Camila Pitanga: ‘Uma separação pode ser feita com muito amor’
De saída da Globo após 25 anos, Camila Pitanga, 44, deixa a antiga casa, e parte para uma nova etapa em sua carreira, iniciando parceria com a HBO Max. “Uma separação pode ser feita com muito amor, muito cuidado, respeito, gratidão, para se ganhar um novo contorno de aliança, é nisso que estou apostando”, diz sobre sua saída da emissora carioca. Em conversa por telefone com o Estadão, a atriz revelou seus planos para essa nova empreitada, falou sobre trabalhar com o pai, o ator Antonio Pitanga, e sobre trabalhos recentes, como a nova temporada de Aruanas, que estreia dia 25, no Globoplay, e o filme Malês, dirigido por seu pai. De contrato assinado com a nova casa, Camila embarca nesta quinta, 18, para Nova York, onde participará, no dia 22, do Emmy Internacional, como convidada da HBO.
Como será essa sua nova etapa profissional?
Olha, tem aí um luto de 25 anos, tempo em que estive totalmente conectada à Globo, ao mesmo tempo, o que está se inaugurando não me impede de estar em flerte, em namoro, não só com a Globo, como qualquer outro player. Me tornei agora talento da HBO e também cocriadora e eles estão apostando que eu possa exercer esses postos.
Como será o trabalho?
A princípio será um contrato de três anos. Essa parceria reza que eu tenho, digamos, um cardápio de projetos vindos da HBO e que a gente está ainda alinhando. Ao longo desse período eu me torno talento HBO, para trabalhar atuando. Mas tenho também o desenvolvimento de três projetos que eu estou levando para eles. Estou muito empolgada.
O que representa essa viagem a Nova York agora?
Vai ser bem especial, porque será a oportunidade para eu estar presencialmente com essa equipe da HBO. Ao longo desses últimos quatro meses participei de várias reuniões, mas sempre online, e nada melhor do que olho no olho. Então, além de estar na noite de gala do Emmy Internacional, haverá alguns encontros para falarmos de projetos de ambas as partes. O meu coração está agora totalmente na HBO, porque entendo que eles estão me vendo como cocriadora, a prioridade é deles, é fato.
Como será essa função de produtora executiva?
Em português, a produtora executiva é a pessoa que executa o projeto no dia a dia, lida com orçamento, mas em inglês é o que faz a Reese Whiterspoon ou a Nicole Kidman, por exemplo. São pessoas que dialogam criativamente, seja oferecendo projetos, fazendo a costura com técnicos envolvidos ou ainda acompanhando o desenvolvimento do roteiro. É o trabalho de criação. Então, tenho projetos que eu vou apresentar para a HBO e outros que eles vão apresentar para mim.
Agora, há ajustes estratégicos a serem feitos, como com qual público a gente quer falar primeiro, que faixa etária, que tipo de projeto, se vamos fazer um drama biográfico ou uma dramédia. Estou te adiantando alguns exemplos que estão debaixo do meu braço, mas a gente ainda vai aprovar projetos que vão ser desenvolvidos ao longo de três anos.
Você já pensava em partir para o streaming?
Eu acho que de alguma maneira já estava trabalhando nesse sentido. Os processos que tenho gestado tanto de teatro quanto de cinema, estou falando de Pitanga (documentário que ela dirigiu junto com Beto Brant sobre seu pai) e de meus últimos espetáculos, em todos trabalho na parte criativa, sou produtora no sentido da viabilização de projetos, mas eu também sou criadora no sentido de estar articulando com direção, elenco. E mesmo na Globo, em muitos projetos, havia o diálogo direto com roteiristas, com diretores. Já estava nesse lugar de alguém que pensa o que faz e não que faz o que simplesmente lhe apresentam. Naturalmente, eu venho caminhando para isso.
Como estará sua personagem em Aruanas?
Na primeira temporada, a Olga era uma esfinge, aparecia de maneira muito pontual e costurando os movimentos de perturbação das aruanas. Agora, a gente vai descobrir a perturbação da Olga, o que a move e qual é seu calcanhar de aquiles. Mas ela, certamente, vai continuar no pé das ativistas, o que terá um final de que eu gosto muito. A personagem tem uma riqueza muito maior.
Que tema estará presente em Aruanas dessa vez?
A gente está discutindo poluição do ar, das águas, vendo como a ingerência externa pode estar dentro de uma engrenagem política institucional. Tudo o que pode levar a uma situação desastrosa de poluição e mortes em grandes cidades do Brasil. Aruanas está aí discutindo um tema absolutamente da atualidade, mostrando não só o ponto de vista das ativistas, mas também essa engenharia política, que muitas vezes conta com capital externo.
Como tem sido o trabalho com seu pai, em Malês?
Nós já rodamos a primeira etapa, que foi em Maricá, e, após uma pausa de pré-produção, vamos rodar a sequência em Cachoeira e em Salvador. Trata-se de um filme de confronto, embora se passe em outro século, a gente está falando da luta antirracista, que é o enfrentamento de hoje. Esse projeto está com meu pai há uns 20 anos e agora, o danado, com 82 anos, está realizando. É muito bonito também ter um elenco praticamente esculpido para esse projeto. Estou comungando dessa realização dele, desse sonho que agora é real, concreto. Orgulho imenso de fazer parte dele.
Malês traz uma releitura da época da escravidão?
O elenco é praticamente 80%, 90% negro. E o filme mostra a comunhão de pessoas, no que no ambiente de tamanha indigência ainda pode haver resistência. É muito simbólico nos tempos de hoje, quando tudo parece que está totalmente contra, a gente não desiste de lutar pelo que acredita. É um filme que aposta na questão da luta, do que tem de união familiar, de pessoas que organizam suas vidas. Ele retrata tipos de organização, seja de escravo que consegue comprar alforria de outros escravos, seja de família que estabelece uma vez alforriada e a contradição de se acomodar numa situação de estabilidade ou enfrentamento.
Como analisa a situação atual da cultura?
Está muito complicado, é trágico o momento que estamos vivendo. Vou parafrasear meu colega Wagner Moura, que falou que a eleição de 2018 foi muito pedagógica. Estamos falando de um projeto de destruição do País. O povo brasileiro quer se ver retratado. Estou confiante de que nas próximas eleições a gente possa fazer disso uma grande lição para sairmos do terreno do ódio, da destruição, e seguir num caminho totalmente forjado no amor.
Você ainda participou de um especial sobre novelas, como será essa produção?
É um programa que se chama Novela 70, comemorando os 70 anos do gênero. Eu participei do quadro Heroínas junto com Nívea Maria, Taís Araújo e Giovanna Antonelli para falarmos desse tipo de personagem e como ele era em cada época, a trajetória das mocinhas, das heroínas. Estávamos em um estúdio despido de cenário. Primeiro, fizemos um bate-papo informalmente lembrando quem a gente admirava e projetos importantes, que foram históricos na Rede Globo. Mas depois, eles prepararam um vídeo, feito para cada atriz, falando um pouco da trajetória de cada uma. Me acabei de chorar. Foi uma costura relembrando a Rose de Cama de Gato, Isabel de Lado a Lado, Tereza de Velho Chico. Foi lindo, um carinho muito grande.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.