• Além do teto

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  • 20/12/2016 12:00

    Entendo que a Magistratura e o Ministério Público devem ser bem remunerados, com recursos que propiciem aos titulares de suas funções uma vida digna e confortável, embora sem ultrapassar os limites legais e sem quaisquer artificialismos. Como diz Joviana Cavaliere Lorentz, devotada cultora da Ciência Jurídica, “quem acha ‘virtude’ em ganhar acima do teto constitucional não tem nem ideia do que é virtude e que lugar de ganhar fortunas é na iniciativa privada”, com todos os riscos inerentes à respectiva atividade.

    Também defendo que determinados tipos de políticos, fisiológicos, negocistas, agenciadores do balcão parlamentar, há muito já deveriam ter sido banidos da vida pública. Os meus leitores sabem que tenho ojeriza pela figura deplorável do senador Renan Calheiros e outros de igual jaez, com presença hoje lamentavelmente dominante no Congresso Nacional e no cenário político do país.

    Mas, com todas as restrições ao alagoano, um dos condestáveis da República – pobre Brasil, não há como discordar de sua iniciativa de fazer valer as limitações impostas pelo teto constitucional, algo em torno de R$ 33 mil, como remuneração paga aos ministros do STF. Assim, não vejo razões legais e éticas no protesto das associações de magistrados, procuradores e promotores, quando se insurgem contra as fronteiras estabelecidas pela legislação, violada por muitos penduricalhos, que alargam em valores extraordinários o que é pago a esses servidores púb licos. De mais a mais, pouco importa essa história de que Renan Calheiros estaria retaliando, como investigado ou denunciado pela Lava-Jato, uma vez que, se existe teto, que se respeite o teto, que se cumpra a Constituição. Tamanha é a insensatez que a presidente da Associação Nacional do Ministério Público, também representante da Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público, declarou que o projeto veio em decorrência do trabalho da Operação Lava-Jato e que todos eles “não estão sendo punidos por suas falhas, mas por suas virtudes”. Talvez em ato falho, quais seriam as falhas, o recebimento de remuneração além do teto constitucional? Como se vê, tem-se uma tentativa canhestra de justificar a fixação de salários acima dos limites legais, em importâncias mensais que alcançam milhar es de reais.

    O que a sociedade exige é que se tenha um mínimo de transparência na composição remuneratória dos membros do Judiciário, com a extinção de todos os penduricalhos, que fazem com que se extrapole o teto imposto pela Constituição. Que o salário seja condizente com as responsabilidades do cargo, mas que a folha de pagamento traduza apenas e tão somente a verba básica paga pelo exercício da função, férias e décimo terceiro, sem adicionais de qualquer natureza, nenhum centavo além.

    Na esteira do absurdo, paga-se atualmente auxílio moradia aos magistrados, no valor de R$ 4.740,00, fruto de uma liminar concedida pelo ministro Luiz Fux, como estranha forma de aumentar a remuneração dos juízes. É mais um puxadinho oblíquo, bem mais grave, pois determinado pela Suprema Corte, que permite escamotear valores que subvertem a legislação vigente.

    A Lava Jato merece o aplauso do povo brasileiro, ao pôr na cadeia quem até então se julgava inimputável. No mesmo sentido, há que se ter presente que o Brasil vive um novo momento de sua história, que não tolera mais qualquer violação da ordem jurídica, tenha a origem que tiver. E o teto, indistinto, é para todos, sem rodeios ou subterfúgios.

    paulofigueiredo@uol.com.br

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