Dou-te um facho de luz
Morreu arrastado pelas ruas do Rio, preso ao cinto de segurança do carro roubado de sua mãe. O crime bárbaro nos deixou em choque. Era uma criança, e a crueldade remetia a esquartejamentos medievais de corpos arrastados por cavalos. A morte de João Hélio soma dez anos, não por acaso, neste 2017 de trevas.
Ano em que presídios do Brasil, latas de sardinha cheias de pólvora, desnudaram a guerra de matanças cruéis, em que se exibem cabeças degoladas como troféus. Em que o Espírito Santo, que chegou a ser considerado um “case” de sucesso, inclusive na segurança pública (!), mostra a maldade humana exposta livremente no momento em que se recolheu a polícia, na greve de justas razões (04 anos sem reajuste) mas abusiva forma (paralisação completa de serviço essencial). Mais de 100 assassinatos depois, os bandidos seguem nas ruas, a população trancafiada em casa.
E Brasília, essa capital medieval, nos brinda com um governo Temer cada vez mais frustrante, repetindo em Moreira Franco a fuga para o ministério que Lula já tentara; nomeando para presidir a Comissão de Constituição e Justiça do Senado um implicado na Lava-Jato; e revelando ser o Presidente da Câmara nada mais que outro envolvido em troca de favores ilícitos.
Ano de o Estado do Rio de Janeiro, metido num buraco sem fundo, ver cassados os mandatos do desgovernador e do vice-desgovernador, integrantes do grupo político do maior ladrão descoberto pela Lava-Jato até agora, o mesmo Sérgio Cabral das bebedeiras parisienses com guardanapo na cabeça, dos cofres no exterior com ouro e pedras preciosas, dos mais de 100 milhões de dólares roubados de nós.
Não bastasse tudo isso, passo eu pela Rua Irmãos D'Angelo em plena tarde desta quarta-feira de 2017 e me deparo com o grupo de meninos de 14 a 16 anos de idade, passando de mão em mão a garrafa de bebida que, à vista de todos, era tragada em goles irresponsavelmente profundos, enquanto em bêbada algazarra contavam aventuras sexuais precoces. Pensando na elevação dos índices de AIDS entre jovens, noto na banca em frente as notícias sobre o avanço da febre amarela, que vem se somar ao renascer da malária, ao incremento da dengue, da chikungunha e da misteriosa doença da urina preta nestes tempos de peste negra.
E segue o genocídio na Síria. A Rússia descriminaliza a violência doméstica, num país com recordes do alcoolismo que agrava os surtos de agressões contra a mulher, como se vê de qualquer plantão policial de fim de semana. E Trump, de quem não tiro o direito de querer melhor controlar acessos às suas fronteiras, carrega na mão e erra na dose, misturando alhos com bugalhos e propondo xenófobas medidas fossos de castelo. É uma Idade das Trevas.
Por essas e outras lembrei Adélia Prado, no auge da crise de ódios que rachou o país antes do impeachment, comovida ao fim de uma palestra, pedindo que as pessoas cantassem com ela uma prece. Tem no youtube. Precisamos de Deus, ela disse. Com ela, repito o que falei ao púlpito da Igreja Batista de Correas domingo passado, “nunca precisamos tanto da benção de Deus como agora”. E é por isso que termino esse texto com a passagem que deu mote ao sermão. Receba em seu coração como um facho de luz a benção araônica, do livro de Números 6:23-25. “Que o Senhor te abençoe e te guarde. Que o Senhor faça resplandecer o Seu rosto sobre ti e tenha misericórdia de ti. Que o Senhor sobre ti levante o rosto e te dê a paz.” Amém.
denilsoncdearaujo.blogspot.com