Esperança e decepções
A perseverança, a tenacidade são virtudes de quem luta por mudanças sociais em vias democráticas. A desesperança não pode abater quem traz consigo a certeza de que o bem comum deve prevalecer sobre os mesquinhos egoísmos e vaidades que alimentam as segregações.
Tenho ouvido os depoimentos de caminhoneiros que se decepcionaram com as atitudes das pessoas que, a princípio, apoiaram o movimento de paralisação que houve, no mês passado, contra o aumento de combustível. Mas quando a gasolina começou a faltar nos postos, estes fizeram filas para comprá-la com preço majorado. Isso revoltou aqueles que ficaram acampados nas estradas com o intuito de pressionar o Governo a baixar o preço do diesel, dos pedágios e diminuir os impostos sobre o produto.
Ilustres caminhoneiros, posso lhes garantir que os professores já passaram por inúmeras decepções semelhantes. Creio que os senhores já tiveram a oportunidade de ver cenas em que os educadores foram espancados por reivindicar salário justo e melhores condições de trabalho. É válido citar que os professores educam os filhos de muitos dos que os espancam a mando de governantes que destilam demagogias em campanhas políticas.
Ilustres caminhoneiros, esse sabor amargo da ingratidão até Cristo sentiu da pele, quando pregava o amor entre os homens. A história está repleta de casos semelhantes a esses que já vivenciamos. Esperar gratidão, reconhecimento pelo bem que se pratica é ficar exposto a decepções. Temos sim que caminhar de mãos dadas com quem faz da vida uma doação almejando um mundo melhor. Confesso-lhes que a indignação desestimula, além de abrir espaço para discórdia. Não se pode perder a ternura. O ódio abre a porta da radicalização e conduz a ansiedade pelo caminho da agressividade. É preciso manter a tranquilidade para permitir o diálogo.
Pior do que a decepção é a traição. E desta também, nem Cristo se livrou. Quando ela vem regada pela dissimulação bate mais forte nas costas do povo do que o punhal de Marco Bruto em Júlio Cesar no Senado Romano.
Ilustres caminhoneiros, considero o vosso movimento vitorioso. Ficou visível a tentativa do Governo de procurar uma solução para conter a paralisação em curto prazo. Já houve greves de professores que duraram meses e os governantes não se moviam para contê-la. Mas recepcionaram os educadores com aparato militar, no qual os cassetetes e as bombas de gás estavam presentes.
E por estas mal traçadas linhas, quero lhes dizer também que a primeira desilusão social “a gente não esquece”: ainda na “aurora da minha vida”, tentava entender por que a canção do Vandré “Pra não dizer que não falei das flores” sofria os cortes da censura e a música dos Carlos "Quero Que Vá Tudo Pro Inferno" tocava nas paradas de sucesso. Ouçam a música “E que tudo mais vá para o Céu” de Belchior. Esta nunca ouvi tocar no rádio. É uma bela canção, faz alusões históricas e tem uma poesia que não se distancia da vida.
O tempo sabe curar as injustiças, pois a verdade, um dia, vem à tona. O vil metal não é tudo. Os filhos costumam se orgulhar dos pais que atravessaram tempestades em busca de um sonho. Essa é uma herança que fica na memória.
Quando meus pais me ensinavam o exercício da cidadania, diziam que deveria “fazer o bem sem olhar a quem”. Isso me ajudou a suportar a ingratidão e a fugir dos falsos elogios. Escolhi servir a sociedade pelo magistério, por considerar a educação imprescindível. Aprendi a valorizar as lições de vida. Mas ainda luto para entender como caminha a humanidade.