• Alteridade e empatia

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  • 24/09/2023 08:00
    Por Ataualpa A. P. Filho

    Aprendi muito em Petrópolis. Tenho uma gratidão imensurável diante das oportunidades que tive para enxergar melhor a importância de uma consciência voltada para o bem comum. As tragédias provocadas pelas chuvas que presenciei aqui me levaram a entender melhor os conceitos das palavras “alteridade” e “empatia”. Há uma linha tênue entre elas.

    A “empatia” se consolida pela flexibilidade de colocar-se no lugar do outro. E assim, é possível ter uma noção do sofrimento do próximo. Até mesmo por uma questão de analogia, é possível imaginar a dor do outro por ter vivido situação semelhante. Esse é um dos caminhos que conduz à solidariedade. Colocar-se na “pele do outro” é abrir espaço para que a generosidade possa brotar dentro de nós.

    Quem já sentiu na própria pele o desespero impotencializador diante da força das águas em uma correnteza descomunal identifica, com facilidade, o sofrimento de quem se encontra em situação de calamidade.

    A “alteridade” reside nas raízes dos princípios democráticos, uma vez que consiste em respeitar o outro na individualidade dele, ou seja, é preciso reconhecer o próximo como uma pessoa não somente dotada de direitos e deveres, mas também com virtudes, defeitos, com experiências de vida, valores morais, éticos. Em suma, a alteridade está não só no reconhecimento da existência do outro, como também na respeitabilidade da maneira dele ser como é. O termo “alteridade é proveniente do latim “alteritas”, que significa “ser o outro”.

    Até por questões culturais, as diferenças existem e devem ser respeitadas. No exercício da empatia, da alteridade, não há espaço para o bullying, nem para o racismo, ou melhor, não há espaço para nenhuma atitude segregadora, supremacista.
    A resiliência se faz necessária nos momentos em que as divergências se apresentam e precisam ser conciliadas. Pelo diálogo, encontram-se os caminhos que levam ao ponto de equilíbrio necessário para uma convivência pacífica. A aceitação da adversidade de pensamento perpassa pela compreensão do universo plural em que vivemos.

    As tragédias ocorridas na Líbia, em Marrocos, na Grécia, na região Sul do Brasil, os incêndios florestais no Canadá, entre outros desastres ocorridos só neste ano, exigem uma mobilização mundial em busca de soluções urgentes para os problemas provenientes do desequilíbrio do ecossistema provocados pelas ações humanas. Em se tratando de calamidade pública, penso que as rivalidades políticas, ideológicas deveriam ser suplantadas, uma vez que a vida pede socorro.

    As inundações que atingiram a parte oriental da Líbia na semana passada, causando a morte de milhares de pessoas, terão reflexos em outros países, principalmente no que se refere a questões econômicas.

    Humanizar-se é um processo árduo. As ações que combatem o egoísmo exigem renúncias, imprescindíveis na abnegação que difere de sacrifício. O amor, que se materializa em doação, sabe que a partilha une fraternalmente. O desprendimento possibilita a ajuda mútua. A interação social é inevitável.

    É quase impossível não se colocar no lugar de uma mãe, de um pai que perdem uma filha de três anos atingida por duas balas de fuzil disparadas por um agente policial que tem como função cuidar da segurança da sociedade. A dor bate forte em nosso peito, pois não é possível aceitar a tragédia como algo natural. No Rio de Janeiro, neste ano, onze crianças já foram mortas a tiro, vítimas de uma violência selvagem. Petrópolis, mais uma vez, se sente ferida…

    “Homem algum é uma ilha” já afirmara Thomas Merton. As relações sociais ficam registradas na história. O que se deseja de um processo civilizatório consciente é que tais relações ocorram pela equidade de forma espontânea, pelo reconhecimento do valor do outro, para que o existir seja marcado pela reciprocidade do respeito, fundamentado em princípios éticos, morais.

    Quem carrega a alteridade e a empatia dentro de si não se sente feliz com a “desgraça alheia”. E aqui transcrevo o desafio que o Senhor da Paz nos deixou:

    “Amai vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem, para serdes filhos de vosso Pai que está nos céus. Porque Ele faz nascer o Sol para bons e maus e chover sobre justos e injustos. Pois se amais somente os que vos amam, que recompensa tereis? Não o fazem também os cobradores de impostos? E se saudais apenas vossos irmãos, que fazeis de extraordinário? Não fazem também os pagãos? Portanto, sede perfeitos como o vosso Pai Celeste é perfeito. (Mt 5, 44-48)

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