• Alternância no poder e democracias

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  • 15/09/2016 12:00

    As democracias mais sólidas do planeta incorporam à sua vida política o princípio de que a liberdade é, antes de mais nada, a de quem discorda de nós. Rosa Luxemburgo afirmou esta verdade, que não chegou a empolgar as lideranças de esquerda de seu tempo.  Está na raiz de um equívoco fatal que levou os defensores do comunismo a se embrenharem na lei da selva do totalitarismo. E, neste sentido trágico, caminhar lado a lado com o nazismo. São as duas fortalezas do pensamento único, que a História descartou. A luta pela liberdade do outro como traço cultural a ser preservado exige vigilância permanente. A China, por exemplo, com seus seis mil anos de civilização, parece não ter absorvido ainda plenamente esse conceito basilar da democracia, que vem da praça pública grega.  

    Alguém poderia nos relembrar que essa visão da liberdade do outro não fazia parte da cultura chinesa. Afinal, o reino da harmonia, tão caro aos filósofos chineses, era o principal pilar de sua visão de mundo. Como encaixar nessa moldura aquele que discorda, que quebra, ou estremece, a harmonia como valor maior de uma civilização? Mas essa explicação não parece satisfatória quando recorremos a Confúcio, reconhecidamente o maior filósofo chinês, que viveu há mais de 24 séculos, antes, portanto, da era cristã.

    Uma primeira pista pode ser encontrada numa frase plena de sabedoria do autor dos Analectos: “Quando vires um homem bom, tenta imitá-lo; quando vires um homem mau, examina-te a ti mesmo.” Note, caro leitor, a sutileza de Confúcio sobre a natureza humana, ou seja, a mancha do pecado original, de que nos fala a Bíblia. Curiosamente, Bertrand Russell, filósofo inglês ateu, ia na mesma direção e não se iludia quanto à natureza humana corrompida. Segundo Russell, quem não entende a metáfora do pecado original desconhece o que é a natureza humana. Mas Confúcio vai além. Diz em sua obra maior, que o intelectual, ou seja, o filósofo, termo usado na época, tem obrigação de ir contra o poder estabelecido quando este atenta contra a verdade e a liberdade, deixando de ser o guardião do interesse público. E pouco importa a classe social do intelectual, e sim seu compromisso maior.

    Comunismo e nazismo foram ideologias que se supunham donas de supostas leis históricas que trabalhavam a seu favor. O futuro lhes pertencia. Não foi assim que a História caminhou. Hora de a esquerda se lembrar da lição de Rosa Luxemburgo e da tradição democrática grega. E reconhecer que a alternância no poder é a confirmação prática de que aquele que discorda de mim tem o direito de assumir o poder quando este resulta do voto democrático obtido legitimamente nas urnas sem enganar o eleitorado. O oposto do que fez Dilma na última eleição presidencial, e que acabou levando ao impeachment, exigido nas ruas pela população. O delírio mais recente foi a do senador Lindbergh Faria afirmando que a democracia acaba no Brasil se o PT tiver o registro cassado. Na verdade, mais uma mentira do PT, o risco real de a democracia ir para o brejo no País ocorreria se aquela proposta do controle social dos meios de comunicação tivesse vingado como queria o PT.

    Surpreende, nisso tudo, a posição do ex-ministro do STF Joaquim Bar-bosa se dizendo receoso de que a deposição constitucional da presidente Dilma pudesse levar no futuro à cassação de outros presidentes. Estranhamente, não via maiores razões para o processo de impeachment. E aqui, mais uma vez, a embocadura torta do presidencialismo torna difícil, lento e complicado o pro-cesso de afastamento de um presidente a quem falta a confiança de seus conci-dadãos. No parlamentarismo, a pedra angular de um governo é a confiança de seus pares e da população. Sem ela, o governo cai. E sem maiores delongas, para o bem geral da Nação. Maus governos têm um custo astronômico.

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