• Curta sobre 1ª árbitra brasileira de futebol ganha prêmio de ouro em Cannes

  • Continua após o anúncio
  • Continua após o anúncio
  • 22/06/2023 11:32
    Por Estadão

    Asaléa de Campos Fornero Medina, mais conhecida com Lea Campos, teve sua história eternizada no curta-metragem “Lea”. Hoje com 77 anos, ela foi a primeira árbitra feminina reconhecida oficialmente no futebol brasileiro, afiliando-se à Federação Mineira de Futebol (FMF) e à Confederação Brasileira de Desportos (CBD). Sua história, de superação de barreiras no esporte, rendeu à produção um leão de Ouro em Cannes Lions.

    O curta foi uma ação publicitária da Intimus, marca de absorventes, e conta um dos episódios de preconceito que Lea sofreu durante sua carreira. Formada em educação física, a profissional driblou as regras da CBD, que proibia às mulheres a prática esportiva profissional. Em 1967, conseguiu se tornar árbitra após completar curso na Escola de Árbitros do Departamento de Futebol Amador da FMF e enfrentar a resistência de João Havelange, então presidente da CBD, que depois viraria a CBF.

    À época, Lea sofria resistência para arbitrar os jogos por “menstruar”. Em entrevista ao portal UOL antes da Copa do Mundo do Catar, quando um trio de arbitragem foi inteiramente feminino pela primeira vez na história, Lea contou que foi questionada por dirigentes do futebol da época como ela trabalharia quando “estivesse menstruada”.

    Com direção de cena de Olivia Lang, o curta foi premiado na categoria “Entertainment Lions For Sport”. Ao Estadão, a diretora não esconde a felicidade com o resultado, recepção e sucesso do projeto. “É bem emocionante poder celebrar o reconhecimento de anos de muito trabalho e a minha reação é muito em prol das mulheres também”, afirma.

    Olivia participou diretamente da seleção de atores no curta, com reuniões, entrevistas e testes com cada um dos selecionados. Carol Melgaço, que interpreta a árbitra na produção, foi escolhida pela qualidade na atuação e pelas semelhanças físicas com Lea na juventude.

    “Tivemos um cuidado importante para que a Lea não fosse retratada como uma mulher que baixou a cabeça nem como uma mulher que pudesse ser vista como agressiva, porque a gente sabe que, no mundo machista, uma mulher que se impõe naturalmente é considerada uma mulher agressiva”, diz a diretora.

    Olivia não chegou a conversar diretamente com a ex-árbitra durante a produção do documentário, que é uma criação da agência Ogilvy Brasil em parceria com a produtora Moonheist. Mesmo assim, centrou-se em estudar a história da árbitra de futebol, para retratar fielmente seu legado.

    “É um recorte (do curta) muito pequeno da trajetória da Lea, que a marcou profundamente.” A conversa com João Havelange, que era contrário à sua participação na arbitragem, foi o cerne da produção. Havelange foi depois presidente da Fifa por 24 anos. Atualmente, o futebol mundial se vale de árbitras em todas as suas divisões e campeonatos.

    “A GENTE QUER SER SÓ MAIS UMA DE MUITAS”

    A diretora não esconde a alegria em ter sua produção premiada. “Sou uma privilegiada nesse meio” afirma, sem rodeios. “O audiovisual, publicidade e o cinema ainda são universos muito machistas.” Com experiência em produção de peças com temáticas do mundo feminino, é enfática ao defender a presença de diretoras em todas as áreas da cultura e do entretenimento. “A gente não quer ser a exceção. A gente só quer ser e poder falar sobre todos os temas, não só os temas do universo feminino.”

    “O filme emociona. Você sente arrepio, fica com gastura, agonia, ódio… uma mistura de sensações. No final, termina alegre por vê-la conquistar um lugar, mesmo com tanta dificuldade”, pensa Olivia. Apesar de tornar-se juíza de futebol em 1967, Lea só conseguiu apitar seu primeiro jogo em 1971. No mesmo ano, foi convidada pela Fifa para trabalhar em um torneio de futebol feminino da entidade, no México. Ao todo, trabalhou em 98 jogos.

    “Se hoje eu ainda preciso pisar em ovos, com medo de me posicionar, a gente percebe como a ação da Lea foi fundamental para a época.” Ainda que não esteja explícito, vale destacar como a árbitra teve, na década de 1970, influência para que mulheres pudessem participar do futebol, seja como atletas ou como juízes. No Brasileirão de 2023, por exemplo, Edina Alves é uma das principais profissionais escaladas pela CBF na competição.

    Últimas