Pouco antes de ser morto, o ganhador de R$ 47,1 milhões na Mega-Sena, Jonas Lucas Alves Dias, de Hortolândia, interior de São Paulo, pediu de forma insistente à gerente de seu banco para que liberasse R$ 3 milhões de sua conta. Ele já estava em poder dos bandidos e sofria tortura física e psicológica para entregar o dinheiro à quadrilha, segundo a polícia.
O milionário alegou que o recurso seria para a compra de uma propriedade rural. “Consegue liberar isso para mim? Estou aqui na fazenda, preciso fechar isso aqui hoje”, pediu. As conversas estão em áudios obtidos pela investigação, conforme a Polícia Civil confirmou à reportagem. Por causa do valor alto da transferência, o montante só poderia ser liberado presencialmente. Dias havia sido sequestrado pouco antes das 6h30 do último dia 13 e foi encontrado por volta das 4h30 do dia seguinte, desacordado, à margem da Rodovia dos Bandeirantes. Levado para um hospital de Hortolândia, ele não resistiu.
A investigação apontou quatro suspeitos de participação no crime. Dois deles estão presos. Os foragidos já tiveram a prisão decretada e estão sendo procurados. Conforme a delegada Juliana Ricci, da Divisão Especializada de Investigações Criminais (Deic) de Piracicaba, a vítima foi espancada de forma brutal pelos criminosos para revelar a senha do cartão e transferir dinheiro de sua conta. O fato de não ter conseguido sucesso na transferência provavelmente exasperou os agressores, segundo ela.
Quando foi abandonado na margem da rodovia, Dias já estava praticamente agonizando, com muitos ferimentos, principalmente no rosto. Seu corpo estava molhado pela chuva que caiu naquela noite. Imagens obtidas pela polícia mostram que os dois veículos usados pelos criminosos – uma picape S-10 prata e um automóvel Fiesta preto – rondavam a casa do milionário, indicando, segundo a investigação, que a quadrilha já conhecia seus hábitos. Naquele início de manhã, Dias repetiu o que fazia todos os dias, saindo de casa por volta de 5h30 para ir à padaria, onde comprou uma esfirra, suco de laranja e pães.
O homem voltou para casa, entregou os pães à irmã e saiu para caminhar, momento em que foi arrebatado e colocado na S-10. Duas horas depois, o sequestrador que dirigia a picape, Marcos Vinicyus Sales de Oliveira, o Vini, de 22 anos, foi flagrado por câmeras em uma agência da Caixa Federal, em Campinas, usando o cartão da vítima para fazer saques, conforme a polícia. Ele fez dois saques no valor de R$ 1 mil cada e, em seguida, uma transferência de R$ 18,6 mil na conta de uma jovem de 24 anos, identificada como Rebeca Messias Pereira Batista.
A jovem foi presa neste domingo (18), pela Guarda Municipal de Santa Bárbara d’Oeste, e levada para o Deic de Piracicaba. Ela alegou que foi abordada por duas pessoas e convencida a abrir uma conta em seu nome para receber benefícios do governo. Rebeca continuava presa nesta segunda-feira (19). O companheiro dela chegou a ser levado à delegacia, mas foi liberado.
Também está preso desde sábado (17), Rogério de Almeida Spíndola, de 48 anos, que estava em um dos veículos flagrados no cenário do crime. Com passagens pela polícia por roubos, furtos, homicídio, estelionato e lesão corporal, ele cumpriu 15 anos de prisão e estava em liberdade desde dezembro do ano passado. Assim como Spínola, Marcos Vinicyus também é egresso do sistema prisional. Preso por estelionato e receptação, ele deixou o sistema penitenciário em setembro de 2021.
Os dois moram em Santa Bárbara d’Oeste, cidade vizinha a Hortolândia, e podem ter planejado juntos o crime, segundo a delegada Juliana. Embora não tivessem qualquer relação com a vítima, ela acredita que eles sabiam que o ganhador da Mega-Sena cumpria rotinas diárias simples e não andava com seguranças. Marcos Vinicyus ainda é procurado pela polícia.
O quarto suspeito do crime, Roberto Jeferson da Silva, o Gordo, de 38 anos, dirigia o Ford Fiesta preto também usado no crime. Ele não tinha passagens pela polícia e continuava foragido. A defesa de Rogério Spíndola nega que ele tenha tido participação no crime. Segundo o defensor, ele tinha negócios lícitos com Roberto Jeferson e Vinicyus. Até a manhã desta segunda, Rebeca não havia constituído advogado.
O diretor do Departamento de Polícia Judiciária do Interior 9 (Deinter-9), Kleber Altale, não descartou a possibilidade de haver mais envolvidos no crime. Segundo ele, as investigações prosseguem para a prisão dos demais suspeitos, análise das provas já colhidas e a localização dos veículos para a elucidação total do crime, que é tratado como extorsão seguida de morte.