• Após enchentes, Rio Grande do Sul confirma primeira morte por leptospirose

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  • 21/maio 12:46
    Por Renata Okumura / Estadão

    Um idoso de 67 anos morreu de leptospirose no município de Travesseiro, no Vale do Taquari, no Rio Grande do Sul, uma das cidades atingidas pelas enchentes que assolam o Estado gaúcho. Ele começou a apresentar sintomas no dia 9 de maio, mas o óbito aconteceu em 17 de maio, segundo informou a Secretaria da Saúde do Rio Grande do Sul na tarde de segunda-feira, 20. É a primeira morte confirmada em decorrência da doença desde que o Estado vive a pior catástrofe climática da sua história.

    “A confirmação se deu após o resultado positivo na amostra analisada pelo Laboratório Central do Estado (Lacen), em Porto Alegre”, disse a pasta. As enchentes são reconhecidas como ambientes propícios para a disseminação da doença, elevando o risco para aqueles expostos às águas.

    Vale ressaltar que a leptospirose é uma doença infecciosa geralmente adquirida por meio da água contaminada por urina de animais infectados, principalmente ratos. Além disso, uma de suas principais características é que o surgimento dos primeiros sintomas pode variar muito de pessoa para pessoa, podendo acontecer de dois até 30 dias após a infecção, de acordo com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Justamente por isso, pessoas que tiveram contato com águas possivelmente contaminadas, como de enchentes, precisam ficar atentas durante todo esse período.

    A secretaria estadual, por meio do Centro Estadual de Vigilância em Saúde (Cevs), vem fazendo o monitoramento de casos suspeitos a partir das notificações realizadas pelos municípios. Nas últimas semanas, de acordo com a pasta, foram identificadas 304 ocorrências não confirmadas de leptospirose e 19 casos confirmados. “Antes do período de calamidade enfrentado pelo Rio Grande do Sul, com dados até 19 de abril, o Estado já havia registrado, em 2024, 129 casos e seis óbitos. Em 2023, foram 477 casos e 25 óbitos”, afirmou a SES.

    Leptospirose

    A leptospirose é uma doença infecciosa febril aguda e transmitida a partir da exposição direta ou indireta à urina de animais (principalmente ratos) infectados, que pode estar presente na água ou na lama de locais com enchentes. “O contágio ocorre através do contato da pele com a água contaminada ou por meio de mucosas”, reforça a Secretaria da Saúde do Rio Grande do Sul.

    Episódios como alagamentos aumentam a chance de infecção pela doença. “Esse é o primeiro caso de óbito confirmado no Rio Grande do Sul, após as enchentes registradas desde o fim de abril. Contudo, não é o primeiro do ano no Estado, visto que a leptospirose é uma doença considerada endêmica, ou seja, com circulação sistemática no ambiente”, alerta a secretaria estadual.

    Diante da notificação, a secretaria alerta para a importância de a população procurar um serviço de saúde caso observe os seguintes sintomas:

    Febre;

    Dor de cabeça;

    Fraqueza;

    Dores no corpo (em especial, na panturrilha);

    Calafrios.

    Além disso, o Ministério da saúde destaca que podem ocorrer diarreia, vermelhidão ou hemorragia conjuntival (na região dos olhos), fotofobia, dor ocular, tosse, manchas vermelhas na pele, aumento do fígado e/ou baço e aumento de linfonodos (gânglios presentes principalmente no pescoço, axilas e virilhas).

    De acordo com a Fiocruz, apesar de os sintomas terem potencial de manifestação de dois a 30 dias após a infecção, na maior parte dos casos os infectados começam a apresentar os primeiros sinais da doença de sete a 14 dias depois da contaminação. Ao identificar os primeiros sintomas, a orientação é procurar um serviço de saúde imediatamente e relatar se houve contato com alagamentos.

    “Considerando o atual cenário de chuvas e cheias em várias regiões do Estado, casos suspeitos oriundos de áreas de alagamento e com sintomas compatíveis com leptospirose devem iniciar tratamento medicamentoso imediato. Quando possível, deve ser coletada amostra a partir do sétimo dia do início dos sintomas para envio ao Lacen”, orientou a secretaria.

    Automedicação não é indicada

    Segundo a pasta, o tratamento com o uso de antibióticos deve ser iniciado no momento da suspeita e com orientação de um profissional de saúde. “Para os casos leves, o atendimento é ambulatorial, mas, nos casos graves, a hospitalização deve ser imediata, buscando evitar complicações e diminuir a letalidade”, afirmou ainda.

    Orientações a serem seguidas:

    Nos locais que tenham sido invadidos por água da chuva, recomenda-se fazer a desinfecção do ambiente com água sanitária (hipoclorito de sódio a 2,5%), na proporção de um copo de água sanitária para um balde de 20 litros de água;

    Mantenha os alimentos guardados em recipientes bem fechados;

    Mantenha a cozinha limpa e sem restos de alimentos e retirar as sobras de alimentos ou ração de animais domésticos antes do anoitecer;

    Mantenha o terreno limpo e evitar entulhos e acúmulo de objetos nos quintais ajudam a evitar a presença de roedores;

    A luz solar também ajuda a matar a bactéria;

    Evitar o contato com água ou lama de enchentes e impedir que crianças nadem ou brinquem nessas águas. Se não for possível, é indicado o uso de botas e luvas de borracha (ou sacos plásticos duplos amarrados nas mãos e nos pés);

    Para o controle dos roedores, também recomenda-se a desinfecção e vedação de caixas d’água, vedação de frestas e aberturas em portas e paredes, etc. O uso de raticidas (desratização) deve ser feito somente por técnicos devidamente capacitados.

    Tive contato com água possivelmente contaminada: o que fazer?

    De acordo com o infectologista e consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Renato Grinbaum, a primeira coisa a se fazer após o contato com a água possivelmente contaminada é lavar o corpo prontamente para reduzir o tempo de exposição e minimizar o risco de infecção.

    Além disso, recentemente, a SBI, a Sociedade Gaúcha de Infectologia e a Secretaria da Saúde do Estado do Rio Grande do Sul divulgaram nota técnica orientando sobre a melhor forma de realizar a profilaxia (medidas utilizada na prevenção ou atenuação de doenças) para prevenir a doença em casos onde há exposição contínua e inevitável com água de enchentes, como tem acontecido no Rio Grande do Sul.

    Embora o uso de antimicrobianos não seja recomendado como conduta de rotina, sendo administrado apenas quando há o diagnóstico da doença, a nota ressalta que em situações de alto risco, onde há muita exposição a alagamentos e águas possivelmente contaminadas, essa intervenção pode ser considerada com o objetivo de minimizar os riscos, desde que seja realizada sob orientação médica.

    A principal recomendação das entidades responsáveis pelo documento é o uso de doxiciclina, administrada em dose única para adultos em pós-exposição de alto risco. Para crianças, a dose é calculada com base no peso corporal, com dose máxima estabelecida. Como alternativa, a azitromicina pode ser utilizada nas mesmas condições.

    Considerando esses pontos, as recomendações para identificar pessoas em situação de alto risco e elegíveis para o uso de medicamentos de emergência são as seguintes:

    Equipes de socorristas de resgate e voluntários com exposição prolongada à água de enchente, quando equipamentos de proteção individual não são capazes de prevenir a exposição;

    Pessoas expostas à água de enchente por período prolongado com avaliação médica criteriosa do risco dessa exposição.

    É importante frisar que a profilaxia deve ser feita apenas com orientação médica. Além disso, ela não oferece uma proteção absoluta contra a leptospirose, e mesmo aqueles que fazem uso dos medicamentos recomendados ainda podem contrair a doença. Além disso, gestantes e lactantes não devem utilizar doxiciclina como medida preventiva.

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