• Campos Neto, Lula e a desinteligência do PT

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  • 18/02/2023 08:00
    Por Gastão Reis

    Tenho acompanhado as diatribes do sr. Lula contra Campos Neto, atual presidente do Banco Central, cujo mandato vai até o final de 2024. É sintomática que a origem da crítica venha de um político de esquerda, do PT. Era esperado, dada a dificuldade de a esquerda entender que a autonomia do Banco Central, um estatuto adotado em toda Europa Ocidental, EUA, Canadá e demais países de língua inglesa, é uma arma eficaz para evitar que o populismo tome conta da moeda nacional, que leva sempre a muita inflação. O Brasil conviveu com o drama até o Plano Real, mas países da América Latina, continuam a coabitar com inflação aguda, como a Venezuela e a Argentina .

    Na recente entrevista que Campos Neto deu no programa Roda Viva, ele foi taxativo ao negar que seria a favor de mudanças na meta de inflação. E deu uma explicação competente na linha de evitar que o tiro saísse pela culatra,  acertando em cheio os desinformados Lula e a turma do PT. Elevar a meta de inflação seria o sinal verde para mais inflação no futuro e o mercado exigir taxas de juros mais elevadas para quem toma dinheiro emprestado. Exatamente o oposto do que Lula e o PT desejam!

    Ainda no início da entrevista, Campos Neto deixou claro que “o ambiente colaborativo é o melhor ambiente para a sociedade, não só para o Banco Central”. Sem dúvida, uma declaração de boa-fé. Mas ele sabe que do outro lado está a turma da luta de classe como motor (enguiçado, claro!) da História.

    E deve se lembrar ainda da reunião de seu avô com o então presidente Costa e Silva em que Roberto Campos buscava convencê-lo da importância da autonomia do Banco Central para o País. E que recebeu do presidente uma resposta digna de Lula: “O guardião da moeda sou eu!” A partir desse episódio, Roberto Campos percebeu que o governo ia andar em águas perigosas (inflacionárias) e se demitiu como ministro. Resposta que seu avô não engoliu.

     A diferença do que houve entre Costa e Silva e Roberto Campos é que este se sentiu impotente diante daquele argumento em que o trabuco fala mais alto. Já a situação atual de Campos Neto é bastante confortável para poder resistir ao encanto da sereia inflacionária que parece enfeitiçar Lula. Declarações dos presidentes da câmara federal, Arthur Lira, e do senado, Rodrigo Pacheco, foram claras de que não iriam concordar com mudanças no status do Banco Central, que teriam que passar por votações em ambas as casas do congresso.

    Por outro lado, Campos Neto foi bastante civilizado ao afirmar que “Eu estou disposto a conversar quantas vezes for necessário. Mas é importante explicar que o BC só controla 24% dos juros. Os outros 76% refletem a curva de juros, que é quem empresta para o governo.” A dificuldade vai ser ter que lidar com um oponente em que o analfabetismo funcional em economia é evidente. Basta acompanhar outras declarações de Lula entre elas o teto de gastos. Lula namora a ideia de um pouco de inflaçãopara ajudar o país crescer.

    Acreditamos nisso, inclusive os militares, por mais de uma geração, período em que Lula viveu e acompanhou de perto, sentido as consequências na pele sem aprender nada. Houve um período de crescimento de 1967 até 1975, que começou a derreter com os choques do petróleo de 1973 em diante. Os militares resolveram dobrar a aposta e endividar o país tomando empréstimos no exterior a taxas de juros razoáveis, seguido por uma elevação significativa pouco depois. Conclusão: entregaram o poder aos civis, em 1985, com inflação elevada e uma dívida externa nas alturas, tendo que pagar juros exponenciais.    

    O lado assustador do atual episódio é que Lula parece ter uma memória em branco desse período. O Brasil pagou um preço absurdo de 1985 em diante em que resolvemos combater a inflação com tabelamento de preços no governo Sarney, coisa que nunca funcionou. E os grandes perdedores foram os pobres.

    Outros pontos da entrevista de Campos Neto são relevantes. Ele comenta que Paulo Guedes, como ministro da Economia, ligou para ele diversas vezes questionando a política de juros. E que respondeu sempre de modo técnico e que pediria demissão se não fosse acatado. E que, durante o governo Bolsonaro, não houve qualquer tipo de interferência. Bom lembrar que era Paulo Guedes foi quem conseguiu a proeza de jogar a taxa de juros a 2% ao ano, algo jamais visto no Brasil, tido como impossível, até que a Covid-29 se instalou e não houve como manter a SELIC nesse recorde de baixa histórico.

    Quanto a ir ao congresso ou ir a qualquer outra TV, ele se diz disposto a esclarecer a opinião pública à exaustão na defesa da atual política de juros do Banco Central. Não chegou a mencionar a questão da política fiscal, que vem trabalhando na direção contrária à expansão dos gastos. Cronicamente, os governos brasileiros têm crise de urticária quando se fala em cortar gastos.

    O PT foi responsável por elevar em muito os salários da burocracia a ponto de pagar em média o dobro de quem faz a mesmíssima coisa no setor privado. Difícil acreditar que vai mudar. Mas Campos Neto disse que aguarda o envio pelo Ministério da Fazenda do novo arcabouço fiscal e ressalta a importância de novas reformas estruturais. Em outras palavras, quer saber se a política fiscal vai colaborar com a política monetária na direção correta.

    Citou ainda o exemplo a não ser seguido da Turquia quando se fala em combater a inflação. Membros do PT conseguem puxar o exemplo da Turquia que, a despeito de uma inflação de 60% ao ano, mantém a taxa básica de juros (negativa) em 9%. Trata-se de uma explosão inflacionária programada, maior ainda se tal política de juros for mantida.  Por fim, garantiu que não tem planos políticos para o futuro, preferindo voltar à iniciativa privada.

    De fato, lidar com a desinteligência em matéria de economia é sempre um exercício penoso, mas necessário para evitar novas burradas tantas vezes cometidas no passado do Patropi. E, como sempre, quem paga a conta é o povo. É a desinteligência do PT a pleno vapor.

    Nota: Vídeo meu sobre o governo Temer, ainda atual: “E a mentira continua

    https://www.youtube.com/watch?v=7lxnHXFBrIE

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