• Em seu mestrado em Economia, Haddad criticou modelo soviético

  • Continua após o anúncio
  • Continua após o anúncio
  • 06/12/2022 10:40
    Por Luciana Dyniewicz e Luiz Guilherme Gerbelli / Estadão

    Nome mais cotado para comandar o Ministério da Fazenda, Fernando Haddad tem como formação na área econômica um mestrado realizado no fim dos anos 1980 na Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária da Universidade de São Paulo (FEA-USP). Na instituição, ele apresentou uma dissertação em que procurou demonstrar que o regime soviético – que agonizava à época – era “despótico”, não tinha “nenhum traço libertário” e, portanto, “iria se desdobrar em uma economia capitalista tradicional”, disse o petista.

    Sob o título O Debate sobre o Caráter Socioeconômico do Sistema Soviético, Haddad comparou o “despotismo stalinista” com outras “formas anômalas de acumulação primitiva do capital, como o caso da escravidão na América”. Na introdução do trabalho, o então estudante afirmou que o modo de produção capitalista era “progressista em relação ao sistema soviético” – diferentemente do que afirmava grande parte dos teóricos da época, que defendiam que a realidade soviética era “pós-capitalista, pré-socialista ou socialista”.

    A dissertação de mestrado escrita por Haddad tinha o objetivo de ultrapassar os muros da academia. Serviu também como uma forma de contestação da esquerda, que enfrentava uma mudança de rota com a queda do muro de Berlim, em 1989, e via próximo o fim da União Soviética.

    “Foi uma dissertação corajosa porque se contrapôs aos dogmas da esquerda”, afirmou o jornalista Eugênio Bucci, que antecedeu ao petista na presidência do Centro Acadêmico XI de Agosto, em 1984. “Lembro dele me falando da motivação em fazer a tese. Ele já tinha uma militância política. Tinha sido presidente do centro acadêmico e tinha uma ligação com o PT”, disse Paulo Picchetti, hoje professor da Fundação Getulio Vargas, que foi colega do ex-prefeito de São Paulo no mestrado.

    Embate

    Ao Estadão, Haddad afirmou que seu trabalho foi “solenemente ignorado pela esquerda”. Segundo o político, parte da esquerda da época até leu sua dissertação, mas não foi para “o embate defender o que estava terminando (a URSS)”.

    “Achava difícil defender aquilo que estava terminando. Sempre fui de uma esquerda libertária. Nunca participei de nenhuma organização que tivesse simpatia por regimes despóticos. Considerava que a avaliação sobre a experiência era equivocada, que aquilo era uma repaginação dos traços despóticos (da Rússia) com finalidades industrializantes.”

    Nova publicação

    O então estudante foi formalmente orientado pelo professor Eleutério Prado, que afirmou que, na prática, essa orientação não se deu. “A dissertação foi feita inteiramente pelo sr. Haddad, uma pessoa muito capaz e inteligente. Eu era coordenador de curso e tive de viabilizar a sua conclusão do mestrado, assumindo formalmente a orientação”, disse por e-mail. “Talvez você queira saber se, em minha opinião, (ele) tem competência para ser ministro da Fazenda. Tenho a certeza que sim”, acrescentou Prado.

    Após 32 anos da defesa da tese, Haddad está se debruçando sobre ela novamente. Ele afirmou que a editora Companhia das Letras lhe propôs a publicação de uma segunda edição do trabalho – a dissertação foi publicada em livro em 1992 com o título O Sistema Soviético – Relato de uma Polêmica.

    Haddad vai atualizar o texto, que considera mais atual hoje do que na época, e acrescentar um capítulo extra sobre a experiência chinesa. “O debate está recolocado em função da China. Tem gente que defende que a China não vai migrar para o capitalismo como a Rússia migrou, que a China tem uma perspectiva diferente”, disse.

    Últimas