• Conheço mulheres assim

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  • 07/03/2020 09:20

    Conheço mulheres Maria Quitéria. Que invadem exércitos de homens e melhor que eles lutam suas batalhas. Como fez a jovem que lutou pela Independência da Bahia, a verdadeira Guerra da Independência brasileira. Vestida de homem, para vencer preconceitos, alistou-se e foi à luta. Depois, identificada como mulher, assim aceita porque assim se impôs, foi promovida. Recebeu do Imperador a Ordem do Cruzeiro, e foi reformada como Alferes.

    Conheço mulheres Santa Rosa. Que seguem guerreando lado a lado com os homens, mesmo quando grávidas, e quedam por curto tempo para o parto de um filho. E, como a guerrilheira da Coluna Prestes, breve retornam, cavalgando ligeiro, com o filho ao colo, à frente de seus muitos combates.

    Conheço Anitas Garibaldi. Capazes de renúncias pelo grande amor, capazes de bravuras por causas justas. Como a “Heroína de Dois Mundos”, capaz de, aprisionada na Batalha de Curitibanos, convencer o comandante inimigo a permitir que fosse ao campo procurar o que seria o cadáver morto do amado, para então, fugir cavalgando, e após atravessar rios a nado, ir ter com o seu Giuseppe.

    Conheço mulheres que, mesmo perseguidas, presas, discriminadas, ridicularizadas, não se afastam da sua missão de vida. Como Nise da Silveira, a grande médica que acolheu os “loucos”, seres mais desprezados. E os liberou de correntes, eletrochoques, lobotomias, e descobriu em suas almas a capacidade de expressão, de sonho e arte, encaminhando-os às veredas do equilíbrio e da sanidade.

    Conheço mulheres que recusam a opressão masculina, e abandonam homens que não as merecem. Como Chiquinha Gonzaga, genial artista autodidata, que se recusou a esconder-se debaixo de um pseudônimo masculino, como lhe foi sugerido e era comum à época. E que não só deixou obra genial, como ainda lutou pela abolição da escravatura.

    Conheço mulheres que, contra todas as expectativas, mesmo quase mortas, sobrevivem e se reerguem para lutar. Como Maria da Penha, que lutou décadas pela punição do ex-marido agressor, que a deixou paraplégica, e cuja persistência se tornou marco na constatação de duas realidades brasileiras cruéis: a violência doméstica contra a mulher e o feminicídio. Culminando na lei que leva seu nome.

    Conheço Carolinas de Jesus. Aquela mulher negra, que recusa render-se à miséria, e faz com as próprias mãos seu barraco na favela, de papelão, madeira e lata. Que declina casamentos para não ser submissa a homem algum. Faxineira, que cata papel nas ruas para alimentar os filhos. E que, enquanto luta pelo pão, escreve em cadernos achados no lixo “Quarto de Despejo”, o romance que a inscreveu como uma das mais importantes escritoras da literatura brasileira.

    Conheço Terezas de Benguela. A rainha negra que, por cerca de quarenta anos, comandou no século XVIII, o Quilombo do Piolho, no Mato Grosso. Acolhendo negros e índios fugidos da escravatura, essa líder guerreira estabeleceu uma espécie de parlamento negro, e comandou missões comerciais a povoados vizinhos.

    E conheço Nilmas de Araújo, Marianas Marra, Ineses Joaquinas, Princesas Isabéis, Tias Ciatas, Coras Coralinas, Adélias Prado, Tarsilas do Amaral, Zildas Arns, Zuzus Angel, Fernandas Montenegro, Ruths de Souza e Chardelis. Conheço mulheres assim. Que me fizeram melhor. Por conselho, exemplo ou repreensão. E que merecem, sim, uma flor, hoje. Mas merecem mesmo é canteiros de verdadeiros direitos e cachoeiras de definitiva igualdade.

    denilsoncdearaujo.blogspot.com

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