nacional tomados via mercado a 14,5% a.a. e emprestados a 5 e 6%. Resultou numa conta a pagar que vai até 2060.    

    Em termos de viagens internacionais, em ritmo alucinante, é uma espé-cie de fuga de suas responsabilidade administrativas. Em jantar oferecido por Biden a 30 presidentes e primeiros-ministros de diversos países, Lula ficou de fora. Ficaria por fora de qualquer modo por não falar inglês. É óbvio que os serviços de informação desses países já passaram a esses mandatários a ficha suja de Lula. São protocolares, e não o levam a sério, a não ser para tirar alguma vantagem.

    A grande mídia tem dado pouca atenção à perigosa desconexão existente entre a classe dirigente e o povo brasileiro. Não usei a palavra elite porque ela significava na origem, século XVIII, produtos de qualidade excepcional, e depois o melhor que existe numa sociedade ou profissão, coisa difícil de encontra no dia a dia da república brasileira. Menos ainda entre políticos e agremiações partidárias com raras e honrosas exceções.

    Todos conhecemos o destino dado na Bíblia a Sodoma e Gomorra, devoradas pela licensiosidade e punidas pelo fogo da ira divina. A diferença no caso brasileiro é que ele se dá na esfera política.  Tem jeito de que vai acabar atraindo a ira popular daqueles que pagam a conta sem serem consultados. O estranhamento entre o andar de cima e o povo é evidente em nosso dia a dia. A indigNação se manifesta sempre que as pessoas se encontram ao tomar o tradicional cafezinho.

    A alta burocracia brasileira se habituou a mandar a conta, por mais elevada que seja, para o bolso do povo sem o menor constrangimento. Os elevadíssimos salários de juízes, por exemplo, que ainda se queixam por acharem que ganham pouco. Todas as mordomias, inclusive para os filhos, e dois meses de férias por ano, não são suficientes. O presidente da Suprema Corte da Suécia vai para o trabalho de trem e metrô. Os nossos bem poderiam, ao menos, dirigir seu próprio carro.

    É assustador que seis ministros do TCE/RJ, afastados por corrupção, tenham sido “punidos” com aposentadorias integrais sem qualquer desconto na remuneração para ressarcir os cofres públicos da corrupção de que se beneficiaram. Vão rir do povo até o momento em que ele for para as ruas para dar um basta a tamanho desrespeito pelo dinheiro público.

    A lição que fica é que a reação popular pode até demorar, mas acaba, de algum modo, acontecendo. É hora inclusive de a população brasileira impor mecanismos que lhe permitam cobrar das autoridades uso eficaz dos pesados impostos pagos. Hora de lutar pelo lema de Pedro II estampado numa moeda comemorativa de sua coroação – Ordo et Felicitas. Ordem e felicidade, que só vigoram quando o Povo se sente respeitado por seus dirigentes. Tarda a hora de pôr fim à perigosa desconexão. Mãos à obra.

    “Dois Minutos com Gastão Reis: Futebol e política”.

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