• Nos embalos de domingo à noite no Serrano FC

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  • 26/12/2018 12:00

    Os pés enquanto compasso, o corpo enquanto amplificador dos sentimentos. Em sintonia com o ritmo, o coração ditava o movimento da alma nas pistas do Serrano Football Club. Fosse para impressionar, ou para se expressar, ao fim da música, não era como se moviam, e sim o que os movia que importava.

    A escolha da música da vida nem sempre está a nosso alcance, mas se bem que isso nunca foi problema para o “pé de ouro” Didayr da Silva, de 87 anos. Tendo se tornado sócio do clube em 1949, narra a rotina das pistas de dança da época, palcos de verdadeiros espetáculos.

    “Frequento bailes há, mais ou menos, 75 anos porque, entre as décadas de 40 e 60, as duas modalidades de divertimento eram os cinemas e os bailes. No Serrano, a grande maioria acontecia com a orquestra do 1º Batalhão de Caçadores. Havia também aqueles com o Conjunto Kolling e com a Orquestra do Napoleão Tavares do Rio”. 

    Descrita por Didayr como uma época romântica, a era foi marcada por, ao menos, 10 ou 12 ritmos diferentes, que iam desde o rock, boogie oogie e mambo, ao reggae, samba, bolero e rumba. Assunto sério, os passos podiam fazer do clima romântico uma tragédia grega em questão de segundos.

    “Podia ser o cara mais bonito. Se não soubesse dançar, nenhuma menina dançava com ele. Eu não ia com aquela preocupação de flertar, arranjar namoro, eu ia porque adorava dançar. Houve uma época em que eu era conhecido como o bailarino que dançava sorrindo porque eu já entrava na pista abrindo um sorriso”. 

    Conduzido pela ideia de “dançar por dançar”, desde os 12 anos, quando aprendeu os primeiros movimentos com sua tia, Didayr também atribui seu talento aos professores José Ferreira, apelidado de “Zé Carioca”, dada à frequência em que dançava no Rio de Janeiro, e Aloísio Gomes da Silva, o “Bimba”.

    “Aprendi a dançar aos 12 anos com a minha tia porque meu avô não a deixava ir aos bailes sozinha. Assim me levava e podia dar umas paqueradinhas. Naquela época, só se dançava de terno e gravata. O Bimba, então, tinha um terno branco bonito, colete, camisa cor de palha, gravata amarela, sapato do motinha alaranjado. Ele ia perfumado e numa elegância só”.

    Foto: Arquivo Serrano


    Foto: Bruno Avellar


    Nos tempos da brilhantina

    Assim como foi palco de bons momentos para Didayr, o salão do Serrano também é sinônimo de felicidade para Geisa de Freitas Pomin, de 74 anos. “Como posso me esquecer dele se foi lá que realizei minha festa de casamento?”. 

    “Me casei há 52 anos, quando a sede do clube ainda era na Aureliano Coutinho, em frente à antiga delegacia. Se meu marido estivesse vivo, no dia 24 de setembro deste ano eu teria feito 52 anos de casada. Fui muito feliz com ele. Felizmente só tenho boas recordações. Onde tivesse uma pista, estávamos dançando”. 

    Geisa aponta os frequentadores, normalmente famílias, como um dos principais pontos-chave do estabelecimento. Em seu caso, o clube já era frequentado por seus pais, que não perdiam a oportunidade de dar uma fugidinha para “mexer o esqueleto”. 

    “Mesmo eu e meu irmão muito pequenininhos, meu pai nos deixava dormindo, ia para o Serrano com a minha mãe e, de vez em quando, ia lá em casa, porque morávamos perto, ver como estávamos. Eu devia ter uns 8 anos e meu irmão 5. Minha mãe dançou até os 92 anos na terceira idade. Eu a levava às 23h e a buscava às 4h30”. 

    De fato, desânimo é uma palavra que nada tem a ver com o perfil do clube. A empresária Ariane Ferreira, de 56 anos, lista alguns dos muitos shows em que marcou presença, já no Atílio Marotti. Moradora da Mosela, destaca os de Martinho da Vila, Benito, Gonzaguinha, Ultraje a Rigor e Roberto Carlos: mais azul e branco impossível.

    “Gostei muito do show do Ultraje a Rigor. Eu já era uma mocinha e fui por minha conta. Foi maravilhoso e muito intenso. Rock na veia! Frequentei também o Som no Salão Azul. Meu pai, Fernando Ferreira, foi presidente do conselho e, depois, do Serrano. É um clube que fez parte da minha vida. Tendo muitas amizades desde aquela época".

    Forma de expressão e alcance da felicidade


    Foto: Arquivo Serrano

    Ao som de Billy Paul, “KC & The Sunshine Band” e “Kool & The Gang”, Cássia Saldanha, de 52 anos, embalava suas noites de domingo no Salão Azul do Serrano. Além dos bailes da Furacão 2000 que, segundo ela, ofereciam também os esperados momentos de músicas lentas, Cássia conta que a garotada também se reunia para estimados concursos.

    “No 'Garota Verão', as meninas iam super bronzeadas. Muitas pegavam peças emprestadas em lojas para desfilar e fazer propaganda. Ganhei o título em 1980. Vinham jurados do Rio e, na banca, havia cabeleireiros, maquiadores. Eventualmente tinha também o concurso da “mais bela secundarista de Petrópolis”. As finalistas iam, normalmente, de vestido longo e salto alto”.

    Além do título de Garota Verão de 1980, Cássia afirma que levou para casa o amor de sua vida, seu marido Sérgio. Os dois se conheceram num desfile em 1981 e estão casados há 35 anos. Movidos pela essência do momento, os frequentadores do Serrano encontravam ritmo mesmo no silêncio das músicas e faziam das composições sucesso eterno.

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