• Em ‘El Buen Patrón’, Javier Bardem é um chefe antiético

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  • 25/09/2021 09:30
    Por Rodrigo Fonseca, especial para o Estadão / Estadão

    Dois meses se passaram desde que Javier Bardem perdeu sua mãe. A atriz Pilar Bardem, estrela do cult Ninguém Falará de Nós Quando Estivermos Mortos (1996), morreu no dia 17 de julho, quando seu filho, hoje com 52 anos, soube da escalação de seu mais recente trabalho em longas-metragens – a comédia El Buen Patrón – agora na disputa pela Concha de Ouro do 69º Festival de San Sebastián, que termina neste sábado, 25. Ao mesmo tempo, iniciou a maratona global de divulgação da nova versão de Duna, sob a direção de Denis Villeneuve, na qual vive Stilgon.

    Mal teve tempo de passar pelo luto, sob demandas diversas, a maioria de Hollywood, que o escalou para uma série de potenciais sucessos. Nos próximos meses, ele será visto como o Rei Tritão na adaptação live action do desenho animado A Pequena Sereia, rodada por Rob Marshall, e aparecerá como o produtor Desi Arnaz em Being The Ricardos, sobre os bastidores do seriado I Love Lucy, dos anos 1950. Mas as missões que a indústria hollywoodiana oferece a ele não cortam seus vínculos com o audiovisual espanhol, em especial se o convite vem do diretor Fernando León de Aranoa, seu parceiro em sucessos do passado.

    “Um bom roteiro é um presente para um ator. E foi o que encontrei aqui ao falar de um homem cujo código particular de honra é uma simples desculpa para seu abuso de poder, para atropelar os direitos fundamentais de seus funcionários.

    Uma pessoa antiética. Mas essa doença que ele encarna vem do olhar do Fernando”, disse Bardem, em resposta ao Estadão em San Sebastián, onde El Buen Patrón dispara como um dos favoritos a prêmios na competição oficial, sobretudo o troféu de melhor ator. “A questão central aqui é discutir relações de força em um ambiente de trabalho.”

    Vinculado à tradição do cinema político europeu dos anos 1970, como o italiano A Classe Operária Vá ao Paraíso (Palma de Ouro em 1972), El Buen Patrón dá a Bardem seu melhor papel desde Biutiful, pelo qual ganhou o prêmio de melhor interpretação em Cannes, em 2010. Ele vive Blanco, dono de uma metalúrgica que se faz passar por um pai para seus empregados, mas é capaz de explorar a boa vontade deles sem nenhum pudor. Da mesma forma, ele disfarça seu sexismo numa postura avessa a práticas machistas, mas abusa das mulheres que o cercam, em nome do prazer.

    “Blanco é um sujeito que usa a palavra ‘éxito’ como desculpa para abusar da boa vontade alheia. O que Fernando me ofereceu ao me escalar para esse personagem foi um meio de discutir a busca pelo controle”, disse Bardem, que passou pelo Festival de Veneza no início do mês para a estreia de Duna e para acompanhar sua mulher, a atriz Penélope Cruz, premiada por Madres Paralelas, o novo Almodóvar.

    Penélope e ele trabalharam com Aranoa em Escobar – A Traição (2017). Antes, ele e o cineasta fizeram Segundas-Feiras ao Sol, que conquistou o prêmio máximo de San Sebastián, em 2002, e se tornou um dos filmes mais populares do cinema espanhol. Ali, o cineasta consagrou sua estética, pautada num humor de tom sociológico.

    “Não quero que a história de um homem como Blanco se resuma a ideia maniqueísta do bem contra o mal. A ideia era partir daquele sujeito para debater a ideia de solidariedade, e a falta dela, no ambiente de uma empresa”, afirmou Aranoa ao Estadão.

    Amigos há duas décadas, o realizador e Bardem enxergam o riso como uma forma de exorcismo para os males do capitalismo e as alienações do sistema fabril.

    “Construímos essa história buscando memórias do que vimos e vivemos, sempre questionando o que possa estar nas margens da ética”, lembra Javier. “O grande encanto do trabalho de um ator é conhecer pontos de vista sobre a vida muito diferentes dos nossos, mesmo aqueles como os de Blanco, que são indefensáveis.”

    Iniciado no dia 17, com One Second, de Zhang Yimou, San Sebastián chega ao fim neste sábado, com a cerimônia de premiação. Além de El Buen Patrón, o festival consagrou o novo longa-metragem do francês Laurent Cantet (de Entre os Muros da Escola): o drama Arthur Rambo, sobre a cultura do cancelamento. Um outro concorrente muito elogiado é o drama geracional argentino Camila Vai Sair Esta Noite, de Inés Barrionuevo, sobre conquistas do feminismo.

    O Brasil concorre a prêmios na seção Nest, de curtas, com o musical Fantasma Neon, de Leonardo Martinelli, e na seção Horizontes Latinos, com o longa Madalena, de Madiano Marcheti.

    As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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