• Armadilhas institucionais e o STF

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  • 19/04/2021 14:56
    Por Gastão Reis

    No centro de uma jaula com cinco macacos, cientistas puseram uma escada com um cacho de bananas no topo. Sempre que um macaco resolvia subir a escada para pegar as bananas, os quatro que permaneciam no chão levavam um jato d’água fria. A repetição desse processo fez com que os demais enchessem de pancadas o macaco que tivesse a ousadia de subir a escada em direção ao seu sonho. Após certo tempo, nenhum macaco subia mais a escada. Em seguida, os cientistas substituíram um dos cinco macacos por um novo, que desconhecia os estranhos hábitos do grupo. Quando o novato tentou subir a escada, os demais o espancaram impiedosamente. Após algumas surras, ele já tinha pegado o espírito da coisa. Um segundo macaco foi substituído e repetiu-se a mesma cena de surras e acomodação à norma vigente. Vale mencionar que o primeiro macaco participou animadamente da sessão de pancadaria no segundo macaco substituído. E assim por diante, até a substituição do último macaco veterano do grupo inicial sem que isso causasse maiores alterações quanto ao comportamento simiesco. Não obstante, desde o primeiro macaco substituído, o jato d’água fria já havia sido suspenso…

    O exemplo em tela nos fornece o arcabouço das “instituições” que regem a vida desses macacos. Evidencia como os incentivos (ou desincentivos) são determinantes do comportamento observado quando se pretende alcançar um dado resultado. Em especial quando tais incentivos são mentalmente internalizados. Douglas North, Nobel em Economia, nos diz que “instituições são as regras do jogo numa sociedade ou, mais formalmente, são as restrições que nós. humanos, estabelecemos para moldar a interação humana”. Elas “definem a estrutura de incentivos das sociedades e, especificamente, das economias”.

    Mas as instituições podem ser disfuncionais, degenerando em situações tecnicamente denominadas armadilhas institucionais, ou seja, “um esquema geral de formação de normas ou instituições ineficientes, ainda que estáveis”, na definição do economista Victor M. Polterovich, em instigante pesquisa publicada no livro, de 2001, The New Russia–Transition Gone Awry (A Nova Rússia – A transição que Perdeu o Rumo). O trágico é que tais desvios de comportamento, embora reversíveis, podem consolidar-se na vida dos povos. O Brasil faz parte deste grupo infeliz desde 1889.

    A corrupção sistêmica, a economia informal, a dívida pública crescendo a galope, a carga tributária escorchante – atrofiante do investimento privado e do público via corrupção – e ainda a troca direta entre empresas são definidas na literatura econômica com ocasos típicos de armadilhas institucionais tanto mais perniciosas quanto mais durarem. Tais armadilhas são mantidas por mecanismos de coordenação, de aprendizado torto, de tráfico de influência e de inércia cultural. No nosso caso, por uma legislação político-partidário- eleitoral e econômica indutora de desvios de comportamento na esfera pública e particular prejudiciais ao desenvolvimento sustentado do País.

    Países hoje desenvolvidos já foram vítimas dessas armadilhas. Foi o caso dos EUA no século XIX. A reforma democrática que extinguiu a exigência de ser proprietário para poder votar, dando acesso ao voto às classes menos favorecidas, teve consequências imprevistas deletérias. As grandes máquinas partidárias então montadas se tornaram instrumento de enriquecimento ilícito dos caciques da política. Posições no serviço público, recolhimento de parte dos salários dos funcionários nomeados por políticos, a polícia deixando de lado sua função básica de aplicar a lei com rigor, ter de subornar servidores públicos para obter contratos e outros desvios passaram a ser o ópio político-institucional do País. Acertou, caro leitor, se estiver pensando no Brasil “republicano” de hoje à imagem e semelhança do PT.

    No caso americano, na virada do século xix para o xx, grupos de cidadãos – como contribuintes de classe média, pequenos negociantes,  fazendeiros e profissionais de várias categorias – se uniram e conseguiram implantar uma reforma administrativa capaz de separar a política da gestão. A armadilha institucional que emperrava o desenvolvimento do País foi assim neutralizada.              

    A semelhança entre nós e o quadro descrito na reação havida nos EUA vai-se diluindo cada vez mais. O agravante no Patropi é o fato de o próprio STF não se dar conta da gravidade de manter a anulação dos processos do Lula em Curitiba por 8 a 3, respaldando a decisão monocrática do ministro Fachin. Simplesmente, tenta forçar nossa capacidade de engolir sapos, em especial o barbudo, para relembrar o dito do Brizola. A cegueira dessa decisão ignora o quadro maior dos crimes cometidos por Lula e sua quadrilha, podendo mesmo abrir espaço para a prescrição pela demora da Justiça em recomeçar do zero. A mensagem é que a Lava-Jato está em perigo e suas condenações podem ser revertidas. Será que vamos ter que indenizar criminosos? Que Deus nos ajude a reagir à altura.   

    Nota: Este artigo meu, atualíssimo, foi publicado no Estadão, em 30.06.2015, com poucas adaptações sobre o desvario do STF.

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