• Corrigindo hábitos

  • 16/08/2018 11:18

    Nem poderia pensar na hipótese, todavia encontrei-me com o querido amigo Diógenes que por muitos anos prestou serviços de pintura a meus pais.

    Amigo sim, porquanto eu ainda muito jovem e o bom e competente profissional sempre comigo a conversar e eu a lhe acompanhar nos trabalhos de pintura externa de nossa casa que era conservada por decisão de minha mãe uma vez por ano, pela exemplar figura do Sr. Diógenes.

    Almoçava conosco, embora envergonhado, porém D. Regina sempre fazia questão que compartilhasse à mesa comigo e com ela, já que meu pai exercendo atividade profissional no Rio de Janeiro só o encontrava aos sábados, quase fazendo parte da família pelos longos anos que nos serviu, com capricho e sobretudo amizade.

    Diógenes, com quem me encontrei e o tempo é impiedoso, já prestes a completar noventa anos, porém firme e esguio, mas cabelos branquinhos tais como algodão.

    Logo que nos vimos conversamos e como não poderia deixar de ser, voltamos àquele passado tão marcante de nossas vidas, especialmente à casa onde residiam meus pais.

    O amigo, num repente, vira-se para mim dizendo: “quero lhe confessar, caso possa me ouvir, acerca de um difícil momento pelo qual estou passando e que preciso superá-lo”. Eu, por minha vez, curioso e na ânsia de poder ajudá-lo, indaguei: Diógenes, o que está acontecendo com o amigo, afinal? E ele rapidamente respondeu-me, porém com rubor na face, pude notar, afirmando ter adquirido a mania de só viver reclamando de tudo e de todos que o cercam, e completou: “a família, já percebi que está no “limite” para com minhas reclamações”.

    Compreendi a situação pela qual vinha atravessando aquela boa criatura. Todavia, não satisfeito continuou o seu desabafo: “no consultório médico reclamo por não ser atendido na hora marcada; quando a refeição não me satisfaz, reclamo junto à esposa; na rua, reclamo do trânsito e até das pessoas que me esbarram, sem falar quando o tempo se apresenta chuvoso, reclamo ainda mais porquanto não suporto o frio; quem sabe já não será a idade a pesar sobre minha cansada e desgastada cabeça?”.

    Diante do quadro que pude vivenciar, especialmente em razão do carinho que dispenso às crianças e aos idosos, até porque já me enquadro na última das condições, ainda assim procurei lhe dar alguns conselhos e não é que meu interlocutor os ouviu atentamente!

    Crente em Deus e pessoa religiosa, permitiu com atenção que lhe falasse: “Diógenes, durante o transcurso de nossas vidas concedidas que nos foram pelo Pai e você crê em Sua existência, nos foi dada a oportunidade de mudar nossos comportamentos, contudo a decisão só depende de nós próprios”.

    O homem olhou-me com gesto de carinho parecendo ter me ouvido, já que muitas das vezes nos comunicamos e entendemos as pessoas através de um simples olhar. E sua feição imediatamente se refazendo, disse-me: “pois bem, não sei se irei conseguir porém vou procurar me corrigir principalmente perante a família porquanto, por de trás de uma porta de minha casa, já ouvi o comentário de um filho a dizer que me tornei um “chato de galocha”. Foi aí que completei dizendo: “desrespeito!”. 

    Eu mais uma vez busquei o ensinamento do poeta ao me recordar do gesto impaciente e desrespeitoso do filho, todavia na certeza de que aquele bom amigo se esforçaria para deixar de ser uma pessoa desagradável, mas um pai amado pela família.


    “Dê carinho ao mais idoso,

    não o trate com desdém,

    pois você, jovem formoso

    vai ficar velho também”.

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