• A Missão de Jesus

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  • 28/jan 08:00
    Por Monsenhor José Maria Pereira

    O Evangelho (Mc 1, 21-28) apresenta – nos Jesus pregando, na Sinagoga de Cafarnaum, no dia de sábado.  Conta que Ele “começou a ensinar” e os seus ouvintes “se maravilhavam… porque ensinava como quem tem autoridade”. Até o espírito impuro, presente num homem, se dá conta da Sua presença e, enquanto grita, não deixa de reconhecer em Jesus “o Santo de Deus.” Ao expulsar o demônio, libertando o possesso, todos ficam maravilhados e dizem: “Que é isto? Eis uma nova doutrina e feita com tal autoridade que até manda nos espíritos impuros, e eles obedecem-lhe”. À eficácia da palavra de Jesus acrescentava a dos sinais de libertação do mal. Santo Atanásio observa que “comandar os demônios e expulsá – los não é obra humana, mas divina”; com efeito, o Senhor “afastava dos homens todas as doenças e todas as enfermidades. Quem, vendo o seu poder… ainda duvidaria que Ele é o Filho, a Sabedoria e o Poder de Deus?” A autoridade divina não é uma força da natureza. É o poder do amor de Deus que cria o Universo e, encarnando-se no Filho Unigênito, descendo à nossa humanidade, purifica o mundo corrompido pelo pecado. Romano Guardini escreve: “Toda a existência de Jesus é tradução do poder em humildade… é a soberania que se abaixa à forma de servo”. Para Deus a autoridade significa serviço, humildade e amor; significa entrar na lógica de Jesus, que se inclina para lavar os pés aos discípulos ( Jo 13,5), que procura o verdadeiro bem do homem, que cura as feridas, que é capaz de um amor tão grande que O leva a dar a sua vida, porque é Amor. Numa das suas Cartas, Santa Catarina de Sena escreve: “É necessário que nós vejamos e conheçamos, na verdade, com a luz da fé, que Deus é o Amor supremo e eterno, e não pode desejar outra coisa, a não ser o nosso bem”.

    Desde a chegada de Cristo, o demônio bate em retirada, mas o seu poder é ainda muito grande e “ a sua presença torna-se mais forte à medida que o homem e a sociedade se afastam de Deus” (São João Paulo II); devido ao pecado mortal, não poucos homens ficam sujeitos à escravidão do demônio, afastam-se do Reino de Deus para penetrarem no reino das trevas, do mal; convertem-se, em diferentes graus, em instrumento do mal no mundo e ficam submetidos à pior das escravidões. Jesus sabe que para libertar a humanidade do domínio do pecado, Ele deverá ser sacrificado na Cruz como verdadeiro Cordeiro Pascal. O demônio, por sua vez, procura distraí – lo em vista de o desviar ao contrário para a lógica humana de um Messias poderoso e com sucesso. A Cruz de Cristo será a ruína do demônio, e é por isso que Jesus não cessa de ensinar aos seus discípulos que para entrar na sua Glória deve sofrer muito, ser rejeitado, condenado e crucificado ( cf. Lc 24, 26), dado que o sofrimento faz parte integrante da sua missão.

    “Jesus intimou o espírito mau: cala-te e sai dele! Então o espírito mau sacudiu o homem com violência, deu um grande grito e saiu” (Mc 1,25-26). Os Evangelhos apresentam vários relatos de curas miraculosas. A vitória sobre o espírito imundo, nome que se dava correntemente ao demônio, é sinal claro de que chegou a salvação divina: Jesus, ao vencer o Maligno, revela-Se como o Messias, o Salvador, com um poder superior ao poder dos demônios: “É agora o julgamento deste mundo. Agora o príncipe deste mundo vai ser expulso” ( Jo 12,31 ). Ao longo do Evangelho torna-se patente a luta contínua e vitoriosa do Senhor contra o demônio.

    A oposição do demônio a Jesus vai aparecendo, cada vez mais clara: é solapada e sutil no deserto; manifesta e violenta nos endemoninhados; radical e total na Paixão, que é “a hora e o poder das trevas” (Lc 22, 53). A vitória de Jesus é também cada vez mais patente, até ao triunfo total da Ressurreição.

    O demônio é chamado imundo, diz São João Crisóstomo, pela sua impiedade e afastamento de Deus, e porque se mistura em toda a obra má e contrária a Deus. Reconhece de alguma maneira a santidade de Cristo, mas este conhecimento não vai acompanhado pela caridade. Além do fato histórico concreto, podemos ver neste endemoninhado os pecadores que se querem converter a Deus, libertando-se da escravidão do demônio e do pecado. A luta pode ser longa, mas terminará com uma vitória: o espírito maligno não pode nada contra Cristo. Desde Cristo o demônio bate em retirada, ainda que isto não queira dizer que não continue a haver casos de possessão diabólica.

    Jesus sofre e morre na Cruz por amor. Deste modo, considerando bem, deu sentido ao nosso sofrimento, um sentido que muitos homens e mulheres de todas as épocas compreenderam e fizeram seu, experimentando uma profunda serenidade também na amargura de árduas provas físicas e morais.

    A experiência da ofensa a Deus é uma realidade. E o cristão não demora a descobrir essa profunda marca do mal e a ver o mundo escravizado pelo pecado, ensina a Gaudium et Spes, 13.

    São Paulo recorda-nos que fomos resgatados por um preço muito alto (1Cor 7, 23) e exorta-nos, firmemente, a não voltar à escravidão. Ensina São Josemaría Escrivá: “O primeiro requisito para desterrar esse mal é procurar comportar-se com a disposição clara, habitual e atual, de aversão ao pecado. Energicamente, com sinceridade, devemos sentir – no coração e na cabeça – horror ao pecado grave” (Amigos de Deus, 243).

    O pecado mortal é a pior desgraça que nos pode acontecer. Quando um cristão se deixa conduzir pelo amor, tudo lhe serve para a glória de Deus e para o serviço dos seus irmãos, os homens, e as próprias realidades terrenas são santificadas: o lar, a profissão, o esporte, a política… “Pelo contrário, quando se deixa seduzir pelo demônio, o seu pecado introduz no mundo um princípio de desordem radical, que afasta do seu Criador e é a causa de todos os horrores que se aninham no seu íntimo. Nisto está a maldade do pecado: em que os homens tendo conhecido a Deus não o honraram como Deus nem lhe renderam graças. Pelo contrário, extraviaram-se em seus vãos pensamentos, e se lhes obscureceu o coração insensato… Trocaram a verdade de Deus pela mentira e adoraram e serviram à criatura em lugar do Criador, que é bendito pelos séculos” (Rm 1, 21-25).

    O pecado – um só pecado – exerce uma misteriosa influência, umas vezes oculta, outras visível e palpável, sobre a família, os amigos, a Igreja e a humanidade inteira. Se um ramo de videira é atacado por uma praga, toda a planta se ressente; se um ramo fica estéril, a videira já não produz o fruto que se esperava dela; além disso, outros ramos podem também secar e morrer.

    Devemos lutar contra os pecados veniais, que não causam a morte espiritual, como o pecado mortal, mas, pelo desleixo e pela falta de contrição que implicam, são um convite aos pecados graves, produzem esse efeito funesto nas almas que não lutam por evitá-los, e constituem um excelente aliado do demônio. Sem matarem a vida da graça, debilitam-na, tornam mais difícil o exercício da virtude e mal permitem ouvir as insinuações do Espírito Santo. “Que pena me dás enquanto não sentires dor dos teus pecados veniais! – Porque, até então, não terás começado a ter verdadeira vida interior” ( São Josemaria Escrivá, Caminho, 330).

    Para lutar eficazmente contra os pecados veniais, o cristão deve começar por encará-los na sua real importância: causam mediocridade espiritual e tibieza, e tornam realmente difícil o caminho da vida interior.

    Renovemos hoje o propósito firme de repelir tudo aquilo que possa ser ocasião, mesmo remota, de ofender a Deus: espetáculos, leituras inconvenientes, ambientes em que destoa a presença de um homem ou uma mulher que segue o Senhor de perto… Amemos muito o Sacramento da Penitência (Confissão). Meditemos com frequência a Paixão de Cristo para entender melhor a maldade do pecado. Peçamos a Deus que seja uma realidade nas nossas vidas a sentença popular, tão cheia de sentido: “Antes morrer que pecar”.

    Os santos recomendaram sempre a confissão frequente, sincera e contrita, como meio eficaz de combater essas faltas e pecados, e caminho segura de progresso interior. Dizia S. Francisco de Sales: “Deves ter sempre verdadeira dor dos pecados que confessas, por leves que sejam, e fazer o firme propósito de emendar-te daí por diante. Há muitos que perdem grandes bens e muito proveito espiritual porque, ao confessarem os pecados veniais como que por costume e só por cumprir, sem pensarem em corrigir-se, permanecem toda a vida carregados deles”.

    “Oxalá não endureçais os vossos corações quando ouvirdes a sua voz” (Sl 94, 7-8). Peçamos ao Espírito Santo que nos ajude a ter um coração cada vez mais limpo e forte, capaz de cortar o menor laço que nos aprisione, e de se abrir a Deus tal como Ele espera de cada cristão. E, assim seremos capazes de entender e acolher a mensagem de S. Paulo que apresenta a beleza e a grandeza do seguimento do Senhor, no Celibato.

    São Paulo adverte que os casados, sujeitos aos deveres familiares, não podem entregar-se ao serviço de Deus com a mesma liberdade que os celibatários. O Apóstolo louva e aconselha a virgindade que permite ocupar-se nas coisas de Deus com um coração indiviso e sem preocupações (1Cor 7, 32-35). A Virgindade consagrada é uma maneira típica da novidade da resposta, que devem a Deus os seguidores de Cristo e tem, ao mesmo tempo, a função de recordar a todos os crentes que, em todas as coisas, o primeiro lugar pertence a Deus.

    Invoquemos com confiança Maria Santíssima, a fim de que guie os nossos corações para haurir sempre da misericórdia divina, que liberta e purifica a nossa humanidade, enchendo-a de todas as graças e benevolências, com o poder do amor. 

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