• Como funciona o voto de desconfiança no primeiro-ministro do Reino Unido

  • Continua após o anúncio
  • Continua após o anúncio
  • 06/06/2022 13:30
    Por Redação / Estadão

    O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, abalado pelo escândalo das festas em Downing Street durante os confinamentos da pandemia, enfrenta nesta segunda-feira, 6, um voto de desconfiança de sua própria legenda, o Partido Conservador, o que pode afastá-lo do poder ou garantir sua permanência no cargo, mais ou menos enfraquecido.

    Johnson precisa dos votos de 180 dos 359 parlamentares da sigla para permanecer no cargo. Em caso de derrota do primeiro-ministro, o partido terá que organizar nas próximas semanas uma eleição interna para designar um novo líder, que será automaticamente o novo primeiro-ministro do Reino Unido.

    O Partido Conservador tem um histórico implacável com seus líderes que deixaram de ter apelo eleitoral – incluindo Margaret Thatcher – e Johnson, que chegou ao poder de modo triunfal em 2019 quando a enfraquecida Theresa May se viu forçada a renunciar apesar de ter superado um voto de desconfiança, sabe bem disso.

    Para concretizar a votação eram necessários pedidos por carta de pelo menos 15% dos 359 deputados da maioria conservadora, ou seja 54, o que foi alcançado no domingo 5, anunciou nesta segunda-feira (6) Graham Brady, presidente do comitê que administra a bancada parlamentar conservadora.

    Os parlamentares não precisaram revelar sua identidade, embora alguns tenham optado por ir a público após pressão de seus eleitores ou na tentativa de encorajar outros a fazerem o mesmo. As cartas podiam ser depositadas pessoalmente no escritório de Brady, enviadas por outra pessoa ou enviadas por e-mail. Durante todo o processo, apenas Brady sabia quantas cartas haviam sido enviadas.

    A votação é simples e presencial. Os parlamentares colocam suas cédulas dobradas em uma urna, que deve estar em uma grande sala de reuniões no Palácio de Westminster. Se um deputado estiver fora de Westminster, pode nomear um colega para votar em seu lugar como procurador. Os parlamentares estão impedidos de tirar fotos dentro da sala, para preservar o sigilo.

    Para permanecer no cargo, um líder deve conquistar pelo menos 50% mais um voto de apoio do partido. Isso equivale a 180 votos para Johnson.

    Os votos devem, ser contados logo após o fim da votação e o resultado pode ser anunciado ainda nesta segunda-feira. Quando Theresa May enfrentou o voto de desconfiança de seu partido em 2018, deputados e jornalistas foram reunidos na mesma sala da votação e o resultado foi anunciado.

    Defesa

    Um porta-voz do primeiro-ministro afirmou que a votação é uma oportunidade de “colocar um ponto final e seguir adiante”. “Johnson agradece a oportunidade de expor seu caso aos parlamentares e vai recordá-los que, quando estamos unidos e concentrados nas causas que importam aos nossos eleitores, não há uma força política mais formidável” que o Partido Conservador.

    E como exemplo do trabalho do primeiro-ministro, sua assessoria de imprensa divulgou um longo comunicado sobre uma conversa telefônica nesta segunda-feira com o presidente ucraniano, Volodomir Zelensky, sobre a guerra com a Rússia.

    Johnson, que apenas recebeu uma multa por ter participado em uma festa por seu aniversário de 56 anos em 19 de junho de 2020 na sala do conselho de ministros, pediu perdão e disse que “não percebeu” que o breve encontro “poderia constituir uma infração das normas”.

    Ele assumiu “plena responsabilidade”, mas defendeu sua atuação e se negou a renunciar, alegando que tinha a responsabilidade de seguir adiante com “prioridades” como a guerra da Ucrânia e a crise pelo custo de vida, que impõe sacrifícios a muitos britânicos e afeta a popularidade do governo.

    O discurso, no entanto, não convenceu muitas pessoas nem dentro de seu partido, como John Penrose, seu “czar anticorrupção”, que renunciou ao cargo nesta segunda-feira por considerar “bastante claro que (Johnson) infringiu” o código de conduta oficial e também deveria renunciar.

    Impacto da decisão

    Se Johnson vencer, ele não poderá ser objeto de outra votação de confiança durante um ano. O premiê pode vencer por uma margem pequena de votos, ou seja, metade mais um dos votos, mas ele ficaria muito enfraquecido. “A história nos diz que este é o início do fim”, afirmou o líder da oposição trabalhista, Keir Starmer, à rádio LBC. “Se observarmos os exemplos anteriores de votos de desconfiança, mesmo quando os primeiros-ministros conservadores sobreviveram (…) o dano já está feito e normalmente caem de maneira razoavelmente rápida”, ressaltou, ao recordar os casos de Thatcher e May.

    Theresa May ganhou seu voto de desconfiança, mas foi forçada logo depois a anunciar um cronograma para sua saída, sob a ameaça de uma mudança de regra e nova votação. Na ocasião ela ganhou o apoio de pouco menos de dois terços de seus parlamentares.

    Se Johnson perder a votação, o partido escolherá um novo líder e, portanto, um novo primeiro-ministro. Constitucionalmente, o Reino Unido exige um primeiro-ministro no cargo o tempo todo, o que significa que Johnson deve continuar no poder até que um sucessor seja escolhido.

    Esse processo levou dois meses quando Johnson substituiu May. Se o premiê decidir deixar o cargo imediatamente, seria necessário um primeiro-ministro interino. Dominic Raab é vice-primeiro-ministro e parece ser a pessoa mais provável.

    A seleção de um novo líder envolve dois processos. Primeiro, os candidatos devem ganhar os votos dos colegas deputados. Em turnos consecutivos de votação, o candidato em último lugar é eliminado a cada vez, até que restem apenas dois. Esses dois nomes são apresentados aos 180 mil membros do Partido Conservador.

    Dessa forma, o Reino Unido pode mudar seu primeiro-ministro sem o incômodo de uma eleição geral. É relativamente comum. Depois que May renunciou entre as eleições, Johnson se despediu de outros conservadores para sucedê-la, assim como May fez depois que David Cameron se demitiu. O líder que pode comandar a maioria na Câmara dos Comuns é convidado pela rainha a formar um governo, mas eles acabam nessa posição. (Com agências internacionais).

    Últimas