• ‘Governo não pode ser refém do Congresso E do mercado’

  • 09/dez 08:30
    Por Mariana Carneiro e Daniel Weterman / Estadão

    Líder do governo no Congresso, o senador Randolfe Rodrigues (PT-AP) afirma que o Executivo não pode ser refém nem de congressistas nem de agentes do mercado financeiro. Ao comentar o início de tramitação dificultada do pacote fiscal apresentado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para equilibrar as contas públicas, que enfrentou críticas de analistas e foi paralisado pelo não pagamento de emendas parlamentares, Randolfe afirma que a situação fiscal é uma herança do governo Jair Bolsonaro e que nada justifica o “mau humor” do mercado com o pacote.

    “Se entregou a governança da política econômica totalmente ao mercado. E o governo não pode ficar à mercê nem de um agente nem de outro. Não é um antagonismo com o mercado, mas o governo não pode ser refém”, afirma.

    O sr. avalia que dá tempo de aprovar o pacote de corte de gastos em 2024?

    Na reunião do presidente Lula com os presidentes das Casas (Câmara e Senado), a qual acompanhei, senti o entendimento e o compromisso de que essa agenda tem de ser votada porque é necessária. Creio que será possível aprovar pelo menos essas duas matérias (o projeto de lei e o projeto de lei complementar) do conjunto das medidas de contenção de gastos.

    Deixar a PEC para o ano que vem é um risco? Ali estão medidas como mudanças no abono salarial, Fundeb e os supersalários…

    A missão que nos foi designada foi aprovar neste ano. É um período muito curto, mas a urgência e a emergência da situação fiscal internacional, as intempéries que vamos ter, sobretudo com a posse de Donald Trump nos Estados Unidos, nos impõem a necessidade de aprovar logo.

    O mercado vê o pacote como insuficiente e parlamentares reclamam de excesso de restrições, principalmente no BPC. O que fazer?

    O governo anterior nos entregou três péssimos legados: a ameaça à democracia, a renúncia da governança orçamentária e a renúncia da condução da política econômica. A defesa da democracia e a política econômica conseguimos retomar. A condução da política econômica não pode ficar com o mercado. A recuperação da governança orçamentária tem um sentimento do Congresso de direito adquirido em relação a isso. O governo não pode ficar à mercê nem de um agente nem de outro. Não é um antagonismo com o mercado, mas o governo não pode ser refém.

    O sr. vê uma reação ideológica de investidores e analistas do mercado?

    Não se justifica o mau humor externado diante dos dados que foram divulgados na mesma semana. Estamos com a menor taxa de desemprego da série histórica. Teremos dois anos seguidos de crescimento da economia a mais de 3%. Estamos com menor número de cidadãos na pobreza e na extrema pobreza. Esse ambiente não dialoga com a realidade dos números da economia e com o compromisso fiscal que esse governo tem manifestado.

    Houve problema com o anúncio do Imposto de Renda ter sido feito ao mesmo tempo?

    Não há razão para se assustar com a isenção para os brasileiros que recebem até R$ 5 mil. Se esperava que o presidente da República não cumprisse uma promessa? Houve um problema de comunicação. Vazou a informação sobre a reforma da renda, mas não é uma reforma para agora. A ordem dos fatores é: primeiro o ajuste fiscal e depois, para o ano que vem, a gente discute uma reforma que será neutra, que não trará prejuízo fiscal.

    O governo está tendo de negociar pontos no pacote?

    O ajuste fiscal não é agradável para ninguém. Sempre toca interesses. Eu não vi um que recebe supersalário que diga “ok, eu vou deixar de receber supersalário porque a sociedade brasileira quer”. Ou que “eu poderia me aposentar com 40 anos indo para a reserva, mas aceito 55 anos”. Tocar nisso, que é uma prerrogativa que alguns brasileiros têm e outros não, o que é característico de castas, lógico que terá reações.

    Há questionamentos também sobre restrições impostas à concessão de benefícios aos mais vulneráveis. Nem a bancada do PT está convencida…

    Vamos conversar ao máximo, porque em nenhum momento estamos questionando direitos. O que se tenta corrigir em relação ao BPC (Benefício de Prestação Continuada, pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda) são as distorções. É muito caro ao presidente Lula a manutenção dos programas sociais e ampliação de novos, como o pé-de-meia.

    Não constrange o governo que uma de suas principais bandeiras, que é a política do salário mínimo, seja limitada na largada?

    Recebemos um País em que há sete anos não tinha nenhuma correção do salário mínimo e, no primeiro ano, fizemos um aumento real (acima da inflação). Mas o Estado brasileiro compreendeu que tinha de ter uma regra de gastos. Tudo tem de estar dentro dessa regra de gastos. Isso não significa que não haverá correção. E as correções, combinadas à reforma do IR no ano que vem e a isenção de até R$ 5 mil, vão representar uma conquista real do poder de compra.

    O governo tem votos para aprovar o pacote?

    No Senado, estou tranquilo. Na Câmara, embora o quórum para aprovar a urgência tenha sido no limite, dá tranquilidade para aprovar a lei ordinária. PEC é outra história. No momento, pode ser que não tenha os votos, mas vamos evoluir.

    As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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