
Aniversário do poeta
Não poderia deixar de recordar o aniversário, no próximo dia oito de setembro, do poeta, jornalista e trovador Osmar de Guedes Vaz, meu pai.
Nasceu em Oliveira, Minas Gerais, tendo seguido a trajetória do pai, também funcionário federal, jornalista e poeta.
Seus estudos inicialmente foram levados a efeito na cidade de Oliveira e mais tarde passando a frequentar o tradicional Ginásio Santo Antônio, na cidade de São João Del Rei, onde viveu durante a infância e adolescência. Todavia, a ausência do pai marcou-lhe de forma a nunca esquecer acerca de tal perda, vez que o falecimento ocorreu precocemente quando ele e os irmãos eram crianças.
Só mesmo o sacrifício e a luta encetada por parte da mãe fizeram com que os grandes obstáculos pudessem ser ultrapassados.
Transcorridos os anos, escreveu o poeta:
Inda menino, quando a vida é pura\ quando ela tem o seu melhor encanto,\ eu já sofria o meu primeiro pranto,\ com a morte do meu pai, tão prematura.\ E, assim, tangido pela desventura,\ cheguei à adolescência, sem, no entanto,\ ter suavizada a sorte má, que tanto\ me perseguia, impiedosa e dura.\E de tal forma com a adversidade\ me confundi, que se a felicidade\passou em meu caminho, eu não a vi;\ nem sequer a senti, tanto que agora,\ já no ocaso da vida, me devora\ a saudade do tempo em que sofri!
Ainda relembrando a figura do poeta, escreveu em “Cantigas que fiz na serra”.
“Órfão de pai, imaturo,
Que cedo, à luta, se vai,
É o que dirá, já maduro:
Como fez falta meu pai”.
E mais:
Soneto
“Alma minha, que foste de repente,
Desta vidinha, por um golpe ingrato,
Repousa lá no céu, tranquilamente,
Enquanto, aqui, eu vivo com recato.
Se lembranças da terra, um desacato
Não for a esse lugar altipotente,
Revê, a miúde, aí, o meu retrato,
Que eu vou vivendo aqui, saudosamente…
Se influência tiveres, porventura,
Junto ao Divino Mestre; nessa altura,
De joelhos, te peço ardentemente:
Implora a Deus que te levou tão cedo,
Que não me leve a ver-te – eu tenho medo…
Que me deixe na terra que é mais quente”.
Relembrando a infância na mesma obra escreveu:
“Infância… quanta saudade!…
Da vida, feliz instância!
Mesmo sem pai, na orfandade,
tive ventura na infância.”
Ainda moço decidiu trabalhar no município de Valença, Estado do Rio de Janeiro, num patronato que acolhia crianças e rapazes pobres e desamparados e lá, como um perfeito autodidata, inteligente e perspicaz, ensinou-lhes o que já muito aprendera na “Escola da Vida”, como assim sempre afirmava.
E foi essa escola que realmente fez com que viesse alçar mais tarde, não só na esfera literária, mas também na vida profissional, altos cargos no âmbito do Departamento Nacional de Estradas de Rodagem, onde começou sua labuta em 1936, terminada em 1972.
Assim é que destacou-se na então autarquia, como Diretor do Serviço de Comunicações, Assistente do Diretor-Geral engenheiro Jacinto Xavier Martins Junior, sem falar com relação aos Diretores-Gerais Edmundo Régis Bittencourt, José Lafayete Silviano do Prado e Francisco Saturnino Braga.
Desde a infância rabiscara os seus primeiros versos até por questão de hereditariedade, eis que aos doze anos, em São João Del Rei, no primeiro ano ginasial, já dirigira um jornal denominado O SHOOT, manuscrito em parceria com um colega que acabara por ingressar no glorioso Exército Nacional.
Seguiu-se após, outro Jornal, já impresso – O GRITO, todavia de duração efêmera.
Sua vida literária foi expressiva mantendo por longos anos a função de redator do Jornal “O Rodoviário”.
Humorista, muito colaborou também por longo período publicando sonetos, trovas e crônicas, a exemplo do Jornal de Petrópolis, Tribuna de Petrópolis, Jornal do Povo e Diário de Petrópolis.
Figura nas antologias “Meus irmãos os Trovadores”, “Trovadores do Brasil”, “Nossos poetas”, “Andanças Poéticas”, “Poetas Petropolitanos, uma Saudade” e “As mais belas poesias petropolitanas de amor”, as duas últimas obras de autoria do eminente professor e escritor Paulo César dos Santos.
Publicou várias obras dentre elas “Versos Diversos”, em 1956; “Cantigas que fiz na Serra”, em 1964; “Travos, Trevos e Trovas”, em 1978.
A se destacarem, ainda, “No Limiar do Além” e o “Canto do Cisne”.
Em Belo Horizonte, na revista “Terra Mineira” e em Valença, no estado do Rio de Janeiro, no jornal “A Palmatória”.
Em Petrópolis, na “Pequena Ilustração”, sempre prestando merecidos elogios ao dileto amigo, o jornalista Hilton Martins, profissional dos mais competentes à época e filho do ilustre, também Jornalista, Armando Martins.
Exímio trovador, sempre afirmava: “a trova não é fácil de ser feita, pelo contrário, porquanto o poder de síntese não é dado a qualquer pessoa e na trova prepondera, justamente, esse fator”.
Permito-me ressaltar, nas palavras do também inesquecível professor, poeta e trovador Roberto Francisco, manifestando-se sobre Osmar como sendo “…o maior poeta satírico da terra de Pedro II”.
Por outra vertente, o procurador Álvaro Teixeira de Assunção, em “Um amigo que não é esquecido”, que integra o livro “Vida e obra do poeta Osmar de Guedes Vaz”, de minha autoria, assim se pronunciou acerca do poeta e funcionário público de escol:
Dos antigos funcionários do DNER, se destacava pela assiduidade, competência, enfim pela perfeita noção do cumprimento do dever, sendo de uma honradez doentia. Apesar de tudo sempre amável, educado e ainda tendo tempo nas suas raras horas de lazer para fazer poesia.
Nomeado Tesoureiro, logo após se tornou Tesoureiro-Geral da autarquia.
E completa o amigo: “E não podia deixar de sê-lo, pois era dessas raríssimas pessoas a quem se podia confiar a guarda de ouro em pó”.
Também, a respeito dessa figura inesquecível, escreveu o amigo e poeta Francisco Carauta de Souza, em 12 de março de 1965, em Perfis Petropolitanos nº 159, o poema abaixo:
“Poeta e sonhador (como eu também),\ sem ter no entanto cabeleira ao vento,\ maneja as trovas e sonetos tem\ no estilo de apurado sentimento.\ Gosta da SPAC e sei que à SPAC vem\ dar um prazer de social momento\quando a DER lhe permite bem\ ou não está sob ação do esquecimento. \Suas paródias recita com tal graça\ e os clássicos revolve na devassa\ para dar-nos um luso de tamancos.\ Tem volume de versos tão Diversos\ e outros sonetos tem então dispersos\ nos bolsos de seus ternos sempre brancos”.
Vale relembrar, mais uma vez, o ilustre professor Paulo César dos Santos, por ocasião do lançamento do livro “Pai e filho na mesma trilha”, de minha autoria, quando se manifesta: “… concluindo estes simples comentários, é importante salientar que a inspiração de Osmar de Guedes Vaz era espontânea e intensa. Para ele, aplica-se a máxima do célebre poeta francês Alfredo de Musset: A poesia está na alma, como o rouxinol nas ramagens”.
Em 1962 assumiu a cadeira nº 28 da Academia Petropolitana de Letras, sob o patronato de Castro Alves, “… levado àquela instituição por unanimidade de votos, cousa singular, digna de registro”, conforme assinalou o ilustre médico e acadêmico Jorge Ferreira Machado na Revista nº 2, do mês de agosto de 1962.
Pertenceu ainda, à Sociedade Petropolitana de Arte e Cultura, à União Brasileira de Trovadores, da qual foi presidente e à Sala de Letras e Artes Gabriela Mistral.
A ser ressaltado que durante os festejos dos 40 anos da Academia Brasileira de Poesia – Casa Raul de Leoni, foi exaltado entre os luminares da cultura no Quadro de Membros Eméritos, iniciativa do poeta e acadêmico Fernando Costa.
O poeta ainda nos legou o seguinte poema:
No Epílogo da Vida
Jamais tive receio de morrer,
nada a respeito desse triste evento,
já que entendo não ter por que temê-lo,
me preocupa, intimida ou martiriza:
Não me importa, também, meu pensamento,
para muitos, terrível pesadelo,
e que, um dia, na certa, há de ocorrer,
nem de longe, afinal, do extremo instante,
o irreversível acontecimento,
que já não me parece tão distante.
Tenho, porém, horror ao sofrimento,
que, embora, sem razão pra merecê-lo,
pode estar, entre nós, sempre presente,
nessa fase sombria, e algo imprecisa,
que precede, de forma rotineira,
o epílogo da vida, quando a gente
na penumbra de um quarto, e que divisa,
sob uma baça luz, bruxoleante,
quase a se extinguir: o espectro da morte,
num estranho e funéreo parâmetro,
que lhe envolve a figura sorrateira.
Por isso, eu peço a Deus a boa sorte
de permitir a mim, em tal momento,
um doce e calmo fim, sem alarido.
Sem que haja desespero, um só gemido,
meu coração batendo ainda, no peito,
alegre, venturoso, satisfeito,
pela certeza do dever cumprido.
Porquanto, o meu desejo mais ardente
é, um dia, morrer, suavemente,
tranquilo, sem remorsos, de mansinho,
assim, como se fosse um passarinho.
Petrópolis – Dezembro de 1977.
Oito de setembro do mês corrente, data do aniversário.
Dezessete de setembro de mil novecentos e oitenta e nove, do seu falecimento.
Ao preservar a memória do meu pai, recordo a vida e obra do homem honrado, culto, ornado de virtudes e, sobretudo, amado pai.
Certamente, descansa na paz do Senhor!