Envelhecer em Petrópolis: uma tarefa nada fácil para a “Melhor Idade”
Petrópolis é reconhecidamente uma cidade relativamente pacata e conhecida pelos seus pontos turísticos. Em tese, seria perfeita para quem deseja uma velhice plena e bem tranquila, até porque sua geografia nos remete à paz, com uma natureza exuberante, certo? Só que não é bem assim. Envelhecer na Cidade Imperial tem se tornado um enorme desafio para essa importante e significativa parte da população.
Recentemente, um levantamento realizado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) causou enorme preocupação para as pessoas que fazem parte da “Melhor Idade”. O Índice de Preços ao Consumidor da Terceira Idade (IPC-3i), que mede a variação da cesta de consumo de famílias compostas em sua maior parte por indivíduos com mais de 60 anos de idade, apresentou uma variação de 0,80% no quarto trimestre de 2018 e totalizou, no ano, aumento de 4,75%. O resultado superou a inflação acumulada em 2018 pelo Índice de Preços ao Consumidor Brasil (IPC-BR), que foi de 4,32%. Ou seja, superior aos demais números relativos aos índices que medem o aumento ou a redução do valor de mercado ou poder de compra do dinheiro.
Ainda segundo o IBGE, os números levantados no último censo registraram que Petrópolis tem 14,3 % da população composta por idosos, sendo, no total 42.800 pessoas. A média da renda per capita dessa parte importante da sociedade corresponde a R$ 1,9 mil – números acima dos atuais R$ 954 do salário mínimo. Embora 2018 tenha fechado com uma inflação menor do que 4%, abaixo do centro da meta do governo, são inúmeros os desafios para os petropolitanos garantirem uma qualidade de vida.
O economista Marcelo Scistowicz tem algumas explicações que justificam a alta no IPC-3i na Cidade Imperial. Como por essas bandas o custo de vida é considerado alto, tem outros fatores primordiais que pesam no bolso dos idosos locais. Segundo ele, o custo dos remédios, planos de saúde e alimentação consomem boa parte do orçamento daqueles que já garantiram a sua aposentadoria. “É preciso fazer mágica para fechar as contas no final do mês. Como a aposentadoria está vinculada ao salário-mínimo, o reajuste não acompanha o aumento dos preços. Os aumentos impactam diretamente nos preços e isto torna a gestão financeira mais complicada”, diz ele.
Como se não bastasse o IPC-3i se tornar um problema sério para as contas dos idosos, há um outro aspecto apontado pelo economista petropolitano que é um fenômeno não raro: filhos, quando desempregados, acabam voltando para a casa dos pais. Esse fenômeno gera um gasto muitas vezes não previsto no limitado orçamento familiar. “Muitos idosos acolhem o filhou e, quando não, a família inteira em casa por causa de uma situação de desemprego. É realmente assustador. Isso pode compensar com os filhos ajudando seus pais em tarefas básicas e até na atenção, mas impacta no orçamento”, explicou Scistowciz.
A já apelidada “inflação dos velhinhos”, de fato, traz uma inquietação para aqueles que deveriam priorizar o descanso após anos de trabalho. A professora aposentada, Margaria Maria Rocha de Castro, que o diga, pois apesar de seus quatro filhos serem adultos, ainda ajuda dois deles com moradia e compra de remédios. Isso, entretanto, nem é o que mais impacta o orçamento mensal. Ela se queixa de boa parte do seu dinheiro ser gasta com remédios. “Mesmo com os descontos de algumas farmácias, é muito dinheiro gasto com a medicação. Isso é para manter a gente viva e em condições para ajudar meus filhos”, disse ela, num tom de bom humor.
Exercícios como ferramenta para aliviar os problemas do cotidiano
Para uma cidade com poucos atrativos para a terceira idade, a saída para uma parte dos idosos tem sido ficar em casa, assistir à televisão e, quando muito, cuidar dos netos. Mas, para outra parte importante, fazer exercícios é o melhor remédio para driblar a ociosidade e, ao mesmo tempo, assegurar uma melhora na qualidade de vida. O treinador da Pé de Vento, o médico Henrique Viana, disse que, de acordo com a Organização Mundial da Saúde, cada dólar investido no esporte equivale a cinco a menos em gastos na saúde. No município, funcionou por cinco anos um projeto pioneiro com idosos no interior de uma universidade e este trabalho rendeu projetos científicos que ajudam a entender a dinâmica da saúde dos idosos petropolitanos.
O autor do projeto é o mestre em educação física, Renato Farjalla, que montou uma espécie de laboratório com profissionais das mais diversas áreas para aprofundar os estudos sobre o impacto da atividade física na saúde física e mental dos idosos. Centenas deles passaram pelo trabalho, o que rendeu um material capaz de jogar luz em questões importantes para essas pessoas que querem uma melhor qualidade de vida por muitos e muitos anos ainda.
Com a experiência de 25 anos dedicados a entender o mecanismo físico da terceira idade – com direito a um mestrado em Portugal –, Farjalla não tem dúvidas quanto a eficácia do exercício contínuo no cotidiano, sendo que em vários casos os alunos chegaram até a reduzir pela metade o uso dos remédios. E fez um alerta para que políticas públicas sejam voltadas para a garantia de uma saúde melhor e, ao mesmo tempo, para a redução do número de pessoas nos hospitais.
“Não sou eu quem está dizendo, mas várias pesquisas apontam para o envelhecimento rápido da população, o que vai exigir uma demanda de projetos e investimentos para amenizar os problemas enfrentados pelos idosos. Há quem diga que, daqui a 25 anos, vão superar o número de pessoas com até 20 anos. É uma situação urgente e que precisa ser tratada agora”, diz o professor de educação física.
Na questão local, Petrópolis possui uma grande população de idosos. Porém, a cidade ainda carece de espaços públicos que propiciem a prática de exercícios para esta população. É público e notório que a inatividade física é o elemento que mais compromete a qualidade de vida na terceira idade e que, com o envelhecimento, ocorre uma diminuição de várias capacidades físicas, como força muscular, flexibilidade, equilíbrio, condicionamento cardiorrespiratório entre outras.
A professora de educação física, Flávia Guimarães, concorda que a prática regular de atividade física é essencial para combater os principais males que afligem a saúde do idoso. “O desuso muscular está associado à piora da saúde metabólica, redução da tolerância à glicose e aumento da resistência à insulina. Além disso, a perda de massa muscular e força induzida por desuso afeta os músculos posturais, aumentando o risco de quedas e fraturas. Além disso, vimos recentemente um estudo publicado pelo grupo de estudos da UFRJ, que a prática regular de exercício é capaz de prevenir e potencialmente tratar do Mal de Alzheimer, através da liberação de um hormônio pelos músculos, chamado irisina”, disse a professora, que desenvolve um projeto chamado Viva+, na academia Body Club, onde os idosos praticam exercícios em pequenos grupos de maneira sistematizada, com foco na melhora da autonomia funcional, ou seja, a capacidade de realizar de maneira eficiente as atividades da vida diária e aumentar assim a saúde e qualidade de vida desta população.