• Criminalizar dívidas de ICMS pode aumentar sonegação, diz contador

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  • 24/12/2019 08:00

    Nos últimos anos, a arrecadação de Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS em Petrópolis vem crescendo. Foram, segundo dados divulgados pela secretaria de fazenda do município, R$ 150,5 milhões em 2016. No ano seguinte, um salto para R$ 190,5 milhões – 26,58% a mais. Em 2018, outro salto: R$ 254,5 milhões, mais 33,59%. Neste ano, a soma da arrecadação, até novembro, já é de R$ 239,9 milhões. E por lei, 25% do imposto, que é recolhido pelo governo do estado, retorna para as cidades fluminenses através do Índice de Participação dos Municípios – IPM. Em 2018, o IPM foi de 2,877% – superior aos anos anteriores. Em 2017, 2,342%. E em 2016, 1,904%. Petrópolis é a sétima colocada entre as cidades que mais arrecadam ICMS no estado. E quanto melhor colocada no ranking, mais o retorno do imposto para a cidade.

    Só que arrecadação, que vem crescendo nos últimos anos e retornando em repasses, pode estar comprometida com a decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal – STF de criminalizar os contribuintes que estiverem inadimplentes. É o que acredita o contador Lúcio Luiz Moreira da Silva, que diz que a medida do supremo “vai prejudicar inclusive o índice de participação dos municípios”, isso “porque (os contribuintes) vão manipular as declarações, vão colocar que venderam menos. Para não ter incursão no fato criminal”, explica.

    O ministro Luís Roberto Barroso, relator do processo, defendeu a criminalização sob a justificativa de que o não pagamento do ICMS pode mascarar tentativa de vantagem ilícita. “Não é quem deixou de pagar o ICMS eventualmente num momento de dificuldade, ou pulou um mês, dois meses, até três meses. É o devedor contumaz, o que não paga quase como uma estratégia empresarial, que lhe dá uma vantagem competitiva que permite que ele venda mais barato do que os outros, induzindo os outros à mesma estratégia criminosa”, argumentou Barroso.

    Mas, para o contador petropolitano, que ainda aguarda a divulgação dos mecanismos que serão criados para garantir a fiscalização, o medo de ser criminalizado pode levar o contribuinte ao retrocesso, diante do que se tem visto nos últimos anos. “O próprio estado não tem como apurar. A declaração é obrigatória, mas ele (contribuinte) que faz. De acordo com a situação (financeira) dele, ele vai omitir o que arrecada de ICMS para não entrar no perfil de inadimplência. E, se ele tiver caixa na hora do pagamento, ele vai fazer uma retificadora da declaração e vai declarar justamente o imposto que ele vai recolher. Acredito que ela (a arrecadação) está sendo regularizada (pelos mecanismos que dificultam a sonegação, como o Declan). Agora, pelo fato do STF estar criminalizando o inadimplente, para responder um processo criminal, eu acho que as declarações vão ser manipuladas.

    A Secretaria de Fazendo do Estado, no entanto, vê na decisão a possibilidade de identificar devedores e representar criminalmente para fins de recuperação do imposto. Em nota, a Secretaria explicou que “a fiscalização dos devedores é feita por meio de relatórios de arrecadação e por um polo de cobrança, que acompanha os inadimplentes. Ainda não há disponibilização do detalhamento das informações fiscais que impactam diretamente no repasse aos municípios. Porém, a Sefaz-RJ estuda implantar ou facilitar a troca de informações com as prefeituras para intensificar a cobrança aos inadimplentes e a fiscalização”. Neste ano, a Secretaria de Fazenda do Estado realizou 56 operações de combate à sonegação fiscal, com mais de 1.800 estabelecimentos fiscalizados.

    Embora não haja um convênio entre o Estado e o município para compartilhamento de informações, o governo estadual disse que esta medida está sendo estudada. “De qualquer forma, os municípios podem aderir ao Convênio 20/2015 entre a Sefaz e os representantes dos municípios para que tenham informações detalhadas sobre os repasses realizados”, informou em nota. 

    O fator Declan sobre a sonegação

    Um dos mecanismos de combate à sonegação, que tem contribuído para aumentar a arrecadação do ICMS é o Declan-IPM. Ele obriga os contribuintes a declararem todas as transações que envolvem a circulação de mercadorias e serviços, com a finalidade de se levantar informações econômicas das empresas, para que se possa auxiliar na apuração do valor da participação dos municípios no valor arrecadado em ICMS. Um fator que, aliado à obrigatoriedade da emissão da Nota Fiscal eletrônica, tem ajudado a coibir a sonegação. Ela, assim como a Declan, é obrigatória para empresas que contribuem com o ICMS.

    Por esse motivo, o presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Petrópolis, Luiz Felipe Caetano da Silva e Souza, acredita que a criminalização da inadimplência “é um exagero”. Ele ainda lembra que “as punições para quem sonega já são bem rigorosas, nos juros, multas e até na perda do seu patrimônio, em casos extremos. A atividade empresarial, especialmente no comércio, está sujeita a muitas variáveis num país de economia quase sempre instável. Que se puna com juros e multas quem deixar de recolher o ICMS no prazo, mas que não se criminalize quem pode apenas estar com dificuldades de caixa. Na minha opinião, esse é o risco à atividade empresarial que pode se tornar inviável diante da carga tributária tão elevada e que pode levar o empresário que deixou de pagar o ICMS para a cadeia”, destaca.

     A opinião dele vai ao encontro com a nota de posicionamento distribuída à imprensa pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL), que “vê com extrema preocupação a decisão de criminalizar o empresário”. A nota diz que a “a CNDL defende a urgência de uma resposta dos Poderes Executivo e Legislativo no sentido de revisar a legislação”. E que “espera, ainda, uma mudança no entendimento do STF” e ainda que “essa situação expõe o empresariado a um emaranhado complexo de leis e tributos, que prejudica o desenvolvimento e o crescimento de negócios”.

    No âmbito municipal, o secretário de desenvolvimento econômico, Marcelo Fiorini, acredita que a decisão serve para punir os empresários que agem de “má-fé”. Ao mesmo tempo, se diz preocupado com os empresários que “tiveram dificuldades para arcar com os custos dos negócios” e que “muitas pessoas ainda enfrentam dificuldades, o que acaba levando à inadimplência empresários que querem cumprir com suas obrigações”. Fiorini ainda salienta que a “maior preocupação é que empreendedores se sintam desestimulados”.

    Já a secretária de Fazenda Elaine Nascimento avalia como positiva para os municípios a decisão do STF. “A partir da decisão, a expectativa é de que o estado registre um aumento na arrecadação de ICMS, o que é positivo para todos os municípios – que recebem parte destes recursos. Importante lembrar, no entanto, que o controle, bem como a fiscalização sobre a arrecadação do ICMS são de competência exclusiva do Estado”, pontua.

    A secretária destaca que com objetivo de manter uma boa posição no ranking do índice de Participação dos Municípios – que influencia diretamente os repasses que serão destinados ao município – a Secretaria de Fazenda desenvolve um trabalho permanente de conscientização, junto aos contadores, bem como empresários da cidade.

    “Embora a Secretaria não tenha ingerência sobre a apresentação da Declan, sobre os dados informados pelas empresas e mesmo sobre o recolhimento do tributo aos cofres públicos, o município busca sempre conscientizar os empresários e contadores sobre a importância da apresentação da Declaração, inclusive com a implementação de sistemas de controle e acompanhamento mensal sobre a movimentação nas empresas. Ainda com objetivo de melhorar os instrumentos para monitoramento sobre a arrecadação, o município também formalizou convênio com o Estado para compartilhamento da movimentação através de cartões de crédito para fins de comparação dos dados com a receita declarada de ISS, o que possibilitará a cobrança dos valores não declarados”, afirma a secretária de Fazenda.  

     

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