• Depressão pós-parto: uma realidade comum que pode ser amenizada com orientação especializada e muito diálogo

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  • 15/09/2019 11:36

    Para muitas mulheres, ter um filho é a realização de um sonho. Apesar das idealizações, a rotina com o novo integrante da família não é fácil. A adaptação entre mãe e bebê somada às noites em claro, às crises de cólicas, às mudanças hormonais e ao isolamento social podem transformar os primeiros meses após o nascimento em um pesadelo. 

    O cenário é comum e pode trazer consequências emocionais para a mulher, como tristeza, melancolia, solidão e baixa autoestima. Movidas pelas alegrias e tristezas da maternidade, um grupo de mães petropolitanas se uniram para dividir as experiências e tornar a rotina mais leve. 

    “A gente precisa abrir mão de muitas coisas quando se torna mãe. Precisamos aprender a lidar com mudanças hormonais, com mudanças no corpo e mudanças na vida. É tanta pressão quando a criança chega, somos cobradas o tempo todo, seja por pessoas de fora e até por nós mesma. Temos que do nada, aprender a lidar com tudo, a saber de tudo e se a gente não consegue é que vem a frustração. Somos privadas de sono, somos excluídas da sociedade que não tem olhos para nós. Parece que o mundo todo continua e você está ali parada, parece que para você acabou tudo”, relatou Iara Tavares, mãe do Bernardo, de dois anos e três meses e da Alice, de um mês, que faz parte do grupo Maternidade Nua e Crua.

    A psicóloga, Simone Vianna Alvez, explica que manifestar esse tipo de sensação não significa que a mãe não esteja feliz com a chegada de seu bebê. Essa bagunça emocional acontece devido a toda as mudanças pelas quais a mãe vem passando: nova rotina, forma física diferente, trazer uma criança ao mundo, expectativas sobre o futuro, por isso, a qualidade do vínculo com o bebê podem ser comprometidos e até distorcidos.

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    “A gestação é um evento social, um momento de realização para a maioria das mulheres, é uma transformação muito rica e ampla na vida delas também. Socialmente se espera que ela se sinta muito feliz e realizada, mas uma a cada quatro puérperas têm sintomas de depressão pós-parto. É importante que nesse momento, a família e as pessoas mais próximas fiquem atentas para que o quadro não se agrave, tornando de fato uma doença”, alerta a psicóloga, Simone Vianna Alves.

    “Embora a minha gestação não tenha sido planejada, eu esperava pela chegada da minha filha como uma criança que espera pelo papai Noel no Natal. Quando a Cecília chegou, que eu me vi operada, com um serzinho que dependida de mim para tudo, não dormia, só chorava, foi desesperador demais! Eu tinha ajuda da minha mãe e do meu marido, nem sei o que faria sem eles, mas todo dia no banho eu chorava e me perguntava porque eu não me sentia tão feliz quanto imaginei que me sentiria. É uma sensação de abandono, solidão, cansaço, culpa. Eu me culpava por não saber o porque ela chorava, me culpava por não estar radiante, me culpava porque todas as mães eram felizes e eu não era o tempo todo. Era muito difícil mesmo, principalmente por achar que só eu vivia isso”, contou Gabrielle Camilo, mamãe da pequena Cecília, de seis meses.

    No Brasil, a depressão pós-parto, que ocorre no período de seis a 18 meses após o nascimento do bebê, acomete mais de 25% das mães, a constatação é de um estudo realizado pela Fiocruz. São três tipos de transtorno psiquiátrico pós-parto: o baby blues, que acomete a maioria das mulheres nos dias seguintes ao parto, a depressão pós-parto, que pode se iniciar durante a gestação ou até mesmo a qualquer momento após o nascimento, durante o primeiro ano do bebê, e a psicose pós-parto, que pode ocorrer rapidamente, geralmente nos primeiros três meses do bebê. 

    “São três realidades psiquiátricas que tem graus diferentes e não necessariamente ocorrem juntas ou uma após a outra. O baby blues é uma realidade muito comum, pois com a mudança hormonal, da rotina, do sono, de prioridades, a pressão social, dentre outros fatores, a mãe pode experimentar alguns sentimentos negativos, além de mudanças de humor como choro fácil, impaciência, irritação, por exemplo, mas que tem duração de poucos dias. A depressão pós-parto pode ocorrer desde a gestação ou até o primeiro ano do bebê, já a psicose é um caso mais grave”, explicou Simone.

    O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM) da Associação Americana de Psiquiatria considera depressão pós-parto um subtipo de depressão maior. De acordo com o manual, para depressão pós-parto ser diagnosticada, os sinais e sintomas da depressão devem se desenvolver dentro de quatro semanas após o parto. Sinais de um episódio depressivo incluem, em parte: humor deprimido na maior parte do dia, quase todos os dias, redução de interesse e prazer nas atividades, mudança significativa no apetite ou mudança inesperada no peso, insônia ou hipersonia, agitação ou movimentos lentos, fadiga ou falta de energia, sentimentos de inutilidade, capacidade reduzida de pensar, concentrar-se ou tomar decisões e pensamentos recorrentes de morte.

    “Esses sentimentos, se não são devidamente tratados podem comprometer e distorcer a qualidade do vínculo com o bebê e até modificar as reações deles. A mãe, às vezes, não procura ajuda porque socialmente se sente culpada de não sentir os benefícios que a maternidade pode oferecer, como se essa falta de vitalidade fosse uma frescura e, em muitos casos, elas podem também sentir aversão, rejeição da nova realidade. É importante que a família e as pessoas mais próximas fiquem atentas”, disse ela.

    O Maternidade Nua e Crua, surgiu em junho desse ano e já reúne mais de 50 mães. No grupo, mães de primeira viagem, segunda ou terceira, mães de um, dois ou mais, todas se juntam para tornar o maternar mais leve, sem julgamento, apenas conselhos e um ombro amigo para os dias de caos. “Quando fizemos nosso primeiro encontro éramos em torno de 20, agora somos 55 mamães. Quando o grupo surgiu foi um alívio gigante saber que eu não era a única que sentia tudo aquilo, e conforme conversamos nós podemos ver que os medos são iguais, que o sentimento de culpa é o mesmo, e que quando a gente se apoia, quando a gente se une, tudo facilita”, disse Gabrielle.

    “Essa rede de apoio que o grupo oferece é de extrema importância para provar que não estamos sozinhas, que é tudo uma fase e que logo vai passar, que não existe certo ou errado, existe o nosso jeito. Ali a gente consegue conversar, desabafar, nos sentimos confortáveis para falar de tudo. É assim que muita vezes conseguimos apoio para seguir em frente, reconhecer que precisamos de ajuda profissional, que precisamos nos aceitar e aceitar a realidade materna, e é aqui com a maternidade real que a gente vê que não existe essa coisa maravilhosa o tempo todo e que está tudo bem também”, contou Iara.

    O grupo acolhe mamães de bebês de qualquer idade, e não está restrito às petropolitanas. O próximo encontro será no dia 13 de outubro, para saber mais é só seguir o instagram da @gabriellecamillo.

     

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