• A Pareidolia

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  • 26/03/2023 08:00
    Por Ataualpa A. P. Filho

    A exposição “A Vida em Revelações” que foi aberta na sexta-feira passada (24/03) na galeria do Edifício Esperanto, localizada na Rua Alencar Lima com a 16 de Março, sob a curadoria da Associação Fluminense de Artes Visuais e Poesia (AFLIP), veio despertar a necessidade de promover um questionamento sob a ótica do encontro com a Arte a partir das sutilezas do belo. Não se trata apenas de uma exposição de fotos, existe uma preocupação em externar um prisma sobre a realidade em momentos de sensibilidade. O ver pode ser ampliado e compartilhado como o canto dos galos no poema “Tercendo a Manhã” de João Cabral de Melo Neto:

    “Um galo sozinho não tece uma manhã./ Ele precisará sempre de outros galos./ De um que apanhe esse grito que ele/ e o lance a outro; de um outro galo/ que apanhe o grito que um galo antes/ e o lance a outro; e de outros galos/ que com muitos outros galos se cruzem/ os fios de sol de seus gritos de galo,/ para que a manhã, desde uma teia tênue,/ se vá tecendo, entre todos os galos.”

    A prática pedagógica também se insere nesse canto de esperança e liberdade. Um gesto de ternura pode vir pela foto de uma flor enviada a alguém por quem se tem apreço. Mas não tem preço o momento em que a alma acolhe uma manifestação do amor fraterno. Enternecer (ternurar) é uma das funções da empatia. Não podemos perder o foco sobre o real. É preciso seguir na direção do bem comum. Partilhar, compartilhar, interagir. A dialética da vida também se manifesta na reciprocidade inerente às ações comunitárias. 

    Confesso que essa exposição só se tornou possível pelo vínculo de amizade que há entre os expositores.  Não é tão simples romper a timidez. Nós, expositores, teríamos dificuldades para realizá-la individualmente. A força coletiva é que nos impulsiona. Estamos expostos não pela estética das fotos, pois não somos fotógrafos profissionais, mas pelo desejo de propiciar reflexões de caráter educativo. Somos educadores com larga experiência no magistério da rede pública e privada, porém somos amadores na arte de fotografar. Aceitamos o desafio de expor os nossos trabalhos fotográficos por um exercício de aprendizagem. Não perdemos a oportunidade de aprender. Como também não perdemos a oportunidade de compartilhar vivências. É gratificante colher sinergia por meio da arte. 

    Algumas fotos expostas foram feitas por meio de um simples celular. Nem tudo pode se consumar em “selfie”. Vamos ampliar o foco e ver o belo que há no outro. O desnarcisar exige um esforço hercúleo, porque é preciso vencer as vaidades. O amor é que nos revela interiormente…

    Hoje o fotografar não exige tantos recursos como outrora. Diante da realidade captada instantaneamente, cabe a indagação de Carlos Drummond de Andrade em “O Homem; as Viagens”: “vê o visto – é isto?”…

    A prática pedagógica também perpassa pelo aprimoramento do senso crítico que precisa ser ampliado constantemente por causa da velocidade das mudanças sociais. Por isso, o olhar sobre a realidade requer mais atenção. A fotografia promove o ver com detalhes. No pensar, no fotografar, a inserção da luz é imprescindível. Toda fotografia é a face de um agora captado em tempo e espaço. Registrá-lo requer perícia consumada em arte.

    A luz natural predomina nas fotos expostas. Matizes produzidos pelo Sol destilam poesia. As cores de um crepúsculo não se repetem. Infinitos e inéditos fins de tardes precisam ser apreciados. Entre o imaginado e a imagem, há o impalpável que as retinas levam a corações e mentes.

    Hoje a nossa expectativa está na possibilidade de motivar outras exposições, mesmo que sejam assim de natureza amadora, mas que possam promover contemplações inquietas. Assim como os celulares estão sendo usados para filmar, denunciar cenas de violência, também podem ser usados para registrar o contemplativo…

    Paulo Leminski afirma, em haicai, que “nuvens brancas/ passam/ em brancas nuvens”. Quando crianças, passava horas olhando para o céu desejando ver o que as “brancas nuvens” poderiam fazer e desfazer o que pudesse ter face na realidade. Eu nada sabia de pareidolia. Nem sabia que essa palavra existia. Hoje, pela fotografia, vejo a oportunidade de buscar imagem dentro de outra imagem. Assim como procuro descobrir palavras dentro de outras palavras. O nosso inconsciente existe também para nos surpreender…

    Repito: o ver se amplia. A humildade favorece a aprendizagem que amplia horizontes. “A Vida em Revelações” traz também poemas concretos em que a palavra diagramada agrega significações para traduzir o viver.

    E, para finalizar, reitero que somos profissionais da educação, porém amadores na arte de fotografar. Conduto, temos esse hábito de aceitar desafios: ver. Pensar. Contemplar. Refletir. Imaginar. Ir além…

    – Obrigado, Bini, Hilton e Lilian por essa oportunidade de estar ao lado de vocês nesse desafio de colocar as nossas vidas em revelações fotográficas….

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