• ‘Candidatos de opinião’ são maioria entre os mais votados na Câmara de SP

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  • 05/maio 09:00
    Por Zeca Ferreira / Estadão

    O tradicional perfil do vereador de bairro parece estar perdendo força na cidade de São Paulo. Dos dez vereadores mais votados para a Câmara Municipal em 2020, a maioria não possui uma base eleitoral concentrada em uma região específica da capital. Em vez disso, angariaram votos de várias partes da cidade graças ao engajamento em pautas diversas, alinhadas tanto à direita quanto à esquerda. É o que mostra levantamento do Laboratório de Eleições, Partidos e Política Comparada (LAPPCOM), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), feito a pedido do Estadão.

    Especialistas ouvidos pela reportagem destacaram o papel das redes sociais ao tentar explicar o bom desempenho dos chamados “candidatos de opinião”, ou aqueles que não possuem uma base eleitoral territorial definida. Eles também avaliaram que esse perfil de político pode ter uma vantagem sobre os candidatos tradicionais novamente nas eleições municipais deste ano, com postulantes evangélicos à Câmara Municipal despontando entre os potenciais eleitos.

    A pesquisa realizada pelo laboratório da UFRJ analisou apenas os parlamentares no exercício do mandato. Como o Estadão mostrou em fevereiro, a Câmara Municipal teve 13 baixas em relação à lista dos 55 vereadores eleitos em 2020. Disputas estaduais e federais, cargos na Prefeitura e no governo do Estado, além de uma cassação por motivo de racismo e um falecimento, mudaram a fotografia dos representantes da cidade no Palácio Anchieta, cedendo lugares a suplentes.

    VOTO DISPERSO

    Entre os dez vereadores mais votados há quatro anos, seis não contam com uma base eleitoral territorial consolidada e são considerados políticos de opinião. Em outras palavras, esses parlamentares foram eleitos não por representarem uma determinada região, mas, sim, por defenderem suas agendas políticas e ideológicas.

    A vereadora Silvia da Bancada Feminista (PSOL) é uma das que ilustram o perfil do candidato de opinião. Com adesão em áreas mais ricas, a “professora de História da rede municipal de ensino, mãe e ativista do movimento feminista” integra a lista dos dez candidatos mais votados da cidade nas eleições em 2020, quando obteve 46,2 mil votos.

    Também representa essa categoria de candidato, mas no outro lado do espectro político, o vereador Fernando Holiday (PL). Com foco em pautas alinhadas à direita, Holiday, segundo o estudo do LAPPCOM, possui uma votação considerada “dispersa”, em mais de uma região da cidade e com diferentes níveis de renda.

    O vereador Thammy Miranda (PSD), o nono candidato mais votado de São Paulo há quatro anos, também mantém essa característica de voto disperso. Sua maior concentração de votos foi de 2,7%, registrada na zona eleitoral da Brasilândia, seguida pela zona da Sé. Thammy, que atua principalmente na pauta de proteção à mulher, trocou o PL pelo PSD depois que o ex-presidente Jair Bolsonaro ingressou no Partido Liberal.

    Coordenadora do LAPPCOM, a professora Mayra Goulart disse ver, na disputa a uma vaga na Câmara Municipal de São Paulo, uma “vantagem considerável” dos candidatos de opinião sobre aqueles com base eleitoral em uma região específica, em razão do tamanho da cidade. “Se ele conseguir conquistar minorias em uma área geograficamente ampla, é bastante provável que seja eleito como um dos mais votados”, afirmou Mayra.

    Eleita em 2020 com 37,5 mil votos, a vereadora Luana Alves (PSOL) foi considerada um “perfil único” entre os candidatos analisados pela LAPPCOM. No que diz respeito ao desempenho eleitoral, a parlamentar registrou alguma concentração de votos (10%) no distrito de Rio Pequeno (26.º mais pobre) e também em Pinheiros (6.º mais rico). Luana se destacou como uma candidata de opinião, com seus votos dispersos pela cidade de São Paulo, mas que, ao contrário de outros perfis da categoria de opinião, conseguem alcançar um público mais pobre.

    TRADICIONAIS

    Os candidatos com forte concentração de votos em uma determinada área são chamados de “majoritários”. Representam a figura do político tradicional, que atua diretamente nos bairros, muitas vezes por meio de associações locais. Esse tipo de candidato geralmente tem influência considerável sobre essa região, o que indica que ele atrai nas urnas não apenas minorias desse território, mas também o eleitor médio, que não está vinculado a grupos específicos, como sindicatos ou o movimento negro, por exemplo.

    Atual presidente da Câmara Municipal de São Paulo, o vereador Milton Leite (União Brasil) é considerado um político de propensão majoritária, com uma base eleitoral expressiva em bairros da zona sul, especialmente nos arredores do Capão Redondo. Em seu sétimo mandato consecutivo na Casa, desde 1997, Leite foi eleito em 2020 com mais de 132 mil votos. Ele tem dito, porém, que não pretende concorrer a um oitavo mandato na Câmara em outubro.

    Diferentemente do perfil majoritário, o político de opinião costuma representar nichos, como um movimento social ou uma categoria trabalhista, por exemplo. Em uma cidade grande, é possível que um vereador esteja entre os mais votados nas urnas mesmo sem ter um perfil majoritário, por causa do grande número de eleitores e da influência das minorias. Em cidades pequenas, no entanto, o cenário é outro e é improvável que um político sem perfil majoritário seja eleito, já que as minorias não costumam ter força suficiente para garantir a eleição de alguém.

    REDES SOCIAIS

    Para a professora Mayra Goulart, as redes sociais desempenham papel crucial para os candidatos de opinião, uma vez que assumem um papel anteriormente restrito à mídia tradicional. “As redes sociais facilitam essa dinâmica e permitem um melhor estabelecimento dos nichos, além de possibilitar a produção de conteúdo de comunicação mais segmentado para nichos específicos”, observou a coordenadora do laboratório da UFRJ. Thammy Miranda, por exemplo, possui mais de três milhões de seguidores no Instagram.

    Professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), Paulo Niccoli Ramirez destacou que, na corrida por uma cadeira na Câmara Municipal, geralmente há dois tipos distintos de candidatos. “Tradicionalmente, nas eleições, esse padrão de políticos que se adequam às demandas regionais e conseguem se eleger não é algo novo. No entanto, uma novidade nos últimos anos tem sido o impacto das redes sociais, que tendem a produzir um voto mais difuso”, disse ele.

    Segundo Ramirez, os políticos que possuem alguma ligação com as denominações evangélicas têm se destacado nesse contexto, pois conseguem mobilizar o apoio de uma base mais ampla. Da mesma forma, os chamados políticos outsiders também têm conseguindo tirar proveito das redes sociais para viabilizar suas candidaturas. “A juventude, principalmente, vota muito nesses políticos. Temos o caso do Kim Kataguiri (União Brasil-SP), que conseguiu ser eleito deputado federal”, disse o professor.

    ‘TEMÁTICOS’

    Evangélica, a vereadora Rute Costa (PL) pode ser classificada como uma candidata de opinião, considerando o comportamento da distribuição de sua votação em 2020. A zona eleitoral de Pinheiros foi onde ela recebeu a maior parte dos votos, ou 7,28% do total. Rute demonstra relevância tanto na zona oeste quanto no centro de São Paulo, especialmente em bairros identificados socioeconomicamente como “regiões de renda acima da mediana”.

    Ao mesmo tempo, a vereadora do PL registra um bom diálogo com algumas localidades mais pobres, o que pode ser atribuído, em parte, ao fato de ser evangélica. De acordo com informações de seu gabinete, Rute é filha de um casal que veio do Ceará para São Paulo e se tornou líder da Assembleia de Deus no Brasil. A vereadora é do Conjunto de Adolescentes da Assembleia de Deus Ministério do Belém (Creio) e, em 2016, ingressou na política com o apoio de sua igreja.

    Com uma atuação em defesa “do meio ambiente e de todas as formas de vida”, o vereador Roberto Trípoli (PV), de acordo com o estudo do laboratório da UFRJ, não apresenta altas taxas de concentração de votos e, portanto, é outro que se enquadra como candidato de opinião. Conhecido como um defensor dos animais, Tripoli tem apoio em áreas consideradas “de baixo perfil socioeconômico” da zona leste de São Paulo, apontou o estudo da LAPPCOM. Em 2020, foi eleito com 46,2 mil votos.

    O professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) Claudio Couto afirmou que, embora os candidatos “temáticos” dominem entre os dez mais votados, essa tendência pode não refletir na distribuição geral dos votos. “Muitos vereadores com atuação regionalizada podem não angariar uma grande quantidade de votos, mas, ainda assim, conseguir o suficiente para garantir uma cadeira na Câmara Municipal”, disse.

    Conforme Couto, as redes sociais, entretanto, desempenham um papel duplo na campanha eleitoral. Elas permitem que os candidatos temáticos alcancem um grande número de pessoas e também facilitam a comunicação em nível regional. Por exemplo, a criação de grupos de WhatsApp específicos para determinados bairros pode ser uma ferramenta poderosa para garantir adesão e votos dentro dessas comunidades, avaliou o professor da FGV.

    VOTO CONCENTRADO

    Três dos vereadores que estão entre os dez mais votados na disputa de 2020 foram classificados pelo levantamento como detentores de “voto concentrado”. Essa categoria, diferentemente do perfil majoritário, não exerce dominância na região em que foi registrada essa concentração de votos. É o caso de André Santos, Sansão Pereira e Atílio Francisco, todos filiados ao Republicanos.

    No caso de Sansão Pereira, por exemplo, seu desempenho eleitoral mostra certas concentrações em regiões como Itaim Paulista (14.º mais pobre), Cidade Tiradentes (39.º mais pobre) e São Mateus (34.º mais pobre). A performance do parlamentar do Republicanos, no entanto, não é suficiente para o vereador alcançar a predominância necessária para ser classificado como um político majoritário.

    As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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