• Garotas brasileiras avançam em seletiva para virar piloto na Academia Ferrari

  • 05/07/2020 13:05

    Duas garotas brasileiras embarcam em outubro para a França para disputar uma concorrida vaga na Academia Ferrari, o projeto de desenvolvimento de talentos da escuderia mais tradicional da Fórmula 1. Após superarem 50 concorrentes em um processo seletivo internacional, a paulistana Júlia Ayoub, de 15 anos, e a catarinense Antonella Balsani, de 14, vão passar por uma bateria de testes contra outras 18 adversárias. Quem se destacar, assina contrato com a equipe para correr no próximo ano pela Fórmula 4.

    As brasileiras fazem parte de um projeto da Federação Internacional de Automobilismo (FIA) cujo objetivo é aumentar a participação feminina no esporte a motor. Para isso, a entidade sediada em Paris recebeu 70 currículos de garotas de 12 a 16 anos de todo o mundo e escolheu 20 finalistas para a etapa final, em outubro. Depois de várias corridas, desafios físicos, testes mentais e até atividades de relação com a imprensa, só uma garota vai entrar para o mesmo projeto da Ferrari que já revelou, por exemplo, o monegasco Charles Leclerc.

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    O plano da FIA é conseguir nos próximos anos ter uma mulher no grid da Fórmula 1. Por isso, o projeto é investir na base do esporte. A última participação feminina em corridas foi ainda em 1976, com a italiana Lella Lombardi. Como a própria categoria divulgou recentemente um plano para aumentar a inclusão e a diversidade, as duas garotas brasileiras estão animadas por perceberem que a resistência à participação de mulheres pouco a pouco tem diminuído.

    “Ainda tem um preconceito no automobilismo, mas agora com essas oportunidades e com mais mulheres aparecendo, nós estávamos cada vez mais impondo respeito. Só por disputar esse projeto da Ferrari estou muito feliz”, contou Júlia. A campeã do Troféu Ayrton Senna de Kart deste ano e única brasileira no Mundial do ano passado começou no automobilismo há cinco anos, após ver um treino do irmão na pista. O curioso é que a própria família dela era resistente à ideia.

    Os pais de Júlia preferiam ver a filha em uma atividade bem diferente. “Antes eu fazia balé, mas depois que comecei a me interessar pelo kart, não pensei em outra coisa. Meus pais no começo falavam que kart não era coisa de mulher porque é muito barulhento e tem muita sujeira”, afirmou. Para focar na carreira de piloto, a garota desde o ano passado cursa escola à distância, treina na pista até três vezes por semana e também se dedica a treinos físicos na academia.

    O caminho de Júlia e de Antonella pelo automobilismo consistiu em presenciar desde cedo alguns episódios de preconceito. Como não há divisão por gênero nesse esporte, desde os primeiros anos do kart as atuais candidatas à vaga na Ferrari disputaram as corridas contra meninos. “Dá para perceber que alguns têm maldade por eu ser menina e queriam me dar uns toques durante a corrida para me tirar da pista”, contou Júlia.

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    Antonella chegou a presenciar até mesmo uma mobilização dos concorrentes. “Já vi muita pilotos combinarem e até fazerem uma ‘vaquinha’ para bater em mim e me tirar da corrida. Eu nunca liguei para isso e continuei competindo. Se as pessoas criticam, é porque eu ando bem. Se eu fosse ruim, não teria esse tipo de comentário”, afirmou a catarinense. No currículo, ela tem o vice do Sul-Americano de kart e o 3º lugar no Brasileiro.

    Nascida em Concórdia, a piloto de 14 anos começou no kart aos quatro, incentivada pelo pai. Antonella costuma treinar na pista nos fins de semana e durante os outros dias concilia a escola com exercício físicos e curso intensivo de inglês, idioma essencial no meio do automobilismo. A convocação para participar da fase final da seletiva da FIA faz a garota relembrar um momento difícil que precisou superar na carreira.

    Em 2013, Antonella sofreu um grave acidente durante uma prova em Tarumã (RS). A capotagem com o kart a deixou com uma grave lesão no pulmão e um delicado estado de saúde após seguidas paradas cardíacas no hospital. Foi preciso ficar um ano sem pilotar até a recuperação completa. Apesar do processo difícil, a piloto relembra esse capítulo com a naturalidade de quem sabe desde cedo o quanto o automobilismo inclui também enfrentar riscos.

    “Correr faz você desde criança aprender a lidar com pressão, com a adrenalina, com o psicológico e a se virar sozinha”, afirmou. Desde que teve a classificação confirmada no processo seletivo, Antonella se tornou ainda mais conhecida na cidade natal. Dias atrás, pouco antes de atender a ligação do Estadão, ela participava de um programa em uma rádio local. “Todo piloto sonha com a Ferrari. Toda a minha família ficou impactada com essa notícia. Eu moro em uma cidade pequena e ainda assim fui escolhida. Na vida tudo é possível”, disse.

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