CNJ afasta juiz acusado de agressão que deixou ex com lesão na coluna e edema no crânio
Por unanimidade, o Plenário do Conselho Nacional de Justiça afastou o juiz José Daniel Diniz Gonçalves, que atua na Vara de Fazenda Pública de Araçatuba, no interior de São Paulo, enquanto apura a conduta do magistrado. Ele é acusado de agressão à ex-mulher e está sob suspeita de ter se omitido no socorro a ela.
A defesa de Diniz Gonçalves afirma que ele foi alvo de agressões por parte da ex e que sofreu arranhões. Sua advogada, Daniele da Silva Galvão, sustenta que o juiz acompanhou a remoção da ex para o hospital e não a visitou em razão de vigorar medida protetiva contra ele.
O CNJ vai revisar um Procedimento Administrativo Disciplinar que resultou em pena de censura ao magistrado, considerada punição ‘leve’ pelo corregedor nacional de Justiça, ministro Luís Felipe Salomão.
Segundo o ministro, se confirmados os fatos, o juiz merecia sanção mais grave.
A decisão pelo afastamento do magistrado não estava prevista inicialmente no voto do relator. No entanto, no início do julgamento do caso, Salomão externou dúvida quanto à possibilidade do afastamento. Ele apontou que estava colocando na balança uma série de fatores.
De um lado, o relator destacou: a possibilidade de o magistrado fazer plantões e, eventualmente, se deparar com a análise de casos criminais; o fato de o juiz ser réu na esfera criminal; a gravidade do caso; a imagem do magistrado perante a comunidade.
De outro lado, Salomão lembrou que os fatos ‘não são contemporâneos’ e que o magistrado ‘parece ser laborioso’.
O corregedor considerou que as circunstâncias do caso são ‘graves’ e ‘comportam uma análise detida para avaliação da penalidade mais adequada, evitando não só a reiteração de novas condutas mas o comprometimento da integridade da imagem do Poder Judiciário como um todo’.
Durante o julgamento, realizado nesta terça, 5, o conselheiro João Paulo Schoucair lembrou que o CNJ afastou recentemente dois magistrados por situações similares – um juiz de São Paulo e um desembargador do Rio Grande do Sul.
Caso
O caso envolvendo o juiz José Daniel Diniz Gonçalves, da Comarca de Araçatuba, ocorreu em dezembro de 2021. À época, o magistrado e a ex eram casados havia 16 anos. Eles têm um filho adolescente.
O entrevero que levou às lesões da vítima ocorreu em meio a discussões e agressões verbais e físicas, inclusive presenciadas pela criança, então com onze anos de idade, narrou o Ministério Público.
De acordo com a denúncia, o crime ocorreu um dia após o casal decidir se separar. A peça narra que o juiz ‘torceu’ a mão da ex, ‘apertando seus braços e a chacoalhando’.
A mulher ‘tentou se desvencilhar e tomou um golpe na altura do peito e um forte empurrão, o que fez com que ela batesse as costas numa bancada de madeira e batendo a cabeça’.
À Polícia, o magistrado narrou que ‘quis se defender’ de lesões que teria sofrido da ex. Ele afirma que ela o golpeou com ‘socos’ e ficou com ‘arranhões’. Declarou que ‘achou que ia lesionar o braço onde tem uma fístula arterovenosa pela qual se submete a hemodiálise 3 vezes por semana’.
“Então, apoiei minha perna na minha esposa e a empurrei com a única intenção de conseguir evitar novas agressões”, alegou.
A perícia constatou lesões tanto no juiz como na ex-mulher.
Ele teve arranhões e escoriações de natureza leve, diz o laudo. A ex sofreu lesão na coluna, edema no crânio, equimoses na região peitoral esquerda e braço direito, hematoma intracraniano e fratura cominutiva de T12. Ela ficou hospitalizada por duas semanas e foi considerada incapaz de exercer suas funções habituais por mais de 30 dias.
Diniz Gonçalves é réu por lesão corporal grave.
Versões
Durante o julgamento no Conselho Nacional de Justiça nesta terça, 5,, Salomão leu trecho do depoimento da ex-mulher de Diniz Gonçalves à Justiça. O ministro classificou o relato da vítima como uma ‘narrativa forte’.
Trecho do depoimento da ex. “Bati a cabeça, ele virou as costas e saiu falando: ‘Você quer ir embora? Quem vai embora sou eu.’ Daniel, me ajuda, machucou. Ele falou: ‘Para, chega, já está com frescura’. Eu comecei a gritar de dor. Não sentia minhas pernas. Me sentei e pedi para ele ajudar. Ele falou: ‘Não sei o quê, eu vou arrumar minhas coisas e vou embora de casa’. Virou as costas e subiu. E eu fiquei uns cinco minutos chamando, dizendo que estava com dor e pedindo ajuda. Ai falei: ‘Se você não vai me ajudar vou ter que pedir socorro, traz o meu celular’. Eu comecei a gritar me ajuda pelo amor de Deus. Ele fez 3 malas, foi colocar no carro e não olhava pra mim. Aí chegou o Samu e ele não deu a menor atenção. Me socorreram rápido.”
Defesa
Em sustentação oral, a defesa do magistrado explicou que a punição de censura a ele aplicada pelo episódio resultou de um procedimento que tramitou na Corregedoria do Tribunal de Justiça de São Paulo. De acordo com a advogada Daniele da Silva Galvão, que defende o juiz, a punição seguiu o parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, sendo que o relator do Procedimento Administrativo Disciplinar teria defendido a improcedência do pedido por entender que ‘havia ataques e agressões mútuas’ e que os registros do Instituto Médico Legal apontaram ‘lesões a ambas as partes’ – as da ex-mulher seriam mais graves.
Daniele Galvão ainda rebateu a proposta de afastamento do magistrado, argumentando que não há registro anterior na ficha funcional do juiz sobre qualquer ‘ato que desabone sua conduta’, tampouco ‘registro de infração ético disciplinar que seja inerente à conduta do magistrado’.
A advogada destacou que os fatos ocorreram ‘em ambiente familiar, sem reiteração’ e que não houve oferecimento de denúncia, pelo Ministério Público, por suposto crime e omissão de socorro.
A tese da defesa é que ‘não houve comprovação’ de omissão de socorro e que tal discussão já ficou ‘superada’ no Tribunal de Justiça, com a indicação de que a ex-mulher teve ‘pronto atendimento’. Daniele Galvão sustentou que o juiz acompanhou a remoção da ex para o hospital e não a visitou em razão de vigorar medida protetiva contra ele.