• Doce Ondina

  • Continua após o anúncio
  • Continua após o anúncio
  • 24/06/2020 00:01

                – Professor, uma palavrinha. O senhor é amigo de meu marido, o Sylvio de Carvalho…

                – Põe amigo nisso, eu sou fã do grande e completo jornalista! E a senhora é a esposa dele, Dona Ondina.

                – Muito prazer!

                – Prazer em dobro. Eu sei que a senhora criou e dirige o Campe…

                – Sim.

                – E como é o designativo completo?

                – Centro de Atualização da Mulher Petropolitana. Pois, então, professor, eu quero convidá-lo para realizar uma palestra no Campe.

                – Com muito prazer, aliás, uma honra. Aceito e quando ocorrerá?

                – Na próxima terça-feira, está bem assim?

                – Posso… na terça-feira eu disponho de toda a tarde. E o tema? Qual o tema?

                – Fica ao seu critério. Então, terça-feira, a partir das 15 horas. Combinado?

    E tudo começou e durante alguns anos estive no Campe, pelo menos uma vez em cada mês, falando e falando para as senhoras sobre os mais variados temas. Ondina era toda atenciosa, fina, empática, sincera, “tomava conta das meninas” com muito carinho, exercendo uma liderança de simpatia e amor. Tempos mágicos.

    Para corresponder à primeira palestra eu preparei um tema – não recordo mais qual foi – e me dirigi para a Casa de Cláudio de Souza, nessa época chamada de “Silogeu Petropolitano”, rodeei a praça da Liberdade, andei por aqui e para ali não encontrando coragem suficiente para ministrar a palestra. Acovardado, estava quase sumindo dali, quando me fiz a pergunta: – Você é um homem ou um verme? Verme? Não! Criei coragem, atrasado, titubeante, fui recebido por Ondina e as “meninas” com indescritível carinho e incentivo. A partir dai estive sempre ao lado da Ondina em seu projeto, divertindo as senhoras que se tornaram grandes amigas e sob mútua admiração. Um dia qualquer, já corajoso e desprendido ouvi da Ondina:

                – Lembra, professor, o primeiro dia de suas palestras no Campe? O senhor rodeou a casa, cruzou toda a praça, andou pelas alamedas, parecendo assustado. Eu o vi e acompanhei da janela do “Silogeu” e me perguntei: será que ele desistiu? Mas criou coragem…

                – A senhora me viu assustado? Que vergonha passei…

                – Vergonha, não, professor, compromisso. O senhor demonstrou que todos nós temos nossos momentos de titubeio e é preciso superá-los. Assim funciona a vida…

    Assim a Ondina Mauricio Carvalho da Silva, âncora da cordialidade, da compreensão, do amor ao próximo, do incentivo aos indecisos. que acaba de nos deixar, indo ao encontro do amado esposo Sylvio, ele como ela, agregador, amigo leal, sem medos, de infinita coragem no enfrentar das diatribes da vida perigosa. O termo mais preciso que sempre a definiu: guerreira! Guerreira com letra maiúscula.

    Ondina fará muita falta – e não me venham com a sentença: – Ninguém é insubstituível! Como Ondina, quantos séculos passarão, para que surja alguém com a qualidade de amar a Humanidade, atributo maior do coração da guerreira?!

    Felizes nós, que a conhecemos, que com ela convivemos nas sendas da cultura; felizes todos aqueles que ouviram, por sua voz doce, bons conselhos, verdades absolutas, o carinho da amizade por amor ao próximo! Felizes os que conviveram com ela e Sylvio nos momentos alegres ou trágicos, sedimentadores de vidas tão corajosas, quanto desprendidas de maus pensamentos.

    Perde a cidade uma grande cidadã, infinitamente pronta para servir, ajudar, instruir, ser consciente e justa quando em jogo a dignidade humana. E, sincera, doce Ondina e barulhento Sylvio, o coração de Petrópolis sangra de uma saudade que vai se transformando em lembrança, doce lembrança de quem viveu pelo amor e pelo feliz viver porque hei de ouvir, para sempre, a estrepitosa gargalhada de Sylvio de Carvalho e a doce voz de Ondina colorindo de alegria e cultura a urbe petropolitana de muito amor.

    Últimas