• Crônica do Ataualpa: Um ciclo de tragédias

  • Continua após o anúncio
  • Continua após o anúncio
  • 20/02/2022 08:00
    Por Ataualpa A. P. Filho

    Procuramos corpos, procuramos explicações, procuramos entender as razões do ciclo de tragédias que se abate sobre uma bela cidade de “um país tropical abençoado por Deus e bonito por natureza”.

    15 de fevereiro de 2022 é mais uma data que vai ficar registrada na história de uma cidade que sofre com tragédias provocadas pelas chuvas. Em Petrópolis, centenas de vidas já foram perdidas em deslizamentos de terra. A tristeza de quem perde tudo de repente, ver o fruto do trabalho indo por água abaixo é traumatizante.

    Estamos em estado de choque com o que aconteceu na terça-feira passada (15/02). As tristes lembranças de janeiro de 2011 ainda estão vivas em nossa memória. Foram somadas às que temos de 1988. Hoje estamos aqui mais uma vez com o sentimento de vulnerabilidade que revela a nossa impotência diante dos fenômenos climáticos.

    Petrópolis é uma linda cidade turística com um clima fabuloso, mas teve um crescimento demográfico desordenado e sofre as consequências da falta de planejamento habitacional. Temos várias limitações geográficas. Por se tratar de uma região serrana, as construções habitacionais precisam de orientações técnicas tanto nas margens dos rios quanto nas encostas.

    O Município possui mais de 300 mil habitantes. Ocupa uma área de, aproximadamente, 795.798 km². Fica a 838m acima do nível do mar. Temos ainda algumas reservas de Mata Atlântica e uma densidade demográfica em torno de 384,1 hab/km². Uma média de 20% da população mora em área de risco. Pergunta-se: como realocar essa população em áreas mais segura?

    Carecemos de uma política de reassentamento não somente em Petrópolis, mas também em todo país. Quando as chuvas vêm, os problemas das gestões públicas ficam expostos tanto no meio urbano, quanto nas áreas rurais. Também fica evidente a falta de assistência da população mais carente. Por isso uma dor profunda bate no peito, porque sabemos que o ciclo vai se repetir, uma vez que os problemas continuam:

    – Quando e onde será a próxima tragédia?… Quais serão as próximas vítimas?…

    A cidade de Petrópolis não suportou os 259,8 milímetros de chuva que caiu em um período de quatro horas. A quantidade de chuva que se previa durante o mês de fevereiro caiu em um fim de tarde de verão com velocidade devastadora. O nível pluviométrico surpreendeu até quem trabalha previsões meteorológicas.

    O posicionamento geográfico do Município deixa-o exposto a um volume maior de chuvas. Mas não podemos tratar o problema como se fosse um caso isolado e pontual. Em questões ambientais, a relação entre causa e consequência é bem nítida. Vários fatores contribuem para que tragédias provocadas por fenômenos da natureza possam se repetir com mais frequências. Por isso é preciso um processo de conscientização mais amplo. Temos que pensar no equilíbrio do ecossistema. Cada ação de desmatamento contribuiu para o que estamos testemunhando agora. Até os que consideram a Terra plana sofrem as consequências do aquecimento global. Não há exclusão. A força da água não escolhe marca de carro ou de motocicleta para levar na correnteza. As garrafas plásticas, os sacos de lixo jogados nas margens dos rios descem como os corpos sem vida…

    Não podemos pensar somente na produção industrial, nos ganhos econômicos. A poluição atmosférica é fruto das ações humanas. É preciso estabelecer uma forma de desenvolvimento sustentável sem essa agressão absurda à natureza. Desde o papel de bala jogado no chão até o corte de árvores, passando pela ausência de uma política de saneamento básico, todas as ações nocivas, depredadoras contribuem para a degradação do meio ambiente. Portanto, todos nós somos responsáveis pela preservação do planeta.

    Agradecemos as ações solidárias, os gestos de carinho, a atenção de amigos que ligam sensibilizados com o nosso sofrimento. O acolhimento dos desabrigados e desalojados, as palavras de conforto diante da perda de entes queridos aliviam um pouco essa dor que não queremos mais sentir. Aqui não haverá carnaval…

    Últimas