• As eleições e a morte da verdade

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  • 22/09/2018 07:00

    A filosofia debate se a verdade é possível, se é relativa. Para mim, vale o que boas mães ensinaram: diga sempre a verdade. A moral a tem por virtude. Cristo diz que liberta. É base para relacionamentos saudáveis e decisões confiáveis. Mas por ser luz tão intensa, a verdade pode incomodar. Em jogos que precisam se fazer às escuras, mentirosos fazem tiro ao alvo em suas lâmpadas. 

    Bismarck disse que “nunca se mente tanto como em eleições, guerra e caçadas”. Estamos nas eleições mais graves desde a redemocratização do país e, pior, travadas em ritmo de guerra, caçadas (e facadas)! A mentira, então, grassa qual praga. As forças situadas nos extremos do espectro político e que podem nos oferecer um segundo turno de pesadelo, estão erguendo palanques sobre graves e cruéis inverdades. Um país não se constrói sem um conjunto de valores comuns, e entendimentos sólidos sobre fatos da sua história.

    Verdade é conformidade com os fatos. Se alguém tomou um tombo, a memória recorda, testemunhas atestam, cicatrizes nos joelhos confirmam. Fato: um tombo. Mas, como ninguém gosta de cair, a pessoa pode ser tentada a mentir: não houve tombo. Dizer que as testemunhas se enganaram, viram outra coisa ou pessoa, acrescer que os joelhos estão é com umas escaras de alergia. Se repete, fala, escreve e televisiona isso reiteradamente, quem não presenciou a ocorrência acaba adquirindo, pela insistência, essa falsa visão. Daí, se outro diz, “fulano tomou um tombo”, haverá quem retruque: “não houve tombo algum”.

    O Brasil sofreu dois tombos terríveis. A ditadura militar de 1964 e o banquete de corrupção dos governos petistas. Houve outras ditaduras no Brasil, e há quem aposte em maior crueldade no Estado Novo. Houve corrupção desde sempre, e há quem a ache maior em períodos outros. Mas a constatação de ancestral corrupção e mais ditaduras não apaga estes fatos provados, historiados, vividos e testemunhados: houve cruel ditadura militar a partir de 1964 e uma apoteose de corrupção nos governos Lula e Dilma. Mas querem reescrever a história, como no “1984” de Orwell. Bolsonaro afirma que não houve ditadura e torturadores cruéis são heróis. O PT, que corrupção não praticou e Lula e Dirceu são virgens santas.

    Isso oferece dilema parecido com a brincadeira “verdade ou consequência”. Para não dizer a “verdade” que pode obrigar à confissão de vexames, frequentemente o sorteado prefere a “consequência” – o castigo, em geral ridículo ou incômodo. O Brasil é hoje esse jogo. Quem votar nas candidaturas extremadas, mesmo que não pretenda, vai deixar de lado alguma verdade. Isso dará ao Brasil gravíssimas consequências. Fará um buraco na história nacional, arruinando as fundações para o bom futuro do país. A morte da verdade põe todas as outras virtudes com a faca no pescoço. Libera a manipulação, a hipocrisia, a traição, o ódio. O atraso. As portas se abrem para repetição tanto do autoritarismo quanto da corrupção. Sei que nessa eleição atípica, túnel do tempo que nos leva ao confronto de velharias, tipo um doído Mussolini x Stálin, pessoas têm decidido o voto à flor da pele, por razões várias, até por autodefesa. Mas vote de olhos abertos. Mesmo forçado a escolher algum mentiroso, não lhe endosse a mentira. A verdade precisa imperar. Sem ela, restaremos tristemente patéticos, perigosamente tristes, um tanto sombria Alemanha dos anos 1920, outro tanto assustadora Venezuela de agora.

    denilsoncdearaujo.blogspot.com

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