• ‘Forças Armadas são politizadas e cooptaram o candidato Bolsonaro’

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  • 04/04/2021 08:01
    Por Paloma Varon, especial para o jornal O Estado de S. Paulo / Estadão

    A historiadora e brasilianista francesa Maud Chirio, professora de História Contemporânea na Universidade de Paris-Est Marne-la-Vallée, especialista em Forças Armadas e no golpe militar de 1964 no Brasil, avalia o momento atual no País como “muito preocupante”. Ela diz não haver dúvida de que os generais são, hoje, atores da política nacional.

    Segundo a historiadora, as Forças Armadas têm uma grande capacidade de construir um discurso e uma memória institucional muito coerentes: “Todo mundo fala a mesma coisa, eles têm uma estratégia de comunicação muito firme, e isso permite muitas vezes que a mídia reproduza este discurso. Eu acho que é o momento de construir uma leitura crítica deste discurso, porque os militares estão no poder no Brasil, e, quando existem cisões internas, elas têm de ser vistas como cisões dentro de um projeto de poder.”

    A seguir, os principais trechos da entrevista:

    Na sua opinião, existe risco de ruptura da democracia com as recentes demissões nas Forças Armadas brasileiras?

    Existe uma tentativa de radicalização do regime pelo Palácio do Planalto. Não foi definido se isso é Estado de sítio, Estado de Defesa ou uso do artigo 142 da Constituição, mas tudo indica que a situação de um governo acuado, com a popularidade em queda, com uma crise social e sanitária extremamente grave, incita uma radicalização política. É difícil saber se existirão condições objetivas para uma ruptura democrática, mas existe a tentação de intensificar o caos por um agravamento da deterioração da democracia brasileira.

    Predominou a versão de que o ministro da Defesa se recusou a politizar as Forças Armadas, mas diversos militares participam do governo Bolsonaro. Por que isso causa problema agora?

    Obviamente, as Forças Armadas são extremamente politizadas no Brasil. A alta oficialidade participou diretamente do crescimento da figura política de Bolsonaro, o cooptou como candidato. A troca dos generais não significa que o governo atual não continue extremamente militarizado.

    Na sua opinião, por que houve esta ruptura parcial dos militares com Bolsonaro?

    A primeira hipótese é que parte do generalato achou que o projeto de poder deles não tem em Bolsonaro o seu melhor defensor agora. Pensam que é melhor começar a se afastar dele para não afundar com o barco. Eles acham que a sobrevivência política deles passa por um divórcio, que não é ideológico, mas é estratégico. A segunda hipótese envolve fatores humanos. Não são hipóteses contraditórias, mas é muito provável que haja uma reação ao comportamento do Bolsonaro, que sempre irritou parte dos generais, que contraria a hierarquia militar, que está tentando impor um estilo de poder que não combina com o estilo mais comum dentro do alto oficialato.

    A maneira como Azevedo foi demitido, a maneira como os comandantes das três Forças foram levados a sair dos comandos, isso criou um profundo mal-estar e acabou afastando ainda mais certos oficiais do governo. Ou seja, tem um fator que eu acho bastante estrutural, que é que parte das Forças Armadas têm há bastante tempo um projeto de poder. Escolheram o Bolsonaro para encarnar este projeto, e agora ele não encarna mais o suficiente para manter uma lealdade tão franca, tão aberta, tão completa quanto existia até agora. E existe também este pano de fundo de um funcionamento pessoal em relação à liderança, que é profundamente diferente entre a maioria dos generais e o Bolsonaro, e que parte dos generais acabou não aceitando mais se submeter a esse estilo de poder, que é uma política do caos. Bolsonaro governa pelo caos e isso é provavelmente um fator para que alguns queiram sair.

    As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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