• Na Casa do Barão

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  • 23/06/2018 13:30

    A luta pela preservação dos bens públicos emerge das ações cívicas que refletem a consciência da responsabilidade social de quem zela pela memória do povo. A história necessita dos alicerces que a memória registra. 

    O surgimento do novo não predetermina a supressão do que consolida o passado. Sempre desconfio das intenções de quem, em nome da modernidade, tenta apagar os registros históricos, por considerá-los ultrapassados. Muitos que defendem essa equivocada forma de pensar desconhecem o sentido da palavra “original.” Quem não preza suas origens tem dificuldade para assumir a própria identidade. 

    Manter a perecividade da matéria talvez seja uma das funções do tempo, para levar o homem a ter cuidado com aquilo que possa tornar o ontem vivo na lembrança. 

    Petrópolis, como outras cidades com forte legado histórico, depende do turismo. A economia do Município não se mantém somente pelos “ares da serra”. O patrimônio histórico que aqui reside atrai muitos turistas. A preservação desse acervo cultural consiste na manutenção de empregos no setor turístico. Por ter conhecimento dessa dependência econômica e por saber da importância da preservação da memória histórica, é que fiquei preocupado ao ler a matéria publicada neste jornal no dia 17/06, sobre o estado precário da casa em que foi assinado o Tratado de Petrópolis, em 17 de novembro de 1903, que integrou o Estado do Acre ao Brasil, que pertencia à Bolívia desde 1750.

    A referida casa pertenceu ao senhor José Maria da Silva Paranhos Júnior, que se tornou mais conhecido como Barão do Rio Branco. E para cumprir o citado acordo aqui assinado, o Governo brasileiro pagou à Bolívia a quantia de dois milhões de libras esterlinas e indenizou o Bolivian Syndicate em cento e dez mil libras esterlinas pela rescisão do contrato de arrendamento. E o Brasil se comprometeu também em construir a estrada de Ferro Madeira-Mamoré.

    Pela influência diplomática que exercia na época, a residência do Barão do Rio Branco era visitada por pessoas ilustres, entre elas, o senhor Carlos Martins Pereira e Sousa, amigo do ex-presidente Getúlio Vargas, que ingressou no Ministério das Relações Exteriores. Esse senhor ao visitar o Barão, encantou-se com a casa e externou o interesse em comprá-la, caso fosse colocada à venda. Esse fato se concretizou. E assim a esposa desse competente embaixador, a escultora Maria Martins, construiu ao lado da casa um atelier, que também se encontra em situação precária.

     Carlos e Maria Martins mantiveram também o hábito de receber os amigos do mundo diplomático e artístico. O escritor Alous Huxley, autor do livro “Admirável Mundo Novo”, esteve hospedado na citada residência. Em uma entrevista à amiga Clarice Lispector, ela disse: “Eu sempre dividi a minha vida em duas partes: das sete da manhã às seis da tarde eu vivia fechada em meu atelier, entregue absolutamente aos meus problemas de formas, de cores, e num isolamento que permitia depois uma imensa alegria de reencontrar não raro bons amigos.”

    Foi muito comentado o relacionamento afetivo dessa escultora com o pintor Marcel Duchamp. 

    Em 2014, O Governo do Estado comprou o referido imóvel com o propósito de instalar o curso de Arquitetura vinculado à UERJ. Mas devido à precariedade das instalações, não foi possível. Hoje esse curso está sendo ministrado em outro imóvel na rua Ipiranga. E, pelos dados apresentados na reportagem, não há previsão para o início das obras de recuperação da casa localizada na rua Barão do Rio Branco nº 279, que pela importância histórica, merece uma melhor atenção. 


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