• Exposição da discórdia

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  • 23/09/2017 12:00

    No Estado Democrático de Direito se pode fazer o que a lei permite e o que ela não proíbe, desde que não se invada direito alheio. Ao artista é dado criar o que sua inspiração desejar. Mas a discórdia na exposição Santander vem provar: nem toda criação pode ser livremente exposta. Vejamos.

     Existe a performance, o “happening” como obra artística. Imagine – e perdoe a crueza dos exemplos, não distantes de happenings já acontecidos – o artista que resolva exibir-se nu, pincelando telas com seu pênis. A pintora que se deita, encharcada de tintas, em grande tela, ao som de Vivaldi, e masturba-se para que contorções de seu corpo produzam a “obra” que pretende. E aquele que defeca sobre chapas de aço, exibindo em telão as “esculturas” produzidas por seus intestinos. Tudo isso seria permitido? 

     Museus e galerias são casas abertas. Podem ser visitadas por menores de idade. Aí o primeiro problema. Certo promotor de infância e juventude foi à exposição do Santander e meio que a “absolveu”. Talvez autorizasse os happenings que citei. Sua rasa interpretação é: o ECA não prevê literalmente restrição a galerias e museus. Ora, a interpretação teleológica e sistêmica diz que se é obrigatória a restrição de acesso de menores de 18 anos a produtos culturais e de lazer a eles inadequados, é claro que os exemplos sugeridos merecem restrição, dada a sexualidade e nudez explícitas. Afora o mau gosto, que não é objeto de lei.

     Outras limitações vem da natureza do financiamento da obra. É direito do contribuinte não desejar impostos financiando espetáculos dessa ordem (o Santander usou a Lei Rouanet!). Isso limita o direito do estado de patrocinar tais obras, e restringe o direito do artista exibi-las em certos lugares. Pode um particular, do próprio bolso, bancar tais obras? Se classificar o acesso conforme a faixa etária (ditame legal) e, acresceria, desde que avise previamente à plateia sobre a natureza da exibição (ditame do bom senso) poderá.

     Agora, sendo o particular um banco, mantido por milhões de correntistas, poderá cumprir tal intento sem considerar sensibilidades de acionistas e correntistas? Não! A contrariedade de correntistas e acionistas expressa por voto, abaixo-assinado ou retirada das contas bancárias, é um limitador da liberdade desse banco. Somente o particular que exerça mecenato sem qualquer dependência de terceiros – se cumprir as restrições já dadas – poderá promover tais coisas.

     O raciocínio é simples. Nem quis aqui agravá-lo mais com o vilipêndio de sentimento religioso, previsto no artigo 208 do Código Penal. A exposição Santander (afora o bestialismo e as “crianças viadas”), ao mostrar Maria com um Jesus símio ao colo, o Cristo de mil braços (como divindade hindu?), e as hóstias com nome de genitais, está, sim, vilipendiando símbolos religiosos caros a milhões de pessoas, correntistas, acionistas, e público em geral. 

     Não existem liberdades absolutas, e quem abusa deve sofrer restrição, que não é censura. É restrição. Pode-se pensar tudo a qualquer hora, em qualquer lugar. Mas não se pode dizer ou exibir tudo em qualquer hora e lugar, a todos, indistintamente. É direito de uns não verem agredido seu culto religioso, de outros não verem filhos expostos a coisas que podem afetar sua psiquê. Tais direitos limitam a liberdade de exibição de obras de arte, sim. Romper isso, além de poder configurar infração civil e/ou penal, é absoluta falta de bom senso.

    denilsoncdearaujo.blogspot.com

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