A Patativa da Serra
Em decorrência da publicação, no mês de agosto p.p., do primeiro Tomo da Coletânea de Revistas da Academia Petropolitana de Letras, obra que reúne, de anos pretéritos, um sem número de matérias das mais variadas matizes, no tocante a luminares que fizeram integrar a Instituição, a verdade é que foi possível resgatar, com imensa alegria e profunda admiração, a produção acadêmica, literária, intelectual e de natureza histórica de inúmeros deles, aliás conforme deixa asseverado o acadêmico Cleber Francisco Alves na condição de responsável pelo absoluto êxito com vistas a efetivação de expressiva e difícil tarefa.
É certo, como afirma o ilustre acadêmico, que “trata-se do Livro” Academia Petropolitana de Letras – Em Revista, Tomo I, com a coletânea – fac simile – dos 13 primeiros números da Revista publicados ao longo de seus 50 anos iniciais de existência, ou seja, até 1972.”
Surge, assim, sem a menor sombra de dúvida, a excelente oportunidade de relembrarmos muitos daqueles pioneiros, seguidos por outros investidos de igual garra, todos tendo lutado, de maneira incansável, por tão importante causa, a perpetuação da Academia Petropolitana de Letras que acaba de celebrar o seu centenário.
Durante a leitura do primeiro, dos dois Tomos que ainda virão à tona, pudemos compilar poesias, discursos, trovas, enfim diversas matérias de valoroso conteúdo literário a respeito da citada obra e, ao mesmo tempo, denotando o notável saber daqueles que nos legaram dádivas tão significativas.
Por isso mesmo tivemos oportunidade de nos deparar com a sempre lembrada figura de um dos mais brilhantes oradores que fizeram integrar a APL, o acadêmico Murilo Cabral e Silva.
Ressalte-se que não foi apenas na Academia que o ora homenageado se destacou e marcou presença, conforme foi-me esclarecido por seu confrade, meu pai, até porque ainda tive a honra de conhecê-lo pessoalmente, além de familiares.
A ascensão de Murilo Cabral e Silva à Instituição possibilitou que o mesmo viesse a ocupar a cadeira número 7, patronímica de Ruy Barbosa.
Nascido em Três Rios a 25 de outubro de 1914, veio a falecer em 18 de outubro de 1979.
Exatamente por gozar da virtude de insígne orador, Murilo Cabral e Silva veio a desempenhar, também, no campo político, o cargo de deputado junto à Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, sempre a defender as mais nobres causas e interesses para com a cidade de Petrópolis, onde residia.
Desempenhou, ainda, importantes cargos perante o mesmo Estado do Rio de Janeiro, inclusive candidato a Prefeito de Petrópolis, contudo não conseguindo se eleger.
Na cidade de Pedro, por força da sempre apreciada oratória que inclusive extrapolou os limites de nossa cidade, passou a ser conhecido, para honra dos petropolitanos, como “A Patativa da Serra”, porquanto se comparados os belíssimos discursos pelo mesmo proferidos, com o encantador canto atribuído à ave “sporophila plumbea” – patativa da serra do cerrado – sempre a alegrar os arvoredos de nossa terra, fazendo relembrar, assim, Murilo Cabral, este a carregar tão “belo canto” originário de tal ave, na condição de exímio orador.
De palavra fluente, dono dos mais inigualáveis discursos, afora as poesias que fazia declamar no mesmo tom suave e acolhedor como os da ave que lhe rendeu ser conhecido como A Patativa da Serra.
À página 677 da Revista que ora compilamos, lê-se: “Murilo Cabral e Silva – Acadêmico: cadeira nº 7, patrono Ruy Barbosa. Poeta inspirado tem produzido inúmeras páginas, divulgadas pela Imprensa. Funcionário Público Estadual, é considerado grande orador.”
Dá-nos notícia, também, a publicação da qual ora nos valemos para esclarecer que o mesmo presidiu a Academia – período compreendido entre 1966 a 1967.
Durante o Biênio 1968/1969, lê-se, ainda: “Petrópolis têve no passado biênio, sobejos motivos para se orgulhar de sua Academia Petropolitana de Letras.”
E adiante, prossegue:
“De todo êsse marcante momento cultural, destacamos:
- 6.12.68: Sessão solene de posse da diretoria em que fizeram uso da palavra os acadêmicos Murilo Cabral e Silva e Drº Mario Fonseca, havendo na ocasião sido entregues os diplomas de sócios correspondentes aos professores e acadêmicos: Dr. Arthur de Almeida Torres, (Niterói); Drº Gondim da Fonseca (da Guanabara) e professor Walter Figueira (Campos). Presentes mais de 100 pessoas.”
Murilo Cabral e Silva, sempre atuante e na qualidade de inspirado poeta, vale ser lembrado em “Para a eternidade das Cirandas”, publicação integrante da Revista sob comento.
No artigo “O Contingente e o Eterno em Ruy Barbosa”, patrono de sua cadeira, após discorrer sobre egrégia figura, conclui sua preleção asseverando:
“…O que não passa em Ruy é a luta dramática de viver e fazer o direito. A rebeldia ante quaisquer fórmulas de complacência. Não se submeter aos enganos ou aos caprichos da ordem dominante. A inconformidade frente à corrupção passiva ou ativa. Reagir, protestar até a morte. O fundamento da obra do jurista é maior que a obra: – o jurista passa; o sentido, não. Em Buenos Aires como em Haya; no advogado dos “habeas-corpus”, como no civilista e constitucionalista; a vida da sua obra não supera a obra da sua vida.”
E aduz, finalmente: “Entre a obra e a vida – prevalece a vida; pois foi para a vida que o mestre escreveu a obra”
Como as aves que permanecem a cantar em nossas matas desta bela cidade de Petrópolis, Murilo também noutra esfera continua a ser recordado como estrela de primeira grandeza na memória daqueles que tiveram a honra de conhecê-lo e puderam gozar de sua amizade e sabedoria.