• Fazer a vontade de Deus!

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  • 09/jun 08:00
    Por Mons. José Maria Pereira

    A Liturgia abre a primeira página da salvação. O homem e a mulher, culpados por transgredirem o preceito divino, são interrogados por Deus. Adão coloca a culpa em Eva, e Eva, por sua vez, na serpente. O pecado espalha-se e, através dos nossos primeiros pais, atingirá toda a espécie humana. Mas Deus tem compaixão das Suas criaturas e, enquanto condena a serpente de um modo absoluto, deixa entrever a salvação dos homens: “Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e a descendência dela. Esta te ferirá a cabeça…” (Gn 3,15). Desde então, Satanás tornou-se o eterno inimigo do homem, procurando sempre fazê-lo morrer no pecado. Mas, o Senhor, em pessoa, veio para libertar e fortalecer o homem, renovando-o interiormente e lançando fora o príncipe deste mundo. “Agora, o príncipe deste mundo vai ser expulso” (Jo 12,31). Jesus, linhagem da mulher, filho de Maria, veio acabar com o poder de Satanás.

    “E, Jesus, foi por toda a Galileia, anunciando o Evangelho em suas sinagogas e expulsando os demônios” (Mc 1,39). O fato despertava tanto entusiasmo, entre o povo, que os escribas- incrédulos e perversos-, sem poder negar tal evidência e não querendo reconhecer em Jesus, o Messias, atribuem o Seu poder à influência de Belzebu. E o Mestre reage a esta insinuação: “Se, portanto, satanás se levanta contra si mesmo e se divide, não pode manter-se, mas se acaba” (Mc 3, 26).

    Jesus coloca as coisas no seu lugar! Nele trava-se o grande combate entre o bem e o mal, entre Deus e satanás, o adversário da humanidade. Jesus é mais forte do que o príncipe dos demônios. Veio a este mundo para combatê-lo. Vence-o no deserto após o seu batismo; vence-o expulsando os demônios. É Ele o homem forte que guarda a casa. Tudo isso Ele o faz pelo Espírito Santo e não por algum espírito imundo.

    O Senhor convida os fariseus, obcecados e endurecidos, a fazer uma consideração simples: se alguém expulsa o demônio, isto quer dizer que é mais forte do que ele. É uma exortação a mais a reconhecer em Jesus o Deus “forte”, o Deus que com o Seu poder liberta o homem da escravidão do demônio. Terminou o domínio de satanás: o príncipe deste mundo está a ponto de ser expulso. A vitória de Jesus sobre o poder das trevas, que culmina como na Sua Morte e Ressurreição, demonstra que a luz está já no mundo. Disse-o o próprio Senhor: “É agora o julgamento deste mundo. Agora o príncipe deste mundo vai ser expulso” (Jo 12, 31-32).

    Portanto, este tempo é para nós de vigilância e de decisão. A diferença entre agora e antes de Cristo é que agora nós podemos vencer, ou melhor, “vencer de virada” (Rm 8,37); antes, – sob a Lei – não! Mas, para vencer é preciso suar, é preciso participar na luta e na vitória de Jesus, tomando nossa cruz no dia a dia e seguindo – O (Lc 9,23; Mt 16,24; Mc 8,34). Devemos completar o que falta à vitória de Jesus.  São Paulo (2 Cor, 3 -18 – 5, 1) encoraja-nos a seguir esta estrada, lembrando – nos de que a nossa presente tribulação, momentânea e ligeira, proporciona-nos um peso eterno de glória incomensurável. Não fiquemos nas generalidades; procuremos “inventar” ocasiões de vitória. Hoje mesmo! Melhor, procuremos descobri – las, porque, tais ocasiões já existem em nosso dia a dia e se chamam caridade, paciência, humildade, tolerância…

    Por isso, acreditar no poder de Cristo Jesus é confiar na misericórdia e no perdão de Deus. Ele tem o poder de perdoar pecados, pois, por sua morte e ressurreição, há de vencer definitivamente a satanás e ao pecado. Este é, na verdade, o maior adversário do ser humano, pois o afasta da comunhão com Deus.

    Agora nos espera um grande encontro: voltando de sua vitória sobre o “forte”, vem a nós “o mais forte”; vem o nosso Redentor. Vem reparar nossas perdas e as feridas da luta cotidiana; vem alimentar nossa fé e nossa coragem. Podemos dizer: “O Senhor é minha rocha e minha fortaleza, é Ele, o meu Deus, que me liberta e me ajuda”.

    “Saíram para agarrá-Lo, pois diziam: “Está fora de si” (Mc 3, 21). Alguns de seus parentes, deixando-se levar por pensamentos meramente humanos, interpretavam a absorvente dedicação de Jesus ao apostolado,- como um exagero, explicável- na sua opinião- apenas por uma perda de juízo. Ao ler estas palavras do Evangelho, pensemos no que Jesus se submeteu por nosso amor: disseram que Ele tinha “perdido o juízo”. Muitos santos, a exemplo de Cristo, passaram-se também por loucos, mas foram loucos de amor, loucos de amor a Jesus Cristo!

    “Em verdade vos digo: tudo será perdoado aos homens, tanto os pecados, como qualquer blasfêmia que tiverem dito. Mas, quem blasfemar contra o Espírito Santo, nunca será perdoado, mas será culpado de um pecado eterno” (Mc 3, 28-29).

    O que é blasfêmia contra o Espírito Santo?

    É a recusa obstinada em reconhecer os sinais e a ação de Deus, é o fechar os olhos ante os sinais do Reino, é combater o bem, definindo-o como mal. Ainda, é resistir à salvação ou desesperar da salvação ou presumir a salvação. Deus quer que todos se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade, mas não violenta a liberdade humana. Quaisquer pecados podem ser perdoados, desde que haja arrependimento e propósito de emenda. Ou seja, há uma barreira que não está em Deus, nem no seu desejo de salvar, de perdoar, mas está na obstinação em recusar o amor divino e as suas exigências. Portanto, é uma cegueira consciente, uma mentira convencida e professada, é uma obstinação no mal, mesmo sabendo que é mal.

    Comunicam a Jesus que a Sua Mãe e alguns parentes vieram à sua procura. Jesus responde-lhes: “Quem faz a vontade de Deus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe” (Mc 3, 35). Todos aqueles que, seguindo o Seu exemplo, abraçam a vontade do Pai e a cumprem, ficam unidos a Ele com vínculos tão íntimos, só comparáveis aos mais estreitos laços familiares. E desta união a Cristo, na mesma vontade do Pai, é que se tiram forças para vencer satanás.

    Por isso, a Igreja recorda-nos que a Santíssima Virgem “acolheu as palavras com que o Filho, pondo o reino acima de todas as relações de parentesco, proclamou bem-aventurados todos os que ouvem a Palavra de Deus e a põem em prática; coisa que Ela fazia fielmente” (Lumen Gentium, 58).

    São Tomás de Aquino diz: “Todo o fiel que faz a vontade do Pai, isto é, que simplesmente Lhe obedece, é irmão de Cristo, porque é semelhante Àquele que cumpriu a vontade do Pai. Mas, quem não só obedece, mas converte os outros, gera Cristo neles, e desta maneira chega a ser como a Mãe de Cristo” (Comentário sobre S. Mateus, 12, 49 – 50).

    Quem pertence à verdadeira família de Jesus?

    Todo aquele que busca cumprir a vontade de Deus. Não basta ostentar um título ou pertencer a uma instituição. Demonstra-se na vida. Fé é virtude para ser praticada. A fé autêntica e ativa é o único caminho para considerarmo-nos verdadeiramente cristãos e não o simples fato de sermos batizados. Uma fé sem obras é morta.

    Se buscarmos cumprir fielmente a vontade de Deus, teremos uma relação forte com Ele. Contamos com os auxílios divinos disponíveis: oração e sacramentos.

    Jesus espera-nos. Não somente espera, mas acompanha-nos, fortalece e guia. E vale a pena, como lembra São Paulo: Deus ressuscitar-nos-á e colocar-nos-á a seu lado. Oferece e promete outra moradia no Céu que não é obra de mãos humanas e é para sempre.

    Maria era mãe duplamente: porque gerou Jesus e, porque, mais do que ninguém, soube fazer sempre a vontade de Deus.

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