• Bolsonaro admite ‘conversa’, mas nega ligação com major que tramou golpe

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  • 17/05/2023 15:33
    Por Pepita Ortega / Estadão

    O ex-presidente Jair Bolsonaro admitiu à Polícia Federal que conversava com o major da reserva do Exército Ailton Barros Gonçalves – militar reformado que está no centro de apurações sobre ‘tratativas para a execução de um golpe de Estado’. Em depoimento nesta terça, 16, Bolsonaro disse que mantinha conversas ‘esporádicas’ com Ailton, preso na Operação Venire – investigação sobre fraude no cartão de vacinação do ex-presidente. Ele foi confrontado com mensagens enviadas pelo major ao contato ‘PR 01’.

    Os diálogos colocaram Ailton na mira do inquérito dos atos golpistas de 8 de janeiro, podendo implicar ainda mais Bolsonaro nessa apuração, na qual o ex-presidente é investigado por suposta incitação ao levante radical.

    Como mostrou o Estadão, as mensagens de Ailton foram obtidas pela Polícia Federal a partir da quebra de sigilo do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, tenente-coronel Mauro Cid. Ele é implicado em diferentes investigações no Supremo: já foi alvo do inquérito sobre atos antidemocráticos, passou a ser investigado no das milícias digitais e é ponto central de apuração sobre pagamentos envolvendo a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro. O aliado de primeira hora do ex-presidente da República foi preso no bojo do inquérito sobre supostas fraudes na carteira de vacinação de Bolsonaro.

    Em uma das mensagens usadas pela PF para questionar Bolsonaro, o major cita a mobilização de grupos que, segundo ele, ‘organizaram’ os atos antidemocráticos de 7 setembro de 2021. Em seguida, o bolsonarista mencionou a intenção de tais grupos em ‘acampar em Brasília’, em 31 março de 2022 – data em que aliados do ex-presidente comemoram o golpe militar de 1964 – ‘até os 11 ministros do STF saírem de suas cadeiras’.

    Ao ‘PR 01’, Ailton diz que é possível operar nos grupos ‘para as pautas serem de seu interesse’, sugerindo algumas propostas: “pau no Corno do Xandão sempre”, “questão das urnas eletrônicas” e “impeachment do Corno do Xandão”.

    Ainda nos diálogos recuperados pela PF, o major afirma: “Coloco nas nossas pautas. Se quiser dou uma esticada aí acerto estas pautas e libero…”. As mensagens foram posteriormente apagadas por Ailton, após ele dizer que ‘pegou orientação com Cidinho’ – o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.

    O ex-presidente negou à PF ter orientado ‘qualquer ato de insurreição ou subversão contra o Estado de Direito’. Sobre a menção de Ailton a ‘orientações’ de Mauro Cid, Bolsonaro disse não conhecê-las e alegou ‘duvidar’ que seu ex-assessor teria ‘dado reforço para as referidas pautas’.

    A Polícia Federal já identificou, em outras investigações, mensagens golpistas enviadas por outros apoiadores de Bolsonaro a seu ajudante de ordens, como as do blogueiro bolsonarista Allan dos Santos dizendo que ‘As Forças Armadas precisavam entrar urgentemente’.

    Antes de ser confrontado pela Polícia Federal com as mensagens interceptadas no celular de Mauro Cid, Bolsonaro foi questionado pelos investigadores se, por meio do ex-assessor, Ailton teria lhe procurado em busca de ‘uma orientação para influenciar manifestantes a atacarem ministros do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral’. O ex-chefe do Executivo alegou que ‘nunca chegou a seu conhecimento’ solicitações de Ailton Barros em tal sentido.

    Em seguida, a PF apresentou uma série de mensagens enviadas por Ailton a Cid. Bolsonaro reafirmou que não teve conhecimento sobre as pautas antidemocráticas de Ailton. Em seguida, admitiu as conversas esporádicas com o major, mas negou manter ‘relacionamento pessoal’ com o militar reformado. Segundo Bolsonaro relatou aos investigadores, as aproximações de Ailton ‘se davam principalmente em mementos de eleitorais’.

    Ao requerer as diligências da Operação Venire, cumpridas no início do mês, a Polícia Federal classificou Ailton como ‘um dos propagadores da ideologia professada’ pelas milícias digitais sob investigação no STF.

    O relator viu elemento de ‘união’ na atuação do grupo, ‘seja nas redes sociais, seja na realização de inserções de dados falsos de vacinação contra a covid-19, ou no planejamento de um golpe de Estado’: a atuação no sentido de ‘proteger e garantir a permanência no poder das pessoas que representam a ideologia professada’, no caso, Bolsonaro.

    Na mesma linha, Alexandre de Moraes destacou como a ‘milícia digital reverberou e amplificou a ideia de que as eleições foram fraudadas, estimulando aos seus seguidores “resistirem” na frente de quarteis e instalações das Forças Armadas, no intuito de criar o ambiente propício para uma intervenção federal comandada pelas forças militares, sob o pretexto de aturarem como um Poder Moderador, com base em uma interpretação peculiar do art. 142 da Constituição Federal’.

    “Os arquivos de áudio e capturas de tela de mensagens trocadas no aplicativo WhatsApp evidenciaram a arquitetura do plano criminoso pelo grupo investigado. Apesar de não terem obtido êxito na tentativa de golpe de Estado, sua atuação, possivelmente, foi um dos elementos que contribuíram para os atos criminosos ocorridos no dia 08 de janeiro de 2023, fato que demonstra a necessidade da pertinente autorização judicial para compartilhamento dos elementos informativos ora identificados com os autos do Inquérito 4923/DF”, ressaltou o ministro ao usar as informações para abastecer o inquérito sobre os atos de 8 de janeiro.

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