A noiva iludida
Cleosinha, assim chamada pelos mais íntimos, jovem bela, dedicada aos estudos, porém, inocente e sonhadora.
Conheci-a, como tantos outros amigos, à época em que eu cursava o científico e a jovem, o curso normal.
Certa vez encontrou-se comigo alegre, posso até dizer, exultante, já que na semana seguinte ficaria noiva e na expectativa de matrimônio muito próximo.
O noivo, há pouco, chegado à nossa cidade, oriundo de Porto Alegre; frequentava outro educandário, não aquele que eu estudava.
Com o rapaz mantinha pouca intimidade, apenas nos encontrando por ocasião de festas ou, eventualmente, a circular pela então Avenida 15 de Novembro.
Ele acompanhado da noiva e ela feliz pela aliança já colocada na mão direita.
Todos estudávamos na parte da manhã e quando nos liberávamos dos compromissos escolares seguíamos para as imediações do Colégio Santa Isabel, eis que cada um de nós já de “olho” nas meninas que deixavam o colégio, no mesmo horário.
O noivo, àquela altura ainda jovem, porém, muito sonso e namorador, mas, por incrível que pareça, só a demonstrar atitudes de delicadeza e carinho para com Cleosinha, gestos, entretanto, que todos percebiam não guardar sinceridade.
Pobre moça; não poderia imaginar o que lhe aguardava!
A jovem, no entender de seus amigos e também no meu, muito imatura, uma vez que guardava a mesma idade do noivo, porém, demonstrando pouca atenção a propósito do que acontecia a seu redor e quiçá fora dele.
Como conhecia os pais da noiva, seus amigos e colegas também acabaram por tomar ciência que o namoro e posterior noivado foram concretizados contrariamente à vontade dos pais.
O tempo foi passando e nessa altura todos já frequentando faculdades, uns direito, outros engenharia e muitos, especialmente, as moças, filosofia, história e pedagogia.
Cleosinha e o noivo continuavam juntos, pelo menos, aparentemente, todavia, não aos olhos da moça, que não enxergava o que deveria ser visto.
Entretanto, o casamento que houvera sido prometido, nunca a se concretizar.
A condição financeira do noivo, a se constatar, como impossível para que fosse firmado o compromisso; era visível para quem quisesse ver.
A surpresa para moça acabou por surgir quando, de repente, o noivo comunicou-lhe que iria se transferir para outra faculdade, situada em sua terra natal.
Cleosinha quedou-se chocada, porém, o noivo prometendo dias melhores, alegando que tão logo formado retornaria à Petrópolis.
E a noiva, ainda assim, esperou e esperou por algum tempo, ambos já formados, embora seus contatos fossem feitos, apenas, pela via telefônica.
Os pais da moça, é verdade, já haviam vislumbrado, inclusive alertando à filha, que ela fora enganada sem que a mesma tivesse dado crédito às ponderações dos pais.
Assim é que, após muitos altos e baixos atravessados, foi chegado o dia “D”, ocasião em que o carteiro fez entregar uma missiva dirigida aos pais de Cleosinha e não a ela diretamente.
Aberta a correspondência, escrita fria e laconicamente, em razão do seu conteúdo, ocorreu que a moça passasse a se debruçar em lágrimas, já que junto à carta o “noivo” fez devolver a aliança que oferecera àquela criatura, pura e iludida durante tantos anos.
Decepção, tristeza e logo após, tremenda depressão.
Coube aos pais, já não tão moços e lutando com dificuldades, cuidar da filha a qual, apenas depois de demorado tratamento médico acabou por se recuperar e retornar à sala de aulas.
Os pais, combalidos, assistiram e participaram de todo o sofrimento e o desqualificado “noivo” nunca mais “deu sinal de vida”.
Tomando ciência a respeito desse triste episódio lembrei-me do poeta quando escreveu:
“A ilusão tem curto alento, / tal como a bola de gás, / se alça vôo, num momento, / num momento se desfaz”.
Entretanto, como a vida não proporciona somente maus momentos e decepções, embora Cleosinha houvesse demorado para “acordar”, após transcorrido um ano, a mesma veio a conhecer Milton, criatura de bom caráter, homem simples, além de trabalhador; casaram-se e para satisfação da família, anos depois foram presenteados com a chegada de Juju e Pedrinho, filhos queridos que acabaram por propiciar uma união mais forte e coesa entre todos
Para Cleosinha, certamente, ilusões nunca mais, esperança sim.