Dividida, oposição na Venezuela tenta formar aliança para enfrentar a ditadura maduro
Os líderes da fragmentada oposição da Venezuela estão correndo atrás de eleitores e prometendo – mais uma vez – que derrotarão o presidente Nicolás Maduro nas urnas.
Maduro é o ditador venezuelano que controla o todo-poderoso Partido Socialista Unido da Venezuela, no poder há um quarto de século. O partido foi liderado por 15 anos por Hugo Chávez e está sob comando de Maduro há uma década, controlando com mão de ferro as riquezas petrolíferas do país, perseguindo opositores e controlando as eleições para dar uma fachada de democracia à ditadura instalada no país. O chavismo inclina o sistema eleitoral a seu favor e usa os benefícios do governo como incentivo para votar nele.
Apesar das quase nulas chances nas eleições de 2024, os líderes da oposição dizem que desistir seria pior. Então eles estão realizando uma primária em 22 de outubro para decidir quem enfrentará Maduro nas eleições presidenciais do ano que vem. Apesar dos esforços, eles têm recebido uma recepção nada calorosa de eleitores desanimados após serem instruídos durante anos a boicotar as eleições.
Os candidatos interessados podem entrar oficialmente na corrida desde terça-feira, 6, mas muitos aspectos básicos da eleição – como quem votará, como e onde – permanecem indeterminados. Ainda assim, cerca de 10 políticos se alinharam para tentar enfrentar Maduro e o Partido Socialista Unido da Venezuela.
“Todos nós venezuelanos que queremos viver melhor, que queremos viver em uma democracia, devemos fazer o que estiver ao nosso alcance”, disse Jesús María Casal, advogado constitucional que chefia o órgão que supervisiona as primárias da oposição.
A lista de aspirantes inclui Henrique Capriles, duas vezes candidato à presidência e ex-governador, e Maria Corina Machado, ex-deputada da Assembleia Nacional. Freddy Superlano, ex-candidato a governador, tornou-se a escolha de seu partido depois que Juan Guaidó, o ex-autoproclamado presidente interino da Venezuela, deixou o país no final de abril.
Crise
Os eleitores estão sendo sufocados por uma crise econômica sem fim que levou mais de 7 milhões de pessoas a fugirem da Venezuela e tornou a comida e outras necessidades básicas inacessíveis para quem permanece no país.
Desde que Hugo Chávez foi eleito presidente em 1998, dando início a um movimento que, segundo ele, “defendia a classe trabalhadora”, os venezuelanos participaram de 17 eleições, incluindo presidenciais, legislativas, governamentais e municipais.
As eleições foram marcadas pelo distribuição de benesses e alimentos, eletrodomésticos e outros bens como ferramentas políticas. Os candidatos pró-governo tiveram acesso preferencial à gasolina subsidiada e cobertura favorável na televisão estatal para o partido no poder.
O chavismo também usa os postos de controle vermelho – em homenagem à cor que o partido governante cooptou há mais de duas décadas. Os postos de controle próximos aos locais de votação são administrados por chavistas, quem fiscalizam os cartões emitidos pelo governo necessários para receber alimentos e outros tipos de assistência.
A falta de condições eleitorais justas levou líderes da oposição a encorajar boicotes nas últimas duas décadas. Mas a estratégia falhou e os vários partidos e facções da oposição trabalham há meses para chegar a acordos para a realização da primeira primária desde 2012.
Guaidó, que não votou nas eleições regionais de 2021, incentivou este ano os venezuelanos que vivem no exterior a enviar dinheiro a amigos para que possam pagar viagens aos cartórios eleitorais. “Sua família e amigos na Venezuela precisam de sua ajuda para participar das primárias”, explica um vídeo de Guaidó postado em sua conta no Twitter em março. “Apoie-os com as despesas de viagem.
O grupo de Casal pediu às autoridades eleitorais do país que atualizem os cadernos eleitorais e facilitem o processo de recenseamento eleitoral.
Discordâncias
Apesar das tentativas, os partidos da oposição, os candidatos interessados, os líderes oposicionistas de longa data e os organizadores das primárias ainda não chegaram a um acordo sobre o uso de urnas eletrônicas de propriedade do governo durante a disputa da primária, em outubro. Também não está determinado se os centros de votação serão instalados em escolas em todo o país.
As divergências entre a oposição se estendem até sobre a idade permitida para votar dos venezuelanos que vivem no exterior. A lei da Venezuela contempla o voto à distância, permitindo que os cidadãos votem nos consulados. Mas os eleitores interessados devem estar devidamente registrados com seu endereço no exterior e não podem estar naquele país ilegalmente ou buscando refúgio ou status de asilo.
O líder do chavismo, Diosdado Cabello, insistiu que a oposição não conseguirá realizar uma primária. Mas mesmo que consiga, a oposição também deve descobrir como lidar com uma vitória nas primárias de um candidato que as autoridades proibiram anteriormente de concorrer a um cargo. Superlano e Capriles estão sob tais proibições, que muitos consideram parte das táticas anti-dissidentes do governo.
Superlano foi candidato a governador de Barinas, onde Chávez nasceu, em 2021. Na ocasião, ele saiu vitorioso das urnas, mas o Tribunal Superior Eleitoral da Venezuela o desqualificou. Sua esposa, que foi escolhida como sua sucessora, também foi considerada inelegível para concorrer. Assim como seu substituto.
Guaidó, que também está banido das atividades eleitorais, mudou-se para Miami em abril, alegando crescentes ameaças à segurança dele e de sua família. Na semana passada, Capriles acusou duas vezes partidários do governismo de perturbar eventos de campanha, incluindo um na sexta-feira em que mulheres o empurraram e bateram várias vezes, um incidente capturado em um vídeo que Capriles postou no Twitter.
Capriles venceu a última primária presidencial da oposição e concorreu contra Chávez em outubro de 2012. Seis meses depois, ele enfrentou Maduro, que havia se tornado presidente interino da Venezuela quando Chávez morreu. “O que vai acontecer? Não sei o que vai acontecer”, disse Capriles a repórteres sobre as proibições. “O que eu acredito é que não posso me exonerar nem vou pedir permissão ao governo (para ver) se posso concorrer ou não.”