A Pátria Mutilada
No dia 2-9, domingo, às 19h30m nos reunimos, mas, deixamos a TV ligada. Estranhei quando a programação parou e o repórter anunciou o incêndio em grandes proporções que tomou conta do Museu Nacional. Em fração de segundos passou um filme na memória.
Aos 10 anos em 1960 meu professor do curso ginasial Delphino Monteiro do Colégio Ruy Barbosa de Três Rios organizou uma excursão entre os alunos. No roteiro estava a Quinta da Boa Vista, o Museu Nacional. Parece-me ouvir o chilrear dos pássaros e o perfume a exalar de suas flores. Corríamos de um lado ao outro e enfim chegou a hora de adentrarmos aos umbrais daquele palácio, berço de tradição, história e memória.
Viu nascer Suas Altezas Imperiais e Reais Dom Pedro II e Princesa Isabel. Hoje deparamos com esta dura realidade! Nossa Pátria está em chamas, a história emudece e agoniza! Não é simples metáfora. Seria fácil usar uma figura de linguagem para expressar a dor da perda e a desolação, no entanto, não é tão somente o Rio de Janeiro quem empobrece. É o Brasil em geral. A crise assola em crescente declínio.
Se antes nos dávamos ao direito de passearmos pelas calçadas da cidade maravilhosa, ousávamos durante o trajeto à descida da serra lanchar e vislumbrar a “belvedere” do restaurante em formato de “disco voador” hoje relegado ao abandono. Nos tempos hodiernos seria loucura em virtude da violência. Vive-se em crise material e moral. A corrupção e a insegurança tomam conta dos quadrantes cariocas e se alastra…Alvejados pela dor assistimos nossa história consumida pelo fogo.
As consequências são devastadoras. E a imprensa e as instituições há tempos vinham alertando sobre o perigo e o descaso que o Patrimônio Histórico estava a sofrer, notadamente o Museu Histórico Nacional. Ignoraram. Ao que se lê, e se ouve os setores competentes destinam verba para inúmeros projetos sem prioridade à preservação desse e de outros tantos espalhados pelo País. A catástrofe serve de alerta para chamar a atenção do patrimônio nacional.
Há tempos ocorreu em São Paulo no Museu do Amanhã, em Minas Gerais assistimos o desabamento de uma igreja centenária, na Bahia idêntica ocorrera no Pelourinho. O fogo, qual sarça ardente, destruiu o acervo do Museu Nacional especializado em história natural e o mais antigo centro de ciência que em junho do ano em curso completou 200 anos. Não feriu pessoas fisicamente, mas, fez sangrar a alma brasileira. Foram três horas para o maior museu de hemisfério sul ser tragado pelas chamas.
Sua coleção era raríssima desde mantos reais, fóssil de Luzia a primeira brasileira, múmias egípcias e incas guardadas nos sarcófagos, dinossauros, um trono africano, o maior meteorito já caído no Brasil e etc. Uma tragédia a enlutar a comunidade científica. Enquanto gananciosos enriquecem, se esquecem de que a Terra de Santa Cruz deve preservar o passado em benefício do póstero.
Esse patrimônio histórico tombado pelo Iphan desde 1938 serviu de residência oficial da família real portuguesa de 1816 a 1821 e também da imperial brasileira desde a independência até a Proclamação da República de 1889 a 1891. Em 1892 foi destinada ao uso do museu. Mais de vinte milhões de itens foram consumidos pelo fogo. Antes dele o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro perdeu mais de mil obras de artistas nacionais e internacionais. É preocupante. Qual será o próximo? Oportuno é externar à Família Imperial Brasileira e aos 207,7 milhões de conterrâneos o sentido pesar e solidariedade.