Bolsa fecha em baixa de 1,02% após duas sessões em recuperação
O Federal Reserve foi o protagonista do dia – a instituição e o presidente, Jerome Powell – e os desdobramentos foram em mão dupla. A principio, as ações, aqui e em Nova York, avançaram com o inesperado corte de 0,50 ponto porcentual na taxa de juros dos EUA, em decisão extraordinária tomada por unanimidade pelo Fed, fora do cronograma de reuniões. Depois, com a entrevista de Powell, as ações passaram a cair, em meio à percepção de que o banco central trata com gravidade a evolução do coronavírus sobre o nível de atividade – o que contribui para alimentar revisões para baixo nas projeções de crescimento global e dos resultados das empresas.
Apesar do mergulho, que interrompeu duas sessões de recuperação (na sexta e na segunda), o principal índice da B3 teve desempenho melhor do que o observado em Nova York, onde as perdas ficaram bem perto de 3% nesta terça-feira, na sequência de forte avanço dos três índices de referência na sessão anterior, quando o Dow Jones subiu 5%. Por aqui, o Ibovespa fechou a sessão de hoje em baixa de 1,02%, a 105.537,14 pontos, um desempenho amortecido pela perspectiva de que o Copom, na esteira do corte extraordinário do Fed, venha a reduzir a Selic a 4% na reunião dos dias 17 e 18 de março, quando o BC americano também tem encontro marcado.
A montanha-russa fez com que o Ibovespa oscilasse de máxima a 108.803,58 pontos no meio do dia, quando se soube da decisão do Fed, à mínima de 104.404,82 pontos, em queda de 2% por volta de 16h22, depois de a T-note de 10 anos cair pela primeira vez abaixo de 1%, refletindo a situação excepcional e a dimensão da aversão a risco. Assim, entre a mínima e a máxima do dia, a variação chegou a 4,4 mil pontos. O giro financeiro totalizou R$ 34,4 bilhões e, no ano, o índice acumula agora perda de 8,74%.
Com a perspectiva de juros mais baixos também por aqui, algumas ações, especialmente as de varejo, conseguiram se descolar do mau humor global para fechar o dia em terreno positivo. Na ponta do Ibovespa, B2W subiu 4,99%, Qualicorp, 4,65%, e Hypera 2,62%. Assim como observado nos EUA, a curva de juros se ajustou para baixo no Brasil mais uma vez, especialmente a ponta curta, com o dólar à vista negociado a R$ 4,5117, em alta de 0,55% no fechamento da sessão.
Para André Perfeito, economista-chefe da Necton, o Fed errou ao tentar acalmar os mercados com mais liquidez. “Taxa de juros não é Naldecon, não é isso que vai gerar mais produção no momento”, diz Perfeito, acrescentando que seria natural, na conjuntura, que houvesse queda seguida de recuperação gradual nos preços dos ativos. “A resposta adequada seria fiscal, não monetária – o Japão já indicou que vai enfrentar a situação pelo lado fiscal. Pela política monetária, vai gerar mais inflação nos preços de ativos, sem efeito (sobre a economia)”, acrescenta.
Em coletiva, o presidente do Fed, Jerome Powell, disse que os efeitos do coronavírus na economia estão em fase muito inicial, e que devem crescer com o tempo – o que reforça a percepção de que o BC americano, ao atuar extraordinariamente hoje, tenha observado fatores que talvez não estivessem sendo devidamente considerados fora da instituição. Hoje, após a decisão do Fed, o presidente dos EUA, Donald Trump, defendeu que o BC americano siga cortando os juros, para se alinhar a outros países.
Após ter sido criticado ontem por Trump, pela lentidão em reagir ao coronavírus, o Fed entrou em campo hoje com um corte que colocou os fed funds na faixa de 1,00% a 1,25%, duas semanas antes do encontro programado para março. Em um primeiro momento, a inesperada decisão do Fed entusiasmou os mercados globais, que mostravam frustração, mais cedo, com a falta de ação coordenada do G7 na reunião de ministros de Finanças e presidentes de BCs realizada nesta terça-feira, por teleconferência.
“O corte de juros efetivado pelo Fed foi bem relevante, após a decepção com o G7. Mas a fala de Powell mostrou preocupação com uma situação, de fato, grave”, diz Henrique Esteter analista da Guide Investimentos.