• Entre o Pai e os filhos

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  • 11/08/2020 00:01

    Entre o Pai e os filhos

    O paraíso leva a assinatura do Pai. Mas o mundo precisa ser repensado por outra ótica, porque aqui construímos os nossos próprios abismos. A distância que nos separa está nos elos rompidos da fraternidade. A solidão é aquela caixinha sem surpresa na qual a pessoa se mantém e não estende a mão para abri-la. A mão estendida ao próximo mais necessitado alivia o peso do caixão e deixa a caixinha solitária mais ventilada, porque o sopro da vida é compartilhado. O ar que nos mantém vivos sopra para todas as narinas sem distinção. 

    A divisão da sociedade em classes só dimensiona a distância entre a base e o pico desta pirâmide. A fúria do mundo se reflete no belicismo a cada dia mais eficiente na produção da morte. O aprimoramento bélico vem da origem metaforizada em Caim e Abel. A letalidade dos explosivos é aprimorada para destruição em massa. As bombas nucleares deixam um rasto de sangue na história da humanidade. Não concordo com o provérbio latino que diz: “se quer paz, prepare-se para a guerra” (se vis pacem, para bellum). A paz começa dentro de nós, combatendo o ódio, não o alimentando.

    – Por que precisamos andar armados se todos somos irmãos? Há tristeza maior para um pai do que ver os filhos em guerra?… 

    Dentro das limitações das minhas palavras, não sei conseguirei hoje prestar uma singela homenagem aos pais. Mas antes vamos combinar algumas coisas: pai não é cpf, nem cnpj. Não é o titular do cartão de crédito, não é o que guarda o segredo do cofre, nem o bolso que porta a carteira das cédulas. Pai também não é o touro reprodutor, nem o banco de sêmen.

    Para não ficarmos aqui patinando sobre a relativização do óbvio, precisamos admitir que a reprodução dos mamíferos até hoje ainda é binária na relação entre macho e fêmea. Os vocábulos “sexo” e “gênero” carregam conceituações diferentes.  O ovário é um órgão exclusivo das fêmeas, a quem a natureza concedeu o dom da maternidade. As informações genéticas contidas no espermatozoide são conduzidas pelos machos na concepção biológica. Isso é um fato constatado cientificamente.

    O teste de DNA pode comprovar as matrizes reprodutoras, mas não determina a concepção plena de pai e mãe. Os genitores, às vezes, não arcam com as responsabilidades que merecem a sublimação do ser “Pai” e do ser “Mãe”. Não tenho dúvida: o amor maternaliza, o amor partenaliza, o amor fraternaliza.

    Tenho alguns irmãos e algumas irmãs que não são filhos do meu pai, nem da minha mãe, ou seja, não temos nenhum vínculo sanguíneo, porém o amor que nos une me faz considerá-los como membros da minha família biológica. 

    Por incrível que pareça, o homem é um ser capaz de amar e ser amado; porque, para isso foi criado. Mas tem muita dificuldade para entender que só viverá “assim na Terra como no Céu”, quando amar o próximo como a si mesmo. O paraíso na Terra não será construído com armas, nem movido pelo ódio. 

    É válido lembrar que Jesus, expressão máxima da coerência na prática do amor, teve um pai adotivo. José, o carpinteiro, carregou, no silêncio, o segredo revelado a Maria. E, nessa Família Sagrada, a dor também bateu forte pela incompreensão da humanidade. O “crucifica-o” ainda ecoa até hoje. A injustiça é coisa dos homens…  

      A adoção de crianças é uma atitude louvável. Mas tenho algumas ressalvas quanto à publicidade das ações adotivas, porque criança não é “pet”. A discrição é um ato inerente à caridade. Sei que as “celebridades” são midiáticas. Fazem publicidade até da vida privada. Mas ao adotar uma criança, penso que elas deveriam deixá-la distante dos holofotes. 

    Tenho visto muitos adultos sendo adotados pelas crianças, porque precisam de alguém para pôr no colo que possam externar o amor sem interesse. 

    A ausência do amor pode ser vista na insensibilidade social, no vazio das ostentações infladas pela vaidade e até no medo da solidão. Isso ocorre principalmente quando nos distanciamos do Pai que instituiu o perdão e a misericórdia.

      Podemos ser perdoados pela nossa ignorância, mas não estaremos livres das dores provocadas pelos nossos erros. Não cabe na minha cabeça essa ideia da desertificação do amanhã. Aqui na Terra, o paraíso consiste no equilíbrio do homem no meio em que vive. Por isso que o amor e a preservação da natureza são gestos que podem agradar ao Pai, que também merece ser lembrado no segundo domingo de agosto.

    Ataualpa A.P. Filho

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