• Disciplina e crítica social permeiam ‘Jardim dos Desejos’

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  • 03/jun 08:30
    Por Luiz Zanin Oricchio – Especial para o Estadão / Estadão

    Sente-se um tom um tanto bressoniano em Jardim dos Desejos, drama do veterano Paul Schrader – roteirista de clássicos como Taxi Driver e Touro Indomável, diretor de ótimos filmes próprios como os recentes Fé Corrompida e O Contador de Cartas. Aliás, Jardim dos Desejos parece o fecho de uma trilogia dedicada a personagens de passado problemático.

    No filme, há uma pequena reflexão introdutória sobre a arte da jardinagem. O jardim pode disciplinar a aparente desordem da natureza ou deixá-la por conta própria. Parece que vamos assistir a algum tipo de reflexão zen, da qual nossa época parece tão carente. No entanto, essa pode ser uma falsa pista.

    Quem traz esses pensamentos, em voz off, é Narvel Roth (Joel Edgerton), mestre-jardineiro que trabalha no suntuoso Gracewood Garden, propriedade da ricaça Norma (Sigourney Weaver).

    Narvel comanda uma pequena e disciplinada equipe de manutenção dos jardins. A ordem começa a ser subvertida pela chegada da jovem sobrinha-neta de Norma, a desinibida Maya (Quintessa Swindell).

    As relações entre Narvel e Norma não são apenas profissionais. Por isso mesmo, entre outros motivos, a chegada de Maya será desestabilizante da aparente serenidade reinante no local.

    Narvel tem um passado problemático, que se desvela de supetão. Basta vê-lo tirar a camisa e ficar de torso nu para que se perceba do que se trata. Ainda mais porque estamos no sul dos Estados Unidos, Louisiana, onde a memória das tensões raciais permanece latente – e pode explodir a qualquer momento.

    Mal-estar histórico

    Schrader, em seus roteiros e filmes, expressa esse mal-estar latente na sociedade em que vive – e que serve de modelo para o mundo ocidental.

    Uma história de conquista que inclui escravidão e genocídio; um regime econômico excludente, travestido no clichê da “terra das oportunidades”; relação beligerante com o mundo e que se expressa, no campo interno, por uma mal disfarçada luta de todos contra todos.

    Tudo abaixo da linha d’água, devidamente oculto e reprimido. Cabe à arte trazer à tona esse incômodo permanente, o retorno do reprimido, como se diz em psicanálise.

    As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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