• Abertura da mostra ‘Roma’, de Daniela Versiani, acontece neste sábado na Piccola Arena

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  • Por Aghata Paredes

    Neste sábado, às 14h, a Piccola Arena abre suas portas para a inauguração da exposição “Roma”, de Daniela Versiani. A artista, que já expôs no mesmo espaço em 2018, retorna agora com uma nova série de obras que mergulha na história da cidade através das marcas deixadas por anônimos ao longo dos séculos. Inspirada por sua primeira visita ao Coliseu, Versiani explora as contradições de Roma, refletindo opulência e decadência em suas criações.

    Em entrevista à Tribuna de Petrópolis, Daniela Versiani contou sobre como surgiu a ideia para a exposição e relembrou a viagem que mudou sua vida, quando visitou Roma pela primeira vez aos 17 anos, acompanhada de seu avô. “Ele era italiano e quis me mostrar a Itália. Realmente, foi uma viagem que abriu muitas portas na minha vida. Ver todos aqueles monumentos, a grandiosidade de Roma, mas, ao mesmo tempo, aquelas vielas, aqueles lugares meio esquecidos que continuam ali há milênios. Também a Via Ápia, quando fui ver a Via Ápia, me encantou muito, porque por ali, imagina, passaram tantas legiões, toda aquela história de conquistas realmente me impressionou muito”, relembra a artista.

    Suas obras utilizam materiais como pó de cobre, bronze e ferro, submetidos a processos de oxidação. Para a artista, eles possuem um significado simbólico. “Roma é antiga. Muitos dos objetos que você vê em Roma estão cobertos de pátina, que é exatamente uma camada superficial que se forma sobre um metal pelo processo de oxidação. Isso ocorre em metais não estáveis, como o ouro. No ouro, isso não acontece porque é um metal estável, então ele não sofre processo de oxidação. É por isso que ele também é tão valioso; porque você faz uma joia e não precisa ficar depois limpando. A prata, por exemplo, já sofre oxidação, ela pode ficar preta. E muitos objetos em Roma eram feitos de bronze, de latão, de cobre. Todos esses metais sofrem oxidação. Além disso, até tintas são feitas a partir desses metais, como óxido de ferro, óxido de cobre. Além disso, o próprio desgaste das coisas, das ruas, tem ruas lá feitas de pedra que, onde as carruagens ou mesmo os pedestres passavam, é tanto tempo de uso que essas pedras ficam rebaixadas, desgastadas. Então, tem todo esse aspecto de desgaste, que é um tema que me interessa muito. Por exemplo, nas minhas colagens, o tema retorna, só que em outro material, que é o papel. O papel desgastado nos livros velhos é também uma marca da passagem do tempo. É como se esses materiais fossem a superfície da história, que vai acumulando camadas de significado ao longo do tempo.”

    Foto: Divulgação

    Os monumentos são sempre feitos para os grandes homens, que realizaram grandes feitos, os imperadores romanos, ou então uma estátua de um grande homem da história que fica numa praça, numa cidade. E o anônimo que senta ali nessa praça e ninguém vê, ele não deixa sua história marcada.

    Inscrições como marca de presença

    A primeira visita ao Coliseu não só marcou de maneira especial a artista, como também inspirou a série de trabalhos que agora compõem a exposição na Piccola Arena. “Eu me lembro de ter ficado impressionada com vários rabiscos e nomes escritos em algumas paredes, em pedras ali no Coliseu, e eu fiquei um pouco surpresa porque pensei: ‘Nossa, um monumento tão importante e todo estragado, vandalizado.’ Mas, ao mesmo tempo, aquilo me chamava a atenção porque eu olhava aqueles nomes… eram datas diferentes, de diferentes períodos, visitantes do século XIX… acredito que foi o período em que começaram as viagens à Itália, que os ingleses faziam, os alemães faziam… tanto é que existe um livro do Goethe chamado ‘Viagem à Itália’, que é exatamente esse percurso que ele fez pela Itália e que marcou tanto a vida dele. Ele, inclusive, tem passagens em que fala de um mundo da antiguidade que foi produzido pela imaginação dele… enfim, é claro que isso tudo estou dizendo agora, a posteriori.”

    Questionada sobre como surgiu a ideia de inserir rabiscos e frases em latim em suas pinturas e como a técnica criada dialoga com sua trajetória acadêmica e artística, Versiani explica que desejava representar as marcas e camadas de tempo acumuladas na cidade. “Roma é feita de camadas, camadas históricas, sabe? Está tudo ali sobreposto, meio misturado. Você tem o Foro Romano e, ao mesmo tempo, tem museus modernos, contemporâneos. Tudo ali é meio que acumulativo, sabe? São como se fossem sedimentos de história, uns sobre os outros. Então, partindo desse princípio, eu achei que não valia a pena eu ficar organizando muito essas frases que escolhi para colocar sobre as pinturas. Acho que, se eu fizesse isso, iria contra esse espírito meio bagunçado de Roma, que é você andar pela rua, ver uma coisa do século II antes de Cristo e, depois, algo supercontemporâneo. É uma cidade em que todos os tempos estão ali acumulados, sabe? E eu venho das Letras, mas nunca estudei latim de forma organizada. Inclusive, na minha época de escola, o latim já não era ensinado, não era parte do currículo do ensino médio. E como minha formação de graduação foi em Ciências Sociais e Jornalismo, também não tive aulas de latim. No entanto, sempre gostei e tentei estudar por conta própria um pouco. É uma língua que tem uma grande história, não só em relação ao Império Romano, mas também à Igreja Católica, que produzia seus textos filosóficos em latim”, compartilha.

    Foto: Divulgação

    A ligação entre o nome da galeria e o Coliseu é algo que encantou Versiani e a motivou a propor a exposição. “Eu comecei a elaborar algumas ideias, mas, na verdade, os trabalhos realmente foram produzidos no ano passado e neste ano para esta exposição na Piccola Arena. E também o nome Piccola Arena, de alguma maneira, se relaciona com aquela grande arena que é o Coliseu. Por isso, eu mandei minha proposta para um edital da Piccola Arena e foi aceita. Fiquei muito feliz pela ligação entre o nome do projeto do Maurício de Memória e esse meu encantamento pelo Coliseu, que fez com que eu produzisse esses trabalhos. Então, acho que foi um encontro bem interessante. Essa Piccola Arena que é inspirada nessa grande arena que foi o Coliseu.”

    A artista reflete, ainda, sobre as marcas deixadas pelos anônimos nos monumentos de Roma e as contradições que elas revelam. “Você pergunta sobre a relação entre as marcas deixadas pelos anônimos nos monumentos e como elas refletem as contradições entre opulência e decadência. Essa pergunta é muito interessante e me fez refletir sobre isso. Na verdade, talvez eu não tenha pensado de forma consciente sobre isso. Mas agora me ocorre que monumentos são grandiosos. Eles são produzidos para homenagear grandes homens ou como marca do poder de uma sociedade ou de uma parte da sociedade. Porque a outra parte da sociedade não pertence a isso e não possui isso. São os anônimos, são os pobres, são as pessoas que não têm acesso a esse mundo monumental, esse mundo das coisas grandiosas. E eu acho que essas marcas são, de certa forma, uma tentativa de deixar essa presença no mundo pelos anônimos. E eu acho que, nesse sentido, por exemplo, as pichações de hoje, que são consideradas, e de certa maneira, com razão, uma vandalização da cidade, são uma tentativa de deixar uma marca em uma sociedade em que essas pessoas são um pouco visíveis. Eu entendo um pouco como essa tentativa de dizer ‘eu existo, eu estive aqui. Eu estive aqui, eu sou invisível, mas eu estive aqui.’ Minha marca sobre esse monumento. Os monumentos são sempre feitos para os grandes homens, que realizaram grandes feitos, os imperadores romanos, ou então uma estátua de um grande homem da história que fica numa praça, numa cidade. E o anônimo que senta ali nessa praça e ninguém vê, ele não deixa sua história marcada. Então, nesse sentido, acho que essas são tentativas de dizer ‘eu estive aqui, eu existi.’ Tem uma frase em latim que é ‘verba volant, scripta manent’. Em três dos meus trabalhos, eu menciono essa frase que significa: ‘As palavras voam, a escrita permanece.’ Ela tem essa materialidade, é uma frase que talvez explique um pouquinho essa relação.”

    A relação entre arte e memória é um tema central no trabalho de Versiani. “Eu espero que o público tenha interesse pelo trabalho e curiosidade, porque eu acho que todo processo de aprendizado é parte de uma curiosidade. A partir dessa curiosidade, acredito que haja muitos caminhos que o público vai poder trilhar. Pode se interessar pelos aspectos dos materiais do trabalho, pela questão da oxidação de materiais. Pode se interessar pela questão histórica de Roma, pela cidade, pela antiguidade romana. Pode se interessar até por esses aspectos mais biográficos ligados a mim, como a autora dessas pinturas. Mas a minha expectativa é que eles se sintam tocados de alguma forma, porque acho que a arte tem esse papel de tocar as pessoas e fazê-las refletir sobre elas mesmas e sobre o mundo em que vivem.”

    Foto: Divulgação

    Mais sobre a artista

    Daniela Versiani é artista visual e escritora. Dedica-se à colagem, à pintura e à encáustica. Suas pesquisas estão focadas na passagem do tempo, no diálogo entre escrita e imagem e na história dos livros. É doutora em Letras pela PUC-Rio, onde lecionou de 2008 a 2016. Publicou vários textos ensaísticos, além de ficção e poesia. Realizou as individuais “Caligrafias” (Espaço Cultural Piccola Arena, 2018), “Metálicas”, “Papéis Avulsos” (2019) e “Superfícies” (2022), estas três últimas no Espaço Cultural do Shopping Estação Itaipava.

    Com entrada gratuita, a inauguração da exposição “Roma” de Daniela Versiani acontece neste sábado (29), das 14h às 18h, na Piccola Arena (Estrada do Rocio, número 3507). Para chegar, no sentido Itaipava/RJ, siga até o km 76 (placa Rocio-Cindacta) e continue por 3 km em estrada asfaltada, virando à esquerda. No sentido RJ/Itaipava, faça o retorno no posto Brazão. Mais informações: @piccolaarena

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