• Fatores ressuscitantes

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  • 07/abr 08:00
    Por Ataualpa A. P. Filho

    No espaço coração, os passos do tempo são caleja-dores. E, por não ser estático, ele estabelece ciclos. Com o corte do cordão umbilical, é dada a largada, o fim inicia: viemos do pó e ao pó voltaremos. Nesta travessia, sonhamos com a eternidade. Estamos aqui de passagem. Como é do conhecimento de todos, não sairemos vivo deste mundo. Nadamos para nada, apenas para não fenecer na praia sem ter edificado um passado que possa nutrir boas lembranças. O amor é que rega as saudades…

    Sabemos que biologicamente teremos um fim, porque a matéria humana é perecível. Epiderme preta, branca ou amarela, pouco importa, a morte é para todos. “Cada minuto da vida/ Nunca é mais, é sempre menos/ Ser é apenas uma face/ Do não ser, e não do ser./ Desde o instante em que se nasce/ Já se começa a morrer.” – Afirmara Cassiano Ricardo no poema “O Relógio”.

    Digitais ou pendulares, os relógios continuam a marcar o tempo que foge do nosso controle. A agenda dos compromissos profissionais não pode ser transformada em pelourinho. Escravizar-se para atender às ansiedades do consumo consiste em conduzir a vida por um caminho estressante. Viver pela obsessão de acumular capital para ampliar, a qualquer preço, o poder de compra pode acarretar sérios problemas.

    Acho que algumas pessoas hoje estão em maus lençóis, porque se deixaram corromper pelo vil metal. Venderam a alma, por isso sofrem as consequências da corrosão ética. A todo custo, viveram em função da aquisição de bens para ter o prazer de dizer que houve uma realização pessoal; quando, na verdade, apenas desejavam ser felizes.

    Como a felicidade não está nas vitrines, a ostentação da riqueza é usada como peneira para tampar o sol da tristeza. As desilusões, os fracassos estão nas derrotas das lutas travadas dentro de si. A maior vitória é a que nos faz erguer a cabeça sem peso na consciência.

    Ultimamente estamos assistindo ao desmoronamento de algumas máscaras. Estão sendo desvelados falsos perfis de hombridade que se ergueram sobre pilares que usurpam a boa fé do povo, explorando-a em benefício próprio.

    A queda pela decepção pode provocar danos irreversíveis. Embora seja raro, ainda há quem valorize os princípios morais. É admirável ver alguém construindo uma trajetória de vida fundamentada na ética, na honestidade, no respeito ao outro, sem uso de meios ilícitos para conquistar um “lugar ao Sol”. É possível erguer-se sem puxar tapetes e sem esconder nada debaixo deles. Admiro as pessoas que amam o trabalho. E trabalham com amor. E assim, tornam-se referências, exemplos de dedicação.

    Na santa semana que passou, certifiquei-me, mais uma vez, da importância dos fatores ressuscitantes: ternura, amor, amizade, companheirismo, parceria, carinho, perdão, lealdade, sinceridade…

    Amar para ressuscitar o humano em si. Crer e crescer na fé. Nutrir esperanças. Fraternizar-se, acaridar-se, por inteiro, não por metade. Perdoar para pacificar o coração. Libertar-se do ódio. Em ressurreição, remover as pedras dentro de si. Renascer antes de voltar ao pó.

    O processo de ressuscitamento é contínuo como também é contínuo o nosso fenecimento biológico com o passar das horas.  Como acredito que o ser humano não se limita à matéria, valorizo a espiritualidade, porque a vejo como uma oportunidade de alcançar uma dimensão capaz de trazer uma resignação que permite compreender fatos que estão fora do nosso alcance, uma vez que somos limitados. O bom da Ciência é que ela também reconhece os seus limites. A fé nos leva para além do horizonte das nossas retinas.

    A religiosidade tem contribuído muito para a paz interior, uma vez que se fortalece por confiar na misericórdia divina. É válido ressaltar que resignação é diferente de conformismo. É preciso ter discernimento para reconhecer o que não pode ser mudado por não estar ao nosso alcance. Contudo, empenhar-se inteiramente para mudar aquilo que é possível e que possa beneficiar não somente a si, mas a todos. E, quando estamos unidos, as chances do desespero são menores.

    Recarreguei as minhas baterias de esperanças neste período pascoal. Ganhamos uma amiga na qual se encontra a certeza de que o servir alicerçado na fé expõe a claridade que há na caridade quando a Luz vem do Amor Supremo. Sei que a fé move montanhas. Mas, no momento, precisamos desta que nos leva ao próximo, rompendo todas as barreiras das segregações. Como é bom saber que não estamos sozinhos nesta caminhada!…

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