• A ingratidão e a inveja

  • 18/fev 08:00
    Por Fernando Costa

    Quando jovem, meus primeiros passos iniciaram-se nos escritórios: Dorothea Monteiro do Nascimento e Mário Barbosa, Barbosa Seguros, Contador Djair Corrêa, e, também, na Loja Útil Ltda, de propriedade do casal Georgino Salustiano da Silva e Neuza Reis Salustiano da Silva, em Três Rios.

    Vez por outra, no Fórum daquela Comarca, município de meu nascimento e residência, eu cumpria tarefas de reconhecimento de firmas no Cartório e escrivania dos Tabeliães e Serventuários de Justiça Margarida Maria Barbosa Ribas e Taytson de Toledo Ribas cujo Templo dedicado a Themis leva o nome da tradicional descendência.

    E lia no mural as sábias palavras de Dona Margarida, de cuja família me tornei amigo e até hoje privo desse benquerer.

    “A ingratidão é a prova de que se fez algum bem”.

    O jovem à época absorvia aqueles ensinamentos e percebia a profundidade das palavras ali inscritas.

    Hoje, decorridos sessenta anos, relembro as palavras da filósofa, contadora, tabeliã, notária, serventuária, mestra, mãe, pensadora e modelar criatura.

    Rememoro o apostolado da ilustre trirriense que deu a mão a tantos, formou e instruiu uma senda de moços dos diversos matizes.

    Com orgulho meu colega de escritório Célio Barbosa foi seu estagiário.

    Aprendeu e aprimorou, sobretudo, nas esferas processual e ético-moral!

    O lexicografo Houaiss em síntese define a ingratidão como sendo “a qualidade ou ação de quem é ingrato, falta de gratidão e de reconhecimento.

    É aquele que não aprecia e não reconhece o bem que lhe foi prestado.”

    E neste mesmo diapasão lembro-me da palavra inveja, quesito que o mesmo professor define como “sentimento que se mistura ao ódio e ao desgosto, e é provocado pela felicidade e prosperidade de outrem.

    É um desejo incontido e irrefreável de possuir, gozar em caráter exclusivo o que é possuído pela outra pessoa”.

    Claro que isso entristece, embora saiba que não devem causar preocupações ou perdas de noites de sono.

    Palavras desprezíveis: inveja e ingratidão.

    Diz-se têm a ver com o ciúme.

    E ele é interpretado de vários ângulos: não é saudável.

    São na verdade pura falta de reconhecimento.

    Jesus Cristo disse no alto da cruz: “Pai, perdoe-os, eles não sabem o que fazem!”

    É preciso caminhar e insistir em fazer o bem ainda que esteja sujeito a essas intempéries e  evitar ficar ressentido.

    O importante é ser feliz.

    Quanto mais se importar com isso a sensação de tristeza tomará conta da atmosfera.

    Se agir tomado pela inveja ou ingratidão se vê limitado.

    Sejamos positivos e se for da vontade do Pai e da Mãe dos Céus o contrário um dia verá que era esse o plano celestial: sofrer por haver praticado o bem.

    Nós não seremos abandonados.

    Ainda que não nos apercebamos disso.

    É preciso serenidade nesse momento e lembrar São Francisco que nos diz que devemos levar o amor onde houver o ódio, a alegria onde pairar a tristeza, a luz onde houver treva, dar sem esperar retorno…

    Não permitamos que a mágoa, o desprezo pelas atitudes do semelhante, a fraqueza e o rancor nos domine, afinal, são sentimentos que não somarão em nada em prol da paz.

    Ao constatá-los deles tomaremos conhecimento, mas, nunca os façamos de receptáculo para nossos corações. Gratidão é reconhecimento refletem em nosso interior.

    É um estado de graça para quem a pratique e para aquele que por ela for alvejado. Ela nos faz cativos pela luz dela emanada.

    Não é uma escravidão no sentido menor e nem poderia ser.

    Ela envolve o coração. Graça e agradecer fazem parte da mesma raiz.

    Para atingi-las devemos nos despir do egocentrismo, do individualismo e da egolatria.

    Como é bom “… encontrarmos os belos valores do mundo”.

    Sábias palavras do poeta indiano Kabir das Gupta.

    Lembro-me de uma historinha, tempos de infância, escrita pelos irmãos Jacob e Wilhelm Grimm onde se lê num dos trechos que a rainha má e invejosa matou a Branca de Neve só porque ela não se conformava de ser feia e a jovem era linda e suave…

    A inveja e a ingratidão fazem lembrar o conto da cobra venenosa.

    Esse animal peçonhento poderia bem se chamar inveja, ingratidão, recalque ou até despeito.

    Arma ciladas cria obstáculos e tenta destruir a boa fé de seu semelhante.

    Ele habita no invejoso, traidor, dissimulado e arrogante.

    Idêntico ao lobo com pele de ovelha. Dissimula. Chega oferece, interpreta papel de magnânimo e nem sempre é o que traduz o seu coração. Caráter pérfido.

    No momento em que se vê “dono da situação” ataca e agride.

    Sai sem deixar marcas na areia. É sorrateiro.

    Ao concluir mais que oportuna a fábula do vagalume. Não conheço o seu autor, mas, é de extrema sabedoria.

    O vagalume não entendia o porquê de ser perseguido pela cobra venenosa e um dia teve a coragem de pergunta-la: “se eu não faço parte de sua cadeia alimentar, por que deseja me matar?”

    Aí ela respondeu: “é porque não suporto seu brilho”. Quis dizer que sua luz a incomodava…

    Creio que esse vagalume possuísse inteligência superior, evidência social e comunitária, cultura, competência, dotes espirituais e ela não.

    A tal serpente por não possuir dignidade, credibilidade, nem o reconhecimento público notório tentou, no entanto, não conseguiu abater o pequeno animal porque ele tem asas e misturou-se às estrelas e aos anjos no imenso infinito enquanto ela continuou a rastejar em meio ao pó do deserto por ela construído. 

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