“Don Rossé Cavaca” e Flávio Maciel
Humor,eis uma arma mortal, com as verdades que necessitam ser ditas, porémde forma diferente e, por vezes, muito perigosas. Dizem, até, quecada indivíduo (ou individua, segundo a reforma ortográfica pessoalda presidentA – olha uma pitada de humorismo ai) é humorista empotencial e cada qual tem seu segundo de glória ao inventargracinhas, ditos e rabiscos. Em verdade, são poucos os humoristascriativos e de talento incontestável. Eu, por exemplo, acho que souaspirante eterno de humorista por encarar a tudo e a todos sempre comótimo humor e, por vezes, até inconveniente no dizer isso ou aquiloem momento pouco oportuno. Também não exagero o princípio “valeperder o amigo, nunca a piada!”.
Tiveum bom amigo humorista e que era dos melhores daqueles idos, o JoséMartins de Araújo Júnior, que assinava “Don Rossé Cavaca”,autor do livro “Um Riso em Decúbito”. Quando de seu lançamento,no dia 11 de agosto de 1961, fui ao Rio cumprimentá-lo e adquirir aobra, recebendo no volume uma dedicatória que guardo com honra.Escreveu ele: “Para o Jeds, com um grande abraço de humorista parahumorista”. Eis ai o meu diploma de Humorista firmado por um grandemestre.
DonRossé Cavaca foi ator de teatro e televisão, jornalista com colunashumorísticas de abrangência universal, amante de futebol, com pousona redação da “Tribuna da Imprensa”, o grande jornal de CarlosLacerda. Puxando pela memória, registro que Cavaca era o“cara-de-pau”, alto, magro, engraçado, âncora do programa“Câmera Indiscreta” e também ator do grande espetáculo “OMambembe” e de outras peças de teatro e televisão.
Poraqui, eu adolescente de 15/16, anos de idade, resolvi criar umjornal-revista “O Torpedo”, noticioso e humorístico, paracircular no Colégio São José, onde cursava o Científico. Era umexemplar único feito à mão e com textos dedilhados na máquina“Remington” de meu pai. Circulação mensal. Colegas adoravam(claro que não aqueles – motivo de gozações) e alguns professoresvisados detestavam. A publicação circulava por muitas mãos edesaparecia, jamais tendo eu recuperado um exemplar sequer.
NoDistrito Federal, Cavaca havia criado uma seção na “Tribuna daImprensa” denominada “Jornalistas de Amanhã”, onde ele pinçavae divulgava publicações de estudantes. O meu “O Torpedo” foiparar nas mãos do Cavaca, que abriu sua coluna para divulga-lo e oexemplar que conseguira colocado à disposição dos interessadospara julgamento de uma vocação. Eu nem acreditava no que aconteciae senti-me muito importante pela consideração de um novo e tãodistinguido amigo
Osanos deram volta, e, em dia trágico, Don Rossé Cavaca, em dezembrode 1965, morreu ao cair de sua bicicleta no aterro do Flamengo. Ohumorista contara sua última piada, infelizmente.
Nuncamais vi qualquer exemplar de “O Torpedo” e o que dele ficouguardado foi a reprodução dos textos divulgados pelo Cavaca nacoluna “Jornalistas de Amanhã”. Eu ouvi dizer, bem mais tarde,que o Professor Flávio Maciel guardara alguns exemplares dojornalzinho. Flávio Maciel era professor-enciclopédia, sabia detudo, cobria falta de qualquer professor e em qualquer matéria, eraum mestre adiante de seu tempo e, por isso, apreciou e guardou aquelamaluquice de estudante metido a humorista.
Passadosmais de 60 anos, recebo telefonema do filho do Professor FlávioMaciel, Newton, dando conta de que estão com ele os exemplares d´"O”Torpedo", tão carinhosamente guardados pelo pai. Quefelicidade! Recebi convite do Newton para um encontro em sua casapara colocarmos em dia nossas reminiscências da juventude, docolégio, do velho Maciel, de nosso tempo que retroage – sim –quando o coração festeja o cuidado pela memória e amor pelacultura e educação, de um grande mestre, como Flávio Maciel, demuita saudade e que faz falta em nossa conturbada educação de hoje.
Paraencerrar, um dito de Cavaca. Notável!
“Puxa!A vida Eterna, como deve ser cansativa”.