Em ‘Batem à Porta’, Shyamalan retorna com os medos de cada dia
Pense que você saiu em férias, com sua família, e alugou um chalé afastado de tudo e de todos. Quer uns dias para você, para descansar e ficar com os seus. Até que, do nada, um grupo de quatro pessoas invade o chalé e avisa: um de vocês precisa morrer para evitar o fim do mundo. Essa é a trama de Batem à Porta, novo filme de suspense de M. Night Shyamalan (de Sinais), em cartaz nos cinemas brasileiros. E, nos EUA, o longa bateu Avatar: O Caminho da Água na bilheteria do fim de semana, derrubando uma liderança de sete semanas do filme de James Cameron.
Baseado em um livro do norte-americano Paul Tremblay publicado em 2018, e que chegou ao Brasil com o título de O Chalé no Fim do Mundo, o longa-metragem coloca essa dinâmica tensa em cima de Andrew (Ben Aldridge) e Eric (Jonathan Groff) e da filha Wen (Kristen Cui), que estão viajando quando quatro estranhos (Dave Bautista, Nikki Amuka-Bird, Rupert Grint, Abby Quinn) batem à porta e fazem essa exigência: ou se sacrificam ou o mundo acaba.
Coisas reais
É uma dinâmica similar à já vista na filmografia de Shyamalan, que tem um apreço especial por fazer comentários em seus filmes sobre coisas reais, palpáveis. Na primeira década de 2000, por exemplo, ele não deixou de falar sobre o medo do desconhecido (Sinais, O Sexto Sentido), sobre um possível apocalipse (Fim dos Tempos) e até sobre a crença em alguma criatura para interferir no rumo da humanidade (A Dama da Água).
Agora, desde que a pandemia do coronavírus se tornou uma realidade, Shyamalan se fechou e começou a pensar em temas como envelhecimento (Tempo) e, com seu novo filme, fé, ameaças à vida e fim do mundo. Uma reflexão acerca do que vemos e vivemos.
Minimalista
Gravado quase inteiramente em um único cenário, o filme é uma história minimalista de catástrofe e do fim do mundo.
A trama, assim como aconteceu no mundo todo durante a pandemia do coronavírus, se desenvolve em um ambiente fechado, único, enclausurado. Os personagens sabem do final do mundo (ou seria um hipotético apocalipse?) pela televisão, pela janela de casa. Ele nunca chega perto como uma ameaça.
É, assim, um retrato bem diferente do que estamos acostumados a ver sobre o que é o final do mundo, da vida, da humanidade. Shyamalan, nesse recorte, se retrai, se encolhe e, assim, leva o medo do fim de uma forma bem distinta. É uma experiência diferente e que, por isso mesmo, pode causar reações de amor e ódio na audiência do longa.
Afinal, mais do que ser um filme sobre fim do mundo, Batem à Porta consegue trazer o que há de melhor no livro de Paul Tremblay: uma reflexão metafísica sobre fé, existência e sociedade. Shyamalan pinça essa história, assim como pinçou os quadrinhos de Tempo, como uma forma de comentar sobre o que nossa sociedade se tornou. Uns contra os outros, sem acreditar exatamente no que os outros dizem – tampouco em algo que nos mova.
É uma provocação de Shyamalan, que nos leva a pensar sobre nossa existência e, quem sabe, o significado de estarmos aqui, vivos. Será que devemos desconfiar do outro?
E, apesar dos vários acertos do filme, que já está sendo comparado ao fracasso de Fim dos Tempos, Batem à Porta é inegavelmente mais um filme polêmico de M. Night Shyamalan.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.